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A recuperação de empresa na nova Lei de Falências

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14/10/2003 às 00:00
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O projeto governamental apresentou inúmeras novidades revolucionárias, destacando-se o instituto da recuperação da empresa, visando reorganizá-la, ao invés de destruí-la, para a manutenção dos empregados e a preservação da produção e circulação da riqueza.

CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS

Sumário: Os projetos de lei do Executivo. O substitutivo do Relator Deputado Osvaldo Biolchi – Subemenda aglutinativa global às emendas de Plenário ao substitutivo adotado A recuperação de empresa. Considerações históricas. A lei em vigor – Algumas observações pela Comissão Especial ao PL 4376-B, de 1993. A recuperação da empresa judicial e extrajudicial. Proposta de arbitragem. Conclusão. Propostas de alteração da subemenda aglutinadora.


"O homem deve pensar, pode divergir, mas antes de tudo deve ser tolerante. Das idéias, nem sempre convergentes, brota a imensa variedade de pensamentos que norteiam a humanidade e lhe abrem o caminho da verdade."


A vigente Lei de Falências merece ser reformada, imediatamente, para se adaptar ao novo milênio e a um mundo fascinante envolvido por novos mercados e blocos comerciais, profundas alterações político - sociais, queda e criação de novos impérios econômicos e Estados, numa universalização jamais vista, e por descobertas tecnológicas e científicas, que exigem do legislador mais que meros expedientes legislativos, senão intensa arte de ourivesaria, na elaboração legislativa, porque o verdadeiro direito é aquele que anda de mãos dadas com a justiça social e com a realidade.

As leis são amostras de comportamento que traduzem a consciência social de um povo e de uma era e devem-se harmonizar com as novas realidades que despontam, para não se apartar de vez do homem e fenecer solitária.

Fruto de um momento ultrapassado, as transformações sócio-econômicas deveriam, efetivamente, ser consideradas.

O direito romano é fonte primeira do processo de execução, que recaía sobre o próprio devedor e não sobre seus bens, calcada no impiedoso sistema escravagista.

No direito medieval, sob a influência da invasão bárbara, mas ainda envolvida pelo direito romano, a execução por dívidas fazia-se sobre o próprio devedor ou sobre seus bens móveis, com exclusão dos imóveis, em vista do regime corporativista da propriedade.

Só na Itália do norte, surge com extrema nitidez, a execução de caráter coletivo, remanescendo ainda as penas severíssimas, para os devedores falidos e a falência, por si só, constituía-se em crime. A finalidade primeira era a liquidação do patrimônio do devedor, através da execução coletiva. Essa fase encerra-se com a primeira grande guerra mundial.

A seguir, a preocupação maior era a preservação da empresa, todavia, ainda, de forma empírica, como o faziam a lei espanhola, francesa, inglesa, norte-americana (USA) e alemã.

Numa fase posterior, que se iniciaria, para alguns, após a segunda guerra e, para outros, mais recentemente, o núcleo de toda discussão se centra especialmente numa postura inovadora, visando o saneamento da empresa e sua preservação, para se liquidar somente, quando inviável e inevitável aquela solução.

A empresa é, hoje, encarada como uma entidade de suma importância e sua recuperação não advém de mera abstração, senão de uma realidade incontestável, com assento na doutrina e no direito alienígena.

A Alemanha experimentou a Lei do Acordo, de 1935, a Espanha reconhece situações distintas entre a empresa que não paga, por dificuldades financeiras de momento, contornáveis, e a que simplesmente deixa de pagar.

A França, na vanguarda, tem em vista a salvaguarda da empresa, a manutenção das atividades empresariais e o emprego.

Roger Houin enriquece o relatório elaborado por uma comissão de juristas franceses, com um memorável comunicado, com reflexos não só no direito comercial francês, mas também no direito comparado, pois defende a permanência da empresa dentro da falência, já que ela interessa não apenas aos assalariados, mas também aos sócios, especialmente aos acionistas e à própria economia do país.

O Estado tem, por dever ético, ofertar condições, para sua sobrevivência e não massacrá-la.

Na Itália, Ferrara sugere que o instituto em vigor passe a chamar-se de saneamento da empresa. Os Estados Unidos da América cuidam de reorganizar a empresa permitindo ao devedor manter todos os poderes de gestão e representação da empresa.

A simplificação, a conciliação de todos os interesses e a observância, fundamentalmente, da economia processual deverá nortear qualquer reforma.


NO DIREITO BRASILEIRO

No Brasil, as Ordenações Manuelinas tratava das quebras, expressão esta tomada pelo Direito Comercial, mas no sentido de falência, pois o artigo 798 do Código Comercial dispunha que a falência ou quebra podia ser causal, culposa ou fraudulenta.

Entretanto, o Alvará 13 de novembro de 1756, segundo Cayru, é o instrumento básico do direito falimentar português e o que vigorou no Brasil.

O Decreto 917, de 24 de outubro de 1890, integrou o vocábulo falência ao direito falimentar, assim permanecendo até os dias atuais. A falência é o estado em que se encontra um comerciante insolvente. O falido perde a administração e a disposição dos seus bens.

O Decreto-lei 7661, de 1945, em vigor com as alterações posteriores, apresenta dois sinalizadores de envergadura: a impontualidade e os atos de falência. A insolvência distingue-se do ato de falir.

Faz-se necessário um texto que, realmente, acompanhe as profundas mudanças por que vem passando a sociedade.

Tribute-se, contudo, aos autores do projeto de lei que se transformou no Decreto-lei 7661, de 21de junho de 1945, em vigor, os méritos de haverem construído uma arquitetura moderna, para a época, com inúmeras inovações, tais como maiores poderes ao magistrado, a concessão de benefício ao devedor honesto, traduzido pela concordata. (1)


OS PROJETOS DO EXECUTIVO

O Poder Executivo, através da Mensagem n º 1014, de 21 de dezembro de 1 993, enviou ao Congresso Nacional texto do projeto de lei, elaborado pelas Comissões constituídas pelas Portarias 233, publicada no DOU, de 9 de maio de 1991, e 552 MJ, acompanhado da Exposição de Motivos do então Ministro da Justiça, atualmente ornando o Supremo Tribunal Federal, Dr. Maurício Corrêa. O Projeto de Lei 4376/93 está em trâmite no Congresso Nacional, prestes a ser votado.

Participaram da primeira Comissão, instituída pelo Ministro Jarbas Passarinho, coordenada pelo Dr. Raul Bernardo Nelson de Senna, os Drs. Leon Frejda Szklarowsky (secretário), Geraldo de Camargo Vidigal, assessorado pelos Drs. Geraldo Facó Vidigal, Marcos da Costa e Fernando D’ Almeida e Souza Júnior; Solange Nascimento Velloso, Carlos Alberto de São Tiago Hagstrom, Danilo José Loureiro, Maria Luíza Grossi Franco Neto e Marília Pinheiro de Abreu Miranda (2); e da segunda, presidida pelo Dr. Alfredo Bumachar Filho, os Drs. Leon Frejda Szklarowsky, Fran Martins, Rubens Requião, Werter R. Faria, José Fernando Mandel e João Raimundo Cysneiros Vianna. (3)

Pela Mensagem 1014/93, o Poder Executivo encaminhou o Projeto de Lei 4376, de 1993, com o objetivo de regular a falência, a concordata preventiva e a recuperação de empresas que exercem atividade econômica regida pelas leis comerciais.

Este projeto, fruto de duas comissões instituídas pelo Ministério da Justiça, traz à discussão uma questão sumamente polêmica, como a submissão da empresa pública e da sociedade de economia e outras entidades estatais que explorem atividade econômica.

Algumas observações são dignas de apreciação, com relação a esse documento: pagamento parcial, antes do ajuizamento, e não apenas o total da dívida, e a novação, após o pedido de falência, são razão suficiente para impedir a decretação da liquidação judicial, como constava do projeto originário elaborado pelo Executivo. A legitimidade para requerer a recuperação deverá ser ampliada, nos moldes da redação originária do referido projeto.

A nova modalidade de despacho, na petição inicial, ordenando a realização de vários atos, sucessivamente, visando a economia processual, como já o fizeram o artigo 7º. da Lei de Execução Fiscal e, atualmente, o CPC, em consonância com as saudáveis alterações propostas pelo Ministro Sálvio Teixeira, deverá, sem dúvida, ser encampada, pela subemenda global do Relator.

O relator da Comissão Especial, Deputado Osvaldo Biolchi, em seu relatório, apreciando o projeto do Executivo, tece elogios a este, pela disposição de modernizar e trazer inovações necessárias, mas insurge-se contra a estrutura do mesmo, visto que, na sua opinião, manteve o esqueleto do decreto-lei vigente (4).

Opõe-se à submissão das empresas públicas e das sociedades de economia mista à lei de recuperação e liquidação judiciais. No caso de empresas públicas, porque seu conceito é bastante amplo e, portanto, até as autarquias e fundações a ela estariam sujeitas.

Quanto às demais, porque colidem com a política de desestatização que se vem iniciando, por razões estratégicas e de interesse público. Não obstante, aceita contribuições propostas por parlamentares, por juristas especialistas e pela OAB-DF, e propõe a aprovação do Projeto de lei do Executivo na forma do substitutivo.

Os objetivos das Comissões, que elaboraram os anteprojetos de leis, concentravam-se primacialmente na modernização do vigente diploma legal, vez que, promulgado numa época em que o Brasil ainda se encontrava numa fase subdesenvolvida, está plenamente superado. (5)

O projeto governamental apresentou inúmeras novidades revolucionárias, destacando-se o instituto da recuperação da empresa (6), visando reorganizá-la, ao invés de destruí-la, para a manutenção dos empregados e a preservação da produção e circulação da riqueza, tendo em vista o desenvolvimento e o bem estar sociais; extensão às empresas estatais dos benefícios da recuperação, se esta não ocorresse às custas do Tesouro Público e sim do próprio esforço; expressa submissão dessas empresas - sociedades de economia mista, empresas públicas e outras entidades estatais - à falência, desde que explorem atividade econômica, em consonância com o artigo 173 da Constituição da República; supressão da concordata suspensiva, porque, no curso desta e da falência, poder-se-á propor a recuperação da empresa.

Também facultou que a publicação dos atos e termos do processo se fizesse por quaisquer meios idôneos de comunicação e as citações e intimações, também pelo correio ou qualquer meio idôneo de comunicação, acompanhando sem dúvida o progresso incontestável na área de comunicação.

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Desenha algumas figuras novas, como o administrador judicial (pessoa física ou jurídica), que administrará os bens do devedor, em liquidação judicial, ou auxiliá-lo-á na administração, durante a reorganização, e o comitê de recuperação, sob a supervisão do juiz, para assisti-lo, na superação da crise, ou fiscalizar os atos do administrador judicial, se decretada a liquidação judicial, novo nome dado à falência.

A intervenção do Ministério Público continua obrigatória, contudo, para dinamizar o processo, este será imediatamente encaminhado ao magistrado, se não houver pronunciamento daquele órgão em tempo hábil. Esta novidade não poderá ser olvida pelo legislador, visto que impedirá a morosidade do processo e bvios prejuízos que acarreta.


SUBSTITUTIVO DO RELATOR

O substitutivo (7) inova, na denominação do projeto, e manteve a preocupação maior na recuperação econômica da empresa, ao invés de esmagá-la, alcançando ainda as micro-empresas, sem restrição de um mínimo de cem empregados, tal qual propuséramos, nas Comissões, porquanto a constrição simplesmente abortaria esse instituto. As comunicações processuais serão feitas, também, por meios eletrônicos e modernos, adotando sugestões de juristas e de entidades, o que é extremamente louvável. (8)

Resguardou as linhas mestras do projeto, expurgando, contudo, algumas proposições, que realmente não se justificam, e a concordata preventiva deixa de existir, o que, de fato, se coaduna com o espírito do projeto.

Efetivamente, não tem sentido que um texto inovador preserve o arcaico instituto da concordata preventiva, desde que tenha admitido a recuperação da empresa.


SUBEMENDA AGLUTINATIVA GLOBAL ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PL Nº 4376/B, DE 1993 (PL Nº 205, de 1995, apensado) (9).

O texto da SUBEMENDA AGLUTINATIVA GLOBAL ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PL Nº 4376/B, DE 1993 (PL Nº 205, de 1995, apensado), preservou e regula com muita propriedade a recuperação da empresa, no âmbito judicial, (10) e introduziu, com muita propriedade, a recuperação extrajudicial, no Capítulo IV (artigos 76 e segs.), muito embora não tenha absorvido notáveis novidades trazidas pelo projeto originário.

A recuperação extrajudicial não constava do substitutivo inicial nem dos projetos do Poder Executivo e sua inserção enriqueceu sobremaneira a subemenda aglutinativa.

Esse texto foi alterado pela SUBEMENDA GLOBAL DO RELATOR ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PL Nº 4376/B, DE 1993 (PL Nº 205, de 1995, apensado) e que será objeto de nosso estudo.


SUBEMENDA GLOBAL DO RELATOR ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PL Nº 4376/B, DE 1993 (PL Nº 205, de 1995, apensado)(11)

Fizeram-se inúmeras alterações ao texto da subemenda aglutinativa global às emendas de plenário ao substitutivo adotado pela Comissão Especial ao PL nº 4376/B, de 1993 (PL nº 205, de 1995, apensado), alterando ou suprimindo artigos.

Trataremos, basicamente, da recuperação de empresa e dos princípios gerais da subemenda global do relator e algumas modificações pontuais, que dizem respeito à recuperação e à falência.


RECUPERAÇÃO JUDICIAL

A recuperação judicial da empresa está inscrita, no Capítulo III, e visa saneá-la da situação crítica do devedor, livrando-o da crise econômico-financeira.

O QUE É

A recuperação judicial é ação judicial.

O foro competente, para a homologação da recuperação extrajudicial, da decretação da recuperação judicial ou da falência, é o do domicílio do devedor, onde esteja situado o seu principal estabelecimento ou a filial da empresa com sede fora do País.

O objetivo é: 1- sanear a situação de crise econômico-financeira do devedor. 2- salvaguardar a manutenção da fonte produtora, do emprego de seus trabalhadores e os interesses dos credores e 3- viabilizar a função social da empresa.

O alcance desse instituto é significativo.

QUEM É O DEVEDOR

O devedor em estado de crise econômico-financeira é aquele que está sujeito às dificuldades temporárias do negócio, caracterizadas pela iliquidez, insolvência ou situação patrimonial que exija readequação planejada de sua atividade.

A viabilidade econômica tem como pressupostos, dentre outros fatores, a importância social e econômica da atividade do devedor no contexto local, regional e nacional, a mão-de-obra e a tecnologia empregadas, o volume do ativo e do passivo, o tempo de funcionamento e criação da empresa, o faturamento anual e o nível de endividamento.

Outros aspectos poderão ser considerados, pois a relação não é exaustiva.

QUEM SE SUBMETE A ESSE REGIME JURÍDICO

A sociedade empresaria, a sociedade simples, a sociedade cooperativa e o empresário individual podem requerer a sua própria recuperação judicial.

A recuperação judicial também poderá ser requerida, conforme o caso, pelo liquidante, cônjuge sobrevivente, herdeiros do devedor, inventariante e pelo sócio remanescente.

Entretanto, não se sujeitam a esse regime as pessoas físicas que exerçam atividade econômica autônoma, de forma individual ou organizada, inclusive quem explore propriedade rural, desde que seu patrimônio líquido e sua renda anual não ultrapassem os limites estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, para os fins de declaração do imposto de renda, pessoa física.

O último texto da emenda aglutinativa, tal qual o substitutivo do relator e a atual subemenda global do relator não admitem nem a recuperação das empresas nem a falência dos ativos das empresas públicas e das sociedades de economia mista e das instituições financeiras, porque sobre elas deverão dispor leis específicas..

Contudo, não há por que afastá-las. Os argumentos, data máxima vênia, não convencem.

A subemenda adota a terminologia do projeto do Executivo voltando a chamar-se falência ao invés de liquidação judicial

MINISTÉRIO PÚBLICO

O Ministério Público passa a intervir necessariamente nos processos de falência e recuperação judicial.

Não obstante, o ideal, como pretendia o projeto original, será a intervenção do parquet em todos os atos previstos na lei, mas se, sua manifestação não se der no prazo indicado, os autos retornarão ao Juízo, evitando-se desta maneira atrasos injustificáveis, com o que se dinamizará o curso do processo.

QUEM PODE REQUERER

Podem requerer a recuperação da empresa a sociedade empresaria, a sociedade simples, a sociedade cooperativa e o empresário individual e, conforme o caso, o liquidante, o cônjuge sobrevivente, os herdeiros do devedor, o inventariante e o sócio remanescente.

CONDIÇÕES NECESSÁRIAS

A condições imposta é: exercício de suas atividades por mais de dois anos, de forma regular, e ainda preencha o devedor os seguintes requisitos:

I – não ser falido ou, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;

II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, requerido recuperação judicial ou não ter deixado de cumprir recuperação judicial anterior;

III – não ter pedido de falência pendente, salvo se, julgado improcedente, encontrar-se em exame pela instância recursal; e

IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio-controlador de empresa, pessoa condenada por qualquer dos crimes capitulados nesta lei.

FORMAS DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL

A recuperação pode dar-se por meio da concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas, vincendas ou que se vencerem antecipadamente, em virtude da recuperação judicial.

Também poderá ocorrer, por outros meios, tais como: I - concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas, vincendas ou que se vencerem antecipadamente por força do requerimento de recuperação judicial; II - cisão, incorporação, fusão, constituição de subsidiária integral ou cessão de quotas ou ações da sociedade; III - substituição total ou parcial dos administradores; IV - aumento de capital social; V – arrendamento, de preferência às sociedades cooperativas formadas por empregados da própria empresa, atendendo às exigências de seguro dos bens e outras que o juiz entender necessárias, sem que se caracterize a sucessão de dívidas ou transferência de direitos e obrigações; VI - celebração de acordo coletivo de trabalho, inclusive para reduzir salários e aumentar ou reduzir a carga horária dos trabalhadores; VII - dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro; VIII - constituição de sociedade de credores; IX - venda parcial dos bens; X - equalização dos encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto nas legislações específicas que disciplinam a matéria; XI - usufruto da empresa; XII - administração compartilhada; XIII - emissão de debêntures, sujeita à condição de aceitação pela maioria em assembléia de credores; XIV – constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar em pagamento dos créditos os ativos da empresa em recuperação judicial, ressalvado o direito dos credores dissidentes receberem seus créditos quando da realização dos ativos, pelo valor que lhes caberia em rateio proporcional aos valores de avaliação; e XV – substituição de garantia.

O rol de hipóteses é exemplificativo, de sorte que poderá haver outras situações que autorizem a recuperação.

PETIÇÃO INICIAL

A petição inicial será instruída com os documentos indicados no artigo 52 desta subemenda, destacando-se o plano de recuperação judicial e o resumo, com a estimativa do prazo necessário para o cumprimento da mesma.

A subemenda trata exaustivamente da matéria, prevendo a constituição pelo juiz do comitê e do administrador judicial e de todos os atos judiciais e o processo.

A questão fundamental que se antepõe é saber-se se todo o processo não conduzirá a uma via crucis que, tal qual ocorre atualmente com concordata, eternizará a recuperação judicial com reais prejuízos para o devedor e para o credor, anulando as boas intenções do legislador.

ASSEMBLÉIA GERAL DE CREDORES

A assembléia geral de credores exerce função das mais importantes, seja na falência, seja na recuperação da empresa.

Na recuperação judicial, aprova ou revê o plano apresentado pelo devedor, propõe alternativas ou concorda com o mesmo, requer a constituição do Comitê de Recuperação Judicial, indica seus membros, composto por cinco membros efetivos e suplentes, escolhidos dentre os grupos de credores (grupos de empregados, credores quirografários, com garantia real ou privilégios e do devedor), sem descurar de outros miteres.

Na recuperação extrajudicial, delibera sobre o acordo de recuperação, produz documentos, aprova a proposta de recuperação do devedor, além de outros encargos.

A convocação far-se-á, pelo juiz, na recuperação judicial e na falência, por meio de edital, publicado no órgão oficial. Conquanto preveja que a citação, a intimação, a interpelação, a reclamação e a comunicação possam ser feitas também por qualquer meio eletrônico de transmissão de mensagens, omitiu a subemenda global do relator a expressa menção da edição do aviso em site próprio da Internet, aproveitando a grande oportunidade de encampar uma das maiores conquistas, na área de comunicação.

Em se tratando de recuperação extrajudicial, o devedor deverá fazê-lo, também mediante publicação de edital.

ADMINISTRADOR JUDICIAL E COMITÊ DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL

O juiz, no prazo de dez dias, deverá analisar o pedido de recuperação judicial e, se estiver de acordo com as exigências legais, determinará seu processamento e nomeará o administrador judicial, mandando constituir o comitê de recuperação judicial, se cabível, isto é, no caso de suma complexidade do procedimento concursal e em vista do poder econômico-financeiro do devedor.

O comitê poderá ser constituído, por ordem do juiz, em qualquer fase da recuperação judicial, a requerimento da assembléia.

O administrador deverá ser um profissional idôneo, de nível superior, com formação, preferencialmente, em uma das seguintes áreas: direito, economia, administração de empresa ou contabilidade.

O comitê, presidido pelo administrador, terá a representação dos empregados, da classe de credores com garantia real ou de privilégios e do devedor.

RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL

Esta é uma novidade alvissareira, permitindo que o acordo de recuperação da empresa possa ocorrer fora do âmbito judicial, formalizado em instrumento próprio ou por deliberação da assembléia geral de credores. (12) Esta situação não caracteriza a falência.Trata-se de acordo, confluência de vontades, eis por que é perfeitamente compatível com o instituto da arbitragem.

Segundo a proposta da subemenda global do relator, o devedor deverá apresentar o plano de recuperação extrajudicial, para os credores ou classe de credores, devidamente convocados.

A assembléia geral dos credores, realizada na cidade, em que estiverem domiciliados os credores, representando a maior parcela do passivo, será convocada por edital, publicada duas vezes, com intervalo de cinco dias, em jornal de circulação nacional.

O devedor deverá demonstrar a viabilidade da recuperação, da mesma forma prevista para a recuperação extrajudicial.

HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL

O artigo 77 dessa subemenda global do relator, tal qual a subemenda aglutinativa global, dispõe que o devedor poderá requerer sua homologação em Juízo.

Ora, essa homologação descaracteriza totalmente o instituto da arbitragem ou da solução de conflitos mediante acordo, previsto na Lei 9307, de 2 de setembro de 1996, e também no Código Civil de 2001. Se o legislador tencionava permitir que a recuperação se fizesse, de maneira célere e desburocratizada, na verdade seu intento será anulado, em face dessa faculdade que, na prática, se tornará obrigatória.

Nem se diga que, para valer perante terceiros, mister se faz sua homologação judicial, visto que a própria subemenda admitiu sua existência, independentemente da homologação pelo juiz.

Essa prática – solução amigável das pendências – é universalmente aceita e operada, em todos os Países.

A Lei de Sociedade por Ações foi contemplada com a alteração, permitindo a previsão, nos estatutos das sociedades por ações, da possibilidade de resolução das dissidências, por meio da arbitragem, entre os acionistas e a companhia, ou entre os acionistas controladores e os acionistas minoritários (Lei nº 6404, de 15 de dezembro de 1976, alterada pela Lei nº 10303, de 31 de outubro de 2001, artigo 109, parágrafo terceiro).

A Lei 9307/96 não deixa margem a qualquer dúvida, quanto a sua constitucionalidade, porquanto o artigo 25 determina que, sobrevindo, no curso da arbitragem, divergência acerca de direitos indisponíveis, de cuja existência ou não, dependerá o julgamento, o árbitro ou o tribunal arbitral mandará as partes, para o Juízo competente. A seu turno, o artigo 31, erige a sentença arbitral, se condenatória, em título executivo, com os mesmos efeitos da decisão proferida pelo Poder Judiciário e não inibe a parte de ingressar, em Juízo, seja para embargar possível execução, seja para demandar sua nulidade (artigos 31 a 33). Neste sentido, a opinião dos doutos (Célio Borja, Frederico Marques e Hamilton de Moraes e Barros, apreciando a lei anterior, e, já, recentemente, José Janguiê Bezerra Diniz, Geraldo Brindeiro, Carlos de Laet, Stefânia Guimarães e Regis de Oliveira). A sentença arbitral estrangeira ficará sujeita apenas à homologação do Supremo Tribunal Federal, para ser reconhecida ou executada, no País. (13)

O Supremo Tribunal Federal julgou constitucional a Lei 9307, de 23 de setembro de 1966, tendo como relator o Ministro Nelson Jobim.

A Lei 8987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos previstos no artigo 175 da CF, estabelece como cláusula essencial a que diz respeito ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais, conquanto se aplique a esses contratos administrativos a Lei 8666/93, a qual estabelece as normas gerais sobre licitações e contratos com a Administração Pública. Assim, também a Lei Geral de Comunicações e a Lei do Petróleo.

O Deputado Ricardo Fiúza aceitou nossa sugestão, no sentido de propor o acréscimo de um parágrafo ao artigo 853 do Código Civil, autorizando o Poder Público a submeter-se à arbitragem, nas relações de contrato público e licitações. (14)

A melhor doutrina aconselha, com ênfase, essa postura, destacando-se os mestres, Carlos Mota Pinto e Maria C. Menezello.

O mundo dos negócios exige presteza e não se compatibiliza com a burocracia e morosidade.

CONCORDATA

A concordata pode ser preventiva ou suspensiva e difere fundamentalmente da recuperação da empresa, pelos seus fundamentos e natureza.

O Código Comercial admitia o instituto da moratória.

De acordo com a lei vigente, Sampaio de Lacerda sustenta que a concordata preventiva ou suspensiva é o ato processual pelo qual o devedor propõe a melhor forma de proceder ao pagamento dos credores. Estuda o autor as várias teorias que explicam a natureza jurídica da concordata.

Trata-se na verdade, como expõe esse estudioso, de ação visando a prorrogação do prazo para pagamento ou a remissão parcial dos débitos. Ou ainda da modalidade mista, que engloba as duas, com o objetivo de obter abatimento e pagar num prazo maior. (15)

Conquanto a concordata tenha em vista também a recuperação do devedor, estendo-lhe o prazo e propiciando-lhe as condições para pagamento da dívida, mediante a moratória ou a remissão parcial da dívida, ou pela comunhão de ambas, sem dúvida, o instituto da recuperação da empresa não se confunde com aquela, por ser de natureza e modalidade diversas. Basta a simples comparação entre ambos os institutos para se chegar e esta conclusão.

Deste entendimento também partilha Jorge Pereira Andrade, alicerçado nos ensinamentos de Messineo. (16)

PRÁTICA DIUTURNA

A recuperação extrajudicial, embora não nominalmente, já vem ocorrendo na prática diuturna.

Exemplo típico é a possível fusão da VARIG e da TAM, visando a preservação da atividade, de extrema importância para o País e para os credores e empregados.

A Encol talvez não fosse levada à falência, se esse instituto já existisse no direito positivo, sem embargo da punição que devesse ser imposta a maus administradores. Entretanto, é bom lembrar que, em parte, ela foi aplicada, quando compromissários-compradores se propuseram a terminar a construção de edifícios incorporados, conseguindo pleno êxito.

Ademais, a utilização desse instituto, extra-oficialmente, ainda que não introduzido no direito positivo, não inibe a punição dos devedores relapsos e criminosos.

MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE

A referida subemenda global do relator também trata da recuperação judicial das micro-empresas e empresas de pequeno porte (17), sem a restrição de um mínimo de cem empregados, tal qual propuséramos, na primeira Comissão ministerial, vez que aquele instituto traduz moderna orientação doutrinária, agasalhada por inúmeros países.

Traça procedimento especial e manda aplicar a essas empresas as disposições contidas nas legislações específicas que dispõem sobre o tratamento jurídico diferenciado, simplificado e favorecido. Para os fins desse projeto, elas poderão manter escrituração comercial simplificada. Aplicam-se-lhes as disposições dessa subemenda no que com ele não colidir.

Lamentavelmente, segundo se depreende da subemenda, somente da recuperação judicial poderá valer-se os empresários de micro-empresas e de pequeno porte.

Essa restrição não tem sentido, visto que "quem pode o mais, pode o menos". Se o legislador faculta a utilização da recuperação extrajudicial, pelas empresas médias e grandes, por que não permitir também às pequenas empresas essa inovação?

Na verdade, não há justificativa plausível para essa omissão, pois fere o princípio da isonomia.

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Sobre o autor
Leon Frejda Szklarowsky

Falecido em 24 de julho de 2011. Advogado, consultor jurídico, escritor e jornalista em Brasília (DF), subprocurador-geral da Fazenda Nacional aposentado, editor da Revista Jurídica Consulex. Mestre e especialista em Direito do Estado, juiz arbitral da American Association’s Commercial Pannel, de Nova York. Membro da membro do IBAD, IAB, IASP e IADF, da Academia Brasileira de Direito Tributário, do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, da International Fiscal Association, da Associação Brasileira de Direito Financeiro e do Instituto Brasileiro de Direito Tributário. Integrou o Conselho Editorial dos Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, da Editora Revista dos Tribunais, e o Conselho de Orientação das Publicações dos Boletins de Licitações e Contratos, de Direito Administrativo e Direito Municipal, da Editora NDJ Ltda. Foi co-autor do anteprojeto da Lei de Execução Fiscal, que se transformou na Lei 6830/80 (secretário e relator); dos anteprojetos de lei de falências e concordatas (no Congresso Nacional) e autor do anteprojeto sobre a penhora administrativa (Projeto de Lei do Senado 174/96). Dentre suas obras, destacam-se: Execução Fiscal, Responsabilidade Tributária e Medidas Provisórias, ensaios, artigos, pareceres e estudos sobre contratos e licitações, temas de direito administrativo, constitucional, tributário, civil, comercial e econômico.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SZKLAROWSKY, Leon Frejda. A recuperação de empresa na nova Lei de Falências. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 103, 14 out. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4425. Acesso em: 27 abr. 2024.

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Texto publicado na Revista Jurídica Consulex nº 156 (15 de julho de 2003).

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