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A cidadania brasileira em tempos de globalização.

Repensando o federalismo

A cidadania brasileira em tempos de globalização. Repensando o federalismo

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INTRODUÇÃO

Vivemos em um período de grandes e profundas transformações, resultado de um fenômeno que alterou substancialmente o nosso modo de analisar o mundo, o qual possibilitou, graças essencialmente à sua faceta tecnológica, além de um incremento gigantesco das transações comerciais e financeiras entre todos os atores do cenário geopolítico internacional, via uma feroz desregulamentação da economia mundial, uma íntima conexão entre gramáticas sociais localizadas e práticas de cunho global, sendo derrubadas as distâncias, os marcos espaço-temporais, permitindo que um número crescente de indivíduos tomem consciência de eventos que, até então, eles não tinham o menor conhecimento.

Esse processo, não obstante o seu nítido aspecto polissêmico, revela-se dominado e moldado por uma linguagem acentuadamente econômica e financeira, a qual modificou substancialmente a figura tradicional do Estado-Nação, pois o mesmo encontra-se agora submetido a uma ordem internacional obcecada por produtividade e alta lucratividade, onde impera a força das grandes corporações empresariais, na qual antigas fronteiras ou barreiras protecionistas são absorvidas e superadas por um suposto mercado livre, questionando, assim, o próprio princípio da soberania. Esse citado fenômeno é popularmente denominado como globalização.

Os efeitos de tal globalização extrapola em muito o plano mercadológico, já que têm fomentado um pensamento de cunho unificador, um discurso único que nega as diferenças e alteridade da modernidade, colocando em segundo plano a participação consciente das pessoas no interior das suas sociedades, pois os mesmos são vistos, nessa perspectiva, como consumidores, e não cidadãos ativos, fato este que atinge, diretamente, os direitos da cidadania em um Estado Democrático de Direito, aprofundando a exclusão social, que torna-se, desse modo, global.

"A força dos conglomerados transnacionais, o surgimento de esferas de decisão política e econômica em torno das diversas pessoas jurídicas de direito internacional público, grupos de Estados ligados por interesses comuns e consórcios regionais, além da hegemonia do pensamento econômico liberal, vêm esvaziando as democracias e conseqüentemente retirando poder de seus cidadãos." (PIOVESAN, 2002: 450)

Daí, que os questionamentos e análises que pretendemos desenvolver vinculam-se, essencialmente, com a seguinte colocação interrogativa: em um mundo globalizado, onde se busca uma unidade sedimentada no mercado, onde as especificidades não são consideradas, que se desregulamenta mais e se governa menos, e, principalmente, onde os sujeitos de direito não são reconhecidos como pólos ativos nas decisões, é ainda possível reconstruir e organizar uma cidadania plena e participativa?

Eis aí, ainda que sucintamente, o pano de fundo de nosso trabalho, o qual pretende demonstrar que o processo de globalização, em sua versão economicista, não é a única via possível para uma integração a nível mundial, existindo outros trajetos, mais transparentes, abertos e plurais, que podem potencializar os ganhos que a alta tecnologia tem produzido, em prol de uma cidadania participativa e democrática, onde o social não é tratado como algo residual, secundário, o que coloca como objetivo central da presente monografia revelar que, sem discutirmos o nosso sistema federativo, visando proporcionar mais força decisória aos municípios, entidades de classe, associações de bairro e outras estruturas ainda menores de integração social local, alcançando o próprio indivíduo em seus relacionamentos intersubjetivos, não há que se pensar em uma positiva inserção do Estado brasileiro nessa competitiva arena global, haja vista que o cidadão global tem como pressuposto necessário a efetivação dos direitos da cidadania no âmbito local.

Para podermos responder ao supra citado questionamento e a outras indagações formuladas no decorrer do trabalho em tela, é que estruturamos a monografia em duas partes.

Inicialmente buscamos demonstrar que o processo de globalização não é algo totalmente novo e de significado único, como as forças econômicas predominantes fazem crer, mas que o mesmo se faz sentir em todos os campos do agir humano, colocando em xeque a própria noção de uma cidadania participativa, consubstanciada esta, em uma provável e desejável autolegislação.

Em um segundo momento, desenvolveremos nossa posição de que uma provável saída para uma inserção mais justa da sociedade brasileira na aldeia global é criarmos canais de comunicação e de política deliberativa o mais abertos possíveis, através de uma descentralização democrática de nosso federalismo, os quais, em tese, permitirão que todos os cidadãos sintam-se responsáveis pelas decisões tomadas, pois todos os temas e assuntos, até mesmo os mais específicos, terão a possibilidade de serem discutidos e problematizados irrestritamente.

Ressalte-se, finalmente, que todas essas observações serão pautadas pela interdisciplinariedade, já que não existem, na maioria das vezes, mais conhecimentos que possam ser construídos sem um diálogo entre as diversas áreas do saber, pois na modernidade predomina a complexidade e a pluralidade de formas de vida, sendo assim, essas mesmas análises serão trabalhadas todo o tempo sob a ótica do paradigma do Estado Democrático de Direito, por entendermos ser este o mais adequado instrumental para lidarmos com todos os questionamentos que aqui serão abordados.


PARTE I – GLOBALIZAÇÃO E CIDADANIA: COLOCAÇÃO DO PROBLEMA

Globalização é um dos conceitos em voga na atualidade, sendo seu significado na maioria das vezes reduzido ao aspecto econômico-financeiro, fato esse que tem contribuído para ocultar o caráter multidimensional que tal termo apresenta. Essa redução temática não permite que visualizemos, corretamente, inúmeras e profundas transformações que esse fenômeno tem ocasionado em todas as áreas da nossa vida social, ou seja, sem repudiarmos esse discurso único, de lugares-comuns, naturalizado e acrítico, que procura restringir o dinâmico processo da globalização somente ao seu âmbito economicista, será extremamente complicado lidarmos com as conseqüências, incertezas e riscos que essa mesma globalização tem provocado na esfera dos direitos da cidadania.

"O fato de ser uma palavra "da moda" fez com que ela, mesmo tendo surgido para supostamente apontar algo "novo", esteja já desgastada pelo uso excessivo e pouco rigoroso que dela se tem feito. Hoje já há um certo cansaço da idéia de globalização. Na verdade, esse "cansaço" da expressão reflete o fato de que globalização é um termo vazio de novidade, na medida em que o fenômeno a que se refere, não é, de fato, novo."

(NEUENSCHEWANDER MAGALHÃES, 2000: 256) [1]

Ao iniciarmos nossa análise sobre a globalização e seus reflexos na construção da cidadania brasileira, devemos, primeiramente, esclarecer o seu aspecto econômico, pois, como dito anteriormente, predomina uma visão mercadológica desse "novo" fenômeno. Essa faceta da globalização afirma que tal conceito reflete um intricado processo de relativização das fronteiras e soberanias nacionais, com a queda de várias das tradicionais barreiras e tarifas protecionistas, além de uma ampla e irrestrita abertura do comércio internacional, possibilitando que o capital se movimente, livremente e sem quase nenhum controle por parte dos Estados Nacionais e suas legislações internas, em uma escala planetária.

Na perspectiva daqueles que defendem essa posição econômica, a intensificação maciça das trocas comerciais e financeiras em um âmbito global, baseada nessa completa desregulamentação e em uma rede de informações que redefiniu a categoria de espaço-tempo, onde o próximo e o distante estão agora quase unidos, permitiria que o próprio mercado equacionasse os problemas existentes em torno da distribuição de riquezas, pois o aumento da circulação de mercadorias faria com que todos os envolvidos nesse desenvolvimento das transações comerciais acabassem sendo beneficiados. [2]

Essa apologia de uma democracia de mercado global, não consegue compreender, por ser excessivamente restrita, que o "desenvolvimento entendido como simples crescimento econômico nunca foi de per si garantia de direitos, nem civis e políticos, nem econômicos e sociais." (PIOVESAN, 2002: 81)

Ao fato de não ser o crescimento econômico requisito único e suficiente para a conquista e efetivação de direitos, acrescente-se, a título de esclarecimento, que em um país que se inseriu tardiamente no capitalismo industrial, que está na periferia da economia mundial, dependente de recursos externos, como é o caso brasileiro, essa era global é ainda mais trágica, pois, além de provocar um agravamento do alarmante desequilíbrio social encontrado nas estruturas sociais brasileiras, reduz sensivelmente o campo de participação efetiva do cidadão, já que o modo como se tem dado a inserção do Brasil nesse mercado internacional não tem sido pautado por uma prévia e ampla discussão com todos os setores e camadas da nossa sociedade afetados pelos resultados da abertura da nossa economia ao exterior.

Com efeito, os impactos sociais da globalização econômica no âmbito brasileiro têm significado, primordialmente, redução de despesas públicas destinadas a setores como saúde e previdência, flexibilização de direitos trabalhistas, desemprego estrutural e tecnológico, aumentando o fosso que separa ricos e pobres, gerando obviamente, mais exclusão, pois surgem novas desigualdades ao lado daquelas já existentes. [3]

Cabe aqui fazer um pequeno parênteses, para ressaltar que a globalização só se viabilizou em virtude de um aumento, sem precedentes, da técnica e da informação, o que, por si só, não é negativo, na medida em que as necessidades básicas do homem podem ser melhor atendidas, aumentando - se, dessa forma, a disposição e o tempo do indivíduo para dedicar-se a si mesmo e a seu país, sua coletividade. [4]

Nesse sentido, podemos verificar que o que é prejudicial é uma estrutura político-ideológica deturpada, fundamentada em normatizações excessivamente particularistas, de utilização desse considerável avanço tecnológico, bem como a conseqüente reorganização e reacomodação das interações acerca do exercício do poder entre os Estados, isto é, entre os países centrais e os denominados países periféricos, tudo isso configurando o que ousaríamos definir de uma linguagem racionalmente irracional.

Em síntese, essa linguagem do mercado global, que dá os contornos dessa mentalidade dominante, que a todos procura alcançar, em sua característica mais perversa, faz crer que qualquer tipo de manifestação contrária é inútil e contraproducente, não havendo alternativas, buscando erigir uma total uniformização através de um discurso único, no qual não existe uma responsabilidade pelo outro, pois este é encarado como um competidor em potencial, um inimigo a ser derrotado, ou seja, globalização, nessa vertente econômica, designa uma "socialização às cegas, visto ter conseguido de fato englobar o mundo." (THÉLÉNE, 1999: 16)

Daí que, se nos circunscrevêssemos apenas a esse lado econômico e comercial, perderíamos de vista o foco central do tema, qual seja: esse fenômeno da globalização introduziu uma série nova de variáveis no cenário das relações internacionais, com reflexos profundos também nas nossas esferas internas.

Nesse sentido, vale salientar que o assunto em questão admite uma série inesgotável de linhas de raciocínio, o que denota o caráter interdisciplinar da matéria. Assim, sociólogos, cientistas políticos, economistas, juristas e demais estudiosos enquadram o fenômeno da globalização, bem como seus efeitos, a partir de prismas diferentes e ao mesmo tempo específicos, objetivando, dessa forma, escapar dos estereótipos ingênuos existentes, alguns dos quais nos levam a supor e acreditar que somente existe uma única e exclusiva espécie de globalização, à qual temos de nos submeter, pois inevitável.

Recentes transformações resultantes dessa internacionalização da economia mundial provocaram um deslocamento do pêndulo do poder decisório para o exterior, para organismos internacionais, intérpretes dos anseios dos chamados Estados centrais, esvaziando a importância das políticas locais, o que tem provocado repercussões danosas no nosso já injusto quadro societário, pois muitas das decisões que vêm sendo tomadas não levam em consideração, por exemplo, as especificidades brasileiras, colocando em segundo plano projetos de interesse local.

Existem, portanto, outras facetas da globalização que estão sendo esquecidas, ou ofuscadas pelo domínio de um ponto de vista concentrado, em demasia, em uma ótica do mercado. Por exemplo, o processo de globalização, como dito acima, em sua dimensão político-jurídica, têm modificado, significativamente, os mecanismos de exercício e circulação do poder, já que, tanto externamente quanto internamente, o famoso princípio da soberania tem sido criticado, questionado, chegando alguns teóricos e estudiosos a afirmarem, a grosso modo, que o mesmo não passaria, no presente, de um mero símbolo, mesmo que com uma carga valorativa ainda muito representativa para a maior parte das pessoas. [5]

Quando a análise parte de uma perspectiva mais dogmática da soberania externa ou política, entendida essa como o poder que os Estados possuem de determinar suas próprias políticas em relação aos demais atores internacionais, podemos afirmar que está havendo uma verdadeira transferência de soberania (política e econômica) dos países periféricos para entidades ou instituições, como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial ou a Organização Mundial do Comércio, controladas pelos ditos Estados mais capacitados, técnica e economicamente, ou suas enormes corporações empresariais, visando impedir qualquer regulação interna dos países menos desenvolvidos, ou seja, há todo um conjunto de procedimentos que, ao influir no sistema político destes mesmos Estados periféricos, acaba por também atingir o seu aparato jurídico. Em outras palavras, a globalização tem restringido o papel clássico da soberania dos Estados, ainda que, principalmente, dos países do terceiro- mundo, pois tem provocado a perda de poder nacional, corroendo a legitimidade das estruturas decisórias dos mesmos.

Já a soberania interna ou jurídica, tida como o poder que o Estado se utiliza para dar validade e eficácia ao seu ordenamento jurídico, tem sido também caracterizada por modelos procedimentais de exclusão. Não surpreende, portanto, que num cenário globalizado, as relações entre os Estados e, entre estes e seus cidadãos, sejam do padrão periferia/centro.

Desta maneira, podemos assumir que, em ambos os enfoques, o conceito de soberania revela-se por demais defasado perante esse contexto de globalização, já que o mesmo não consegue mais adequar-se aos novos parâmetros normativos impostos por essa mesma globalização, além do fato de que os poderes locais estão, gradativamente, como demonstrado, perdendo ou tendo reduzido a sua capacidade de criar, negociar e decidir a respeito de assuntos de interesse dessas mesmas localidades. [6]

Nessa linha, ensinava o Professor Milton Santos que "como os atores globais eficazes são, em última análise, anti-homem e anticidadão, a possibilidade de existência de um cidadão do mundo é condicionada pelas realidades nacionais." (SANTOS, 2000: 113)

Tendo em vista essa reconfiguração da distribuição de poder na era global, principalmente num país periférico como o Brasil, podemos dizer que essa visão unicamente econômica, neoliberal, do que seja a globalização tem produzido uma contenção das alterações possíveis, preservando o status quo vigente, já que tem mantido, como já ressaltado, grande parcela dos indivíduos distante das esferas referenciais de seleção e decisão das políticas públicas, tanto a nível externo, quanto interno, o que só faz crescer o déficit de cidadania e a deslegitimação normativa, gerando graves e perturbadoras crises de anomia, como a verificada, atualmente, na Argentina.

Portanto, em razão dessa pouca amplitude e abrangência que um ponto de vista, exclusivamente, econômico-financeiro dá aos questionamentos que gravitam em torno do processo de globalização, negligenciando outras relevantes dimensões e variáveis que o mesmo processo possui, tal como o problema exposto da conformação da cidadania em um ambiente globalizado, é que entendemos ser importante trabalharmos com abordagens que não sejam apenas voltadas para o incremento global das trocas comerciais, já que as conseqüências advindas de tal fenômeno atingem, profundamente, todas as estruturas de nossas sociedades, configurando novos padrões de comportamento social, o que acaba influenciando a formação e participação da cidadania em um Estado Democrático de Direito.

A questão da cidadania na era global torna-se, então, um problema que precisa ser levado em conta quando do estudo da nova ordem internacional. Partindo, ainda que utopicamente, de uma perspectiva sociológica, podemos pensar a globalização como um potencial embrião de uma sociedade mundial, mais solidária, fundamentada em múltiplas e rápidas redes de informações, criando uma linguagem própria em uma sociedade pluralista, isto é, a globalização pode ser extremamente positiva, caso consiga superar essa linguagem do consumo irrealizável, pois o predomínio da técnica, como dissemos e ressaltamos anteriormente, por si só não é algo negativo, já que pode vir a permitir o surgimento de instâncias internacionais críticas de diálogo, desvinculadas, até mesmo, dos ordenamentos estatais e das teias do mercado, contribuindo para uma positiva reconstrução constante da diversidade, reforçando uma cultura de vizinhança e aprofundando a democracia.

"A globalização pode assim ser definida como a intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distância e vice-versa." (GIDDENS, 1991: 69)

Ora, ao traçarmos uma linha de continuidade entre as diversas posições supra elencadas, reunindo e problematizando tanto a vertente economicista mais conservadora, quanto aquelas de caráter sociológico, político e jurídico, verificaremos que nossas sociedades, sociedades de risco, a partir desse domínio hegemônico da tecnologia de informação e de produção, mostram-se cada vez mais complexas e plurais, como resultado de um horizonte infinito de escolhas que a modernidade e sua "racionalidade técnica" têm produzido, fato esse que colocou em xeque o papel tradicional dos Estados-Nação. Essa complexidade nada mais significa do que a intensificação das possibilidades de agir, e a contingencialidade de toda decisão tomada, não sendo mais possível prever todas as conseqüências de uma escolha realizada, o que torna a sociedade global altamente arriscada. Apesar da grande variedade de opções, o que a globalização econômica também traz à tona, da forma como está sendo implementada, é a vinculação da tomada de decisões dos países periféricos a fatores e determinações exógenas, diminuindo assim as alternativas de ação à disposição de tais Estados-Nação.

Estes Estados, assim, não mais conseguem configurar, positivamente, os padrões de cidadania apropriados aos princípios norteadores do paradigma constitucional-democrático, já que estão cada dia mais vinculados a lógicas externas, marcadas por um pensamento pragmático e individualista, o que tem afetado, drasticamente, sua capacidade interna de gerir seu próprio sistema econômico, político e jurídico. Ou seja, o atual aparato jurídico dessas nações menos desenvolvidas não conseguem mais responder aos desafios impostos pela extrema complexidade das relações sócio-institucionais pós-globalização econômica.

Como bem assevera Habermas, "hoje são antes os Estados que se acham incorporados aos mercados e não a economia política às fronteiras estatais." (HABERMAS, 1999: 05)

Essa nova arquitetura do Estado-Nação tem sido muito influenciada e moldada por uma outra conseqüência oriunda desse vertiginoso crescimento tecnológico da modernidade globalizada, que é uma falta completa de parâmetros conceituais fixos para explicar quaisquer dos fenômenos vivenciados no presente, pois os significados de clássicos conceitos, como liberdade, igualdade, soberania, dentre outros, foram demasiadamente relativizados em um época de insegurança e incerteza permanente, onde todos os termos são passíveis de serem questionados. Esta circunstância é inquestionável. Admitirmos e lidarmos com os riscos inerentes dessa moderna e radical globalização, na qual impera um espectro ilimitado de opções para guiar as ações é, em nosso entendimento, a única saída para solucionar, mesmo que transitoriamente, alguns dos problemas que essa mesma modernidade e sua globalização revelaram, haja vista que fomos "lançados num vasto mar aberto, sem cartas de navegação e com todas as bóias de sinalização submersas e mal visíveis..." (BAUMAN, 1999: 94)

É dentro dessa conjuntura complexa que se faz mister repensarmos o que seria realmente uma cidadania democrática, participativa, já que esta, conforme a compreendemos, pressupõe a idéia da autogestão de seu espaço individual, sem que isso signifique egoísmo ou abuso, sendo o meio adequado para possibilitar potenciais divergências e transgressões racionalmente admitidas, isto é, capacidade de ser tratado como igual apesar das diferenças e de se inserir neste mundo globalizado a partir dessas mesmas particularidades. Contudo, o modo como a globalização vem sendo implementada tem traduzido uma redução do espaço de comunicação intersubjetiva dos cidadãos, pois desvaloriza os micro espaços políticos de debates e discussões.

Aqui, já podemos adiantar, ainda que superficialmente, pois pretendemos voltar a essas idéias posteriormente, que só haverá cidadania plena quando as pessoas puderem, consciente e livremente, participar das decisões que afetarão seus próprios destinos, o que transparece a necessidade de valorizar os espaços decisórios e as políticas deliberativas locais, pois esta valorização é, em nossa compreensão, um pressuposto de uma provável cidadania global. [7]

Vemos, por conseqüência, ser necessário redefinirmos a existência em comum, tanto a nível local, quanto global, já que esses dois âmbitos são interdependentes, o que realça a importância de criarmos "canais de informação e intermediação" os mais transparentes possíveis na nossa sociedade, os quais poderão possibilitar o aparecimento de posições mais críticas diante da realidade, podendo resultar em uma genuína conscientização do cidadão.

Cidadão como um indivíduo que vive e pratica cotidianamente a democracia, entendida esta como um projeto sempre inacabado, que necessita constantemente de ser revisto, reconstruído e legitimado, realçando a tentativa de inclusão radical de todos, de modo igualitário, sem significar com isto uma negação das diferenças, das especificidades do outro.

Essa visão de uma cidadania responsável, como uma potencial autodeterminação, em um contexto de intersubjetividade democrática, pressupõe uma mudança do próprio homem, do seu modo atual de vida, de uma recusa ao interesse imediato, aceitando a diversidade, colocando-se contrário a esta ilógica razão predominante que parece desejar abarcar todas as alternativas humanizadoras que porventura sejam propostas.

Além disso, em virtude da pluralidade inerente ao ser humano, o sonho de uma utópica cidadania global, alicerçada em bases locais, não pode nunca significar a imposição de apenas uma espécie de linguagem, ou de uma só forma de vida, pois "os princípios fundamentais ou básicos para uma melhor sociedade, na qual todos possam viver, nem sempre realizam, concretamente, um único tipo de comunidade aceitável para todos, desde que será impossível definir, para todas as pessoas, exclusivo modo de vida e viver." (BARACHO, 1995: 13)

Evidencia-se, então, que em época de globalização, o sentido de cidadania necessita ser reconstruído a partir de uma base não assistencialista, a qual equipara o cidadão a um menor impúbere, como se este necessitasse de um "tutor", que seja oposta a um economicismo desumanizador, reconhecendo a igualdade dos indivíduos enquanto membros plenos, ativos e responsáveis de uma dada sociedade, e ao mesmo tempo valorizando e tematizando o pluralismo existente, os espaços locais mais próximos dos indivíduos e de suas relações intersubjetivas, o que se coadunaria com os fundamentos do nosso Estado Democrático de Direito.

Essa pretendida constituição de uma nova cidadania só será possível quando o sujeito, tanto na sua esfera privada quanto na pública, sendo ambas entendidas como eqüiprimordiais, tomar consciência de si mesmo e do outro de modo reflexivo, superando o mutismo alienante, a acomodação e o ajustamento, ou seja, o leitmotif dessa cidadania do futuro ainda é a criação e ampliação de espaços públicos não estatais não-coercitivos, os quais possibilitem um agir comunicativo guiado pelo entendimento e respeito recíproco, indo além do mero ato eleitoral em uma democracia representativa como a nossa, tornando os membros de uma comunidade do direito não apenas eleitores, mas cidadãos votantes, já que conscientes dos riscos inerentes em todas as escolhas e decisões que tomarem, assumindo criticamente sua responsabilidade política e social.

Daí o Professor José Alfredo de Oliveira Baracho escrever que:

"A nova versão de cidadania é traduzida pela idéia de uma consciência cidadã no trato com a coisa pública, tanto para a escolha dos dirigentes, como no trabalho social a ser cumprido." (BARACHO, 1995: 104)

É neste ponto que surge, em nossa opinião, uma questão fundamental para entendermos o que é ser cidadão em um mundo globalizado: como esperar que uma pessoa que nem localmente possui ingerência política e poder de decisão possa ser inserida de maneira democrática e não excludente em um cenário internacionalizado?

Refletindo a respeito dessa indagação e de todas as intensas transformações resultantes do processo de globalização, aqui apresentadas, principalmente do seu vetor econômico, sabedores que as mesmas não atingiram apenas as estruturas macroecônomicas, mas também os círculos mais profundos, sociais e individuais, confrontando conceitos e idéias a muito solidificadas, e, fundamentalmente, tendo como pano de fundo as extensas redefinições das consagradas funções e papéis estatais, é que vislumbramos a necessidade de repensarmos, na próxima parte de nosso trabalho, a configuração do vigente federalismo brasileiro, buscando questionar os meios de inserir o cidadão num mundo globalizado e heterogêneo, tentando construir propostas que conciliem os instrumentos de inclusão local como os mecanismos globalizantes, em síntese, a "possibilidade de cidadania plena das pessoas depende de soluções a serem buscadas localmente..." (SANTOS, 2000:113)


PARTE II – POR UMA OUTRA GLOBALIZAÇÃO: NOVAS REFLEXÕES SOBRE O FEDERALISMO

O fenômeno da globalização, como delineado na parte precedente desse trabalho, possibilita-nos verificar que o mesmo, a despeito da prevalência de uma visão acentuadamente técnica-econômica, é na realidade um processo multidimensional, com aspectos políticos, jurídicos e sociais que atingem, além da figura clássica do Estado-Nação, todas as esferas de cidadania e de ação humana. Entretanto, essas outras faces dessa mesma globalização vêm sendo ocultadas, como dito anteriormente, em virtude de uma pretensa homogeneização que a predominante linguagem do mercado livre procura produzir e sedimentar.

"Das muitas e importantes modificações que ele imprime à paisagem da civilização, o perfil mais visível é o econômico, que todavia está longe de esgotá-lo. De par com a expansão e a interpenetração dos mercados, às vezes seguindo-se a elas, outras vezes precedendo-as, em trânsito veloz pelas avenidas da tecnologia, vai-se espalhando, infiltrando, empapando os tecidos da sociedade um conjunto de idéias e valores, de crenças e de comportamentos, que influi vigorosamente na conformação das culturas." (BARBOSA MOREIRA, 2002: 15 – 16)

Vinculado a essas inúmeras dimensões que tal processo de mundialização revela, temos também o fato de que as transformações oriundas do mesmo processo provocaram um enorme abalo nos significados de vários conceitos tradicionais como, por exemplo, os de soberania, igualdade, liberdade e progresso, os quais agora estão sendo muito questionados. Não há como negar que essa angústia conceitual demonstra, perfeitamente, a complexidade, a contingencialidade, e o infinito horizonte de escolhas que os indivíduos possuem no presente, fruto de um gigantesco salto tecnológico, o qual impede o aparecimento de qualquer certeza ou verdade última.

Aqui apresenta-se um questionamento fundamental, que muito explica a nossa opção metodológica, pois como podemos aferir do que foi dito no decorrer deste trabalho, na atualidade há, realmente, graças ao projeto de globalização reinante, uma variedade infindável de opções para nos norteamos, só que os defensores e entusiastas desse modelo não discutem ou problematizam a circunstância de que "todos nós estamos condenados à vida de opções, mas nem todos temos os meios de ser optantes." (BAUMAN, 1999: 94)

Em outras palavras, o que temos assistido, como salientado anteriormente, é um projeto de globalização por demais determinado pela ética do mercado, onde os benefícios gerados pelo aumento e aperfeiçoamento tecnológico e de seus reflexos nas transações comerciais têm sido auferidos por poucos, enquanto os custos advindos desse são repartidos por muitos, ou seja, sem uma democratização da globalização, que permita a redescoberta do que seja o diálogo, a solidariedade e a dignidade inerente a todo ser humano, respeitando e apoiando o pluralismo, não desprezando os âmbitos locais de discussão e participação, não há como pensarmos em um utópica cidadania universal no futuro, pois o cidadão, sujeito titular de direitos é, nessa realidade mundial, onde o tempo e a distância não têm o mesmo peso que possuíam, simultaneamente, global e local.

Eis aí os pressupostos que estão inseridos no título desta parte, o qual é uma paráfrase dos nomes que qualificam as obras dos professores Milton Santos e Vanessa Oliveira Batista, pois entendemos que essa globalização não é irresistível, inquestionável, quando considerada em todas as suas facetas, o que denota que o movimento de globalização não é algo iminentemente negativo, nem que o padrão mercadológico que tem guiado o referido processo seja o único e indiscutível trajeto que podemos trilhar, não havendo alternativas possíveis a seguir. Ao contrário, acreditamos que essa é somente uma perspectiva perversa da era globalizante, sendo clara a possibilidade de encontrarmos outros projetos e caminhos para a globalização, o que em nosso entendimento, passa, necessariamente, pela revisão do nosso modelo de federalismo e de sua inadequabilidade aos novos parâmetros conceituais erigidos pelas transformações impostas por essa mesma época global. [8]

Se desejamos construir uma outra globalização, devemos, fundamentalmente, enfrentar o desafio que as alterações no papel tradicional do Estado impuseram, pois estas reduziram, como demonstrado, drasticamente, o campo de ação e discussão político-jurídico e administrativo que o mesmo era detentor, fazendo com que as demandas sociais, que cada dia se tornam maiores, não sejam passíveis de serem atendidas tão-somente com base em políticas ou/e recursos provenientes de um aparato estatal organizado em moldes apenas internos, o que tem conduzido a uma frustração crescente das expectativas populares, pois os indivíduos não se reconhecem como donos de seus próprios rumos, contribuindo para uma perda contínua de legitimação desse mesmo Estado e de suas instituições, edificando um pernicioso círculo vicioso, onde todos os atores acabam perdendo.

Além disso, a nossa configuração institucional revela, historicamente, que há uma clara escolha político-ideológica de se manter a maior parte dos "cidadãos" afastado das esferas decisórias. Isso é realizado através de todo um arcabouço reacionário e centralizador de exercício do poder, que nega efetividade a qualquer proposta que objetive a formação de modelos de organização societária que valorizem a conscientização e a participação dos indivíduos nas práticas deliberativas. Ou seja, a sociedade brasileira, em muitos aspectos, pouco se transformou, pois o modo como está articulado o exercício e a circulação do poder decisório em nosso ambiente sócio-institucional foi, no máximo, apenas arranhado, permitindo desta maneira um certo continuísmo de ações políticas claramente antidemocráticas e arcaicas, as quais colocam grandes obstáculos ao aparecimento e fortalecimento de agendas e instâncias públicas de debate e diálogo.

Ora, dentro de um conjunto de fatores como os aqui expostos, em que prevalece um discurso único de base economicista, que a tudo parece querer igualar, uniformizar, pretendendo gerar uma verdadeira paralisia da cidadania crítica, não é nenhuma surpresa a falta de posicionamento autônomo de parcela considerável da população brasileira em relação às decisões governamentais adotadas, bem como uma quase completa desnecessidade que os donos do poder, sejam internos ou externos, têm de justificar – mesmo em períodos formalmente democráticos – as conseqüências e finalidades da maioria de seus atos.

Em virtude desses motivos, entre tantos outros, e mesmo sem negar que após a Constituição de 1988 houve um considerável e positivo aumento de participação popular na gestão da coisa pública, é que na maioria das vezes, quando nos remetemos à nossa ordem constitucional, lembramos, como o Professor Menelick de Carvalho Netto, das:

(...) " idéias de constante alteração da Constituição, de excesso de medidas provisórias, de fraqueza institucional e inoperância do Legislativo e do Judiciário, de abusos do Executivo, de apatia e descrença populares, enfim, de um processo de acentuada anomia no mais alto nível normativo de nosso ordenamento, do que à idéia de uma ordem constitucional consolidada, firmemente assegurada pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Judiciário como um todo, na qual inclusive o processo e labor legislativos fossem controlados visando institucionalmente garantir a possibilidade de acreditarmos que somos uma comunidade de homens livres e iguais que ordena em co-autoria seu viver em comum, sem a exclusão de nenhum afetado, ou seja, uma comunidade de homens que se respeitam mutuamente em suas diferenças." (CARVALHO NETTO, 2001: 12)

Para rompermos com essa cadeia nefasta de acontecimentos temos de revitalizar, de maneira profunda e crítica, os espaços de participação e interação local, no caso brasileiro, os municípios e esferas ainda menores, como as associações de bairro e outros movimentos sociais de base, conjuntamente com propostas e idéias como as concernentes aos denominados programas de orçamentos participativos, fomentando e fortalecendo em todas as pessoas o sentimento de co-autoria e de co-interpretação constante e cotidiana do ordenamento constitucional, que em um Estado Democrático de Direito é sempre incompleto e aberto, a qual todos estão subordinados, isto é, deve-se reforçar o grau de influência que os cidadãos e a sociedade como um todo precisam possuir no que tange à configuração dos direitos da cidadania e dos moldes em que os mesmos serão implementados e garantidos.

Daí, que sem a possibilidade de que todos participem, mesmo que em uma pequena escala, do progresso tecnológico e dos ganhos produzidos com a globalização, pensar em concretização de quaisquer dos direitos advindos de uma cidadania livre, integrada, consciente e responsável será mera retórica ilusionista, pois "não há mais como cogitar da liberdade divorciada da justiça social, como também é infrutífero pensar na justiça social divorciada da liberdade." (PIOVESAN, 2000: 148)

Para implantarmos essa proposta de uma cidadania edificada em bases locais, sendo a mesma encarada como um pressuposto para uma inserção mais positiva dos indivíduos em um dinâmico processo de globalização, temos, como já expusemos inúmeras vezes, que repensar e reestruturar o federalismo brasileiro, buscando tornar o mesmo o mais descentralizado possível, visando sedimentar o famoso federalismo de equilíbrio previsto no texto constitucional de 1988. [9]

Uma distribuição e atribuição de poderes decisórios entre todos os entes federados, alcançando inclusive as microestruturas sociais, é de extrema relevância na solidificação de uma cidadania democrática e integrada, pois permite, em princípio, que a própria sociedade encontre e desenvolva, ela mesma, suas soluções para os desafios que o processo de globalização tem colocado, ou seja, na atualidade, em razão das intensas transformações que têm ocorrido em todos os setores da vida humana, não se admite mais procedimentos de administração pública que sejam apenas coordenados pela máquina do Estado, de modo monológico, estático, sem a cooperação de toda a sociedade, haja vista que, no presente, o público não pode ser compreendido ou reduzido ao seu campo estatal, daí a importância de uma ampla e real descentralização federativa.

Considerando-se, assim, que o papel tradicional destinado ao organismo estatal vem sendo bastante modificado nos últimos tempos, a alternativa que se impõe é a de incrementarmos ao máximo a participação das pessoas, enquanto cidadãos responsáveis e conscientes, em todas as escolhas de políticas públicas, fortalecendo práticas deliberativas abertas e plurais, objetivando criar condições de legitimidade mais sólidas para as decisões tomadas, o que novamente nos remete para a idéia de um renovado pacto federativo, sendo esse fundamentado, essencialmente, no sentido dado pela palavra cooperação do que na de subordinação, isto é, " o novo projeto de sociedade contemporânea deve afastar-se dos mitos ultrapassados, de decadentes formas ideológicas da direita e esquerda. Essas orientações conduzem à lógica estatal, corporativista e burocrática, esquecendo-se do tratamento prático e concreto das questões sociais e econômicas." (BARACHO, 1995: 16)

Porém, nos dias de hoje, não obstante toda essas idéias promissoras de um maior incentivo à participação popular na gestão da coisa pública, o que se tem verificado, realmente, é uma velada retirada da responsabilidade do Estado pelas políticas sociais e econômicas, o que nada mais significa do que o regresso do pensamento liberal, hoje em uma versão mais sofisticada, elaborada, o conhecido neoliberalismo.

É claro que é importante essa espécie de participação social para a legitimidade do ordenamento jurídico e para a concretização de direitos da cidadania, mas isso não pode significar, em hipótese alguma, a retirada completa do Estado de certas áreas pouco desenvolvidas, carentes, pois este deve, principalmente em países de grave exclusão social, como o Brasil, ainda estar presente nos referidos âmbitos, mas agora mais próximo do indivíduo, ou seja, deve-se valorizar, em primeiro lugar, o papel relevante do Município para garantia desses direitos do cidadão em um contexto globalizado como o atual.

Mais uma vez, a vertente econômica da globalização, uma vertente neoliberal, que precisa ser deixada de lado para dar lugar a uma outra globalização que, mesmo remodelando o poder do Estado, não deixe o indivíduo desamparado frente ao atual contexto mundial de não-inclusão, sem que isto possa determinar uma volta ao padrão clientelista e assistencialista do paradigma do Estado Social.

É preciso, portanto, redefinir o papel do Município no federalismo brasileiro, a partir de uma perspectiva sistemática e rigorosa, para que o indivíduo possa inserir-se nessa nova ordem global a partir de seu local de trabalho e moradia, dando ao Município e também às associações comunitárias, aos movimentos sociais organizados e a outros agrupamentos ainda menores de inclusão, o apoio essencial para realizar a função essencial de serem os interlocutores mais próximos dos anseios e demandas populares.

Como bem explica o Professor Milton Santos:

"o desejável seria que, a partir de uma visão de conjunto, houvesse redistribuição de poderes e de recursos entre as esferas político-administrativas do poder, assim como uma redistribuição das prerrogativas e tarefas entre as diversas escalas territoriais, até mesmo com a reformulação da federação." (SANTOS, 2000; 75)

Contudo, o que podemos vislumbrar, na por demais conhecida trajetória pendular do federalismo no Brasil, é um momento de centralização excessiva, apesar de uma aparente descentralização em curso, haja vista que normas legislativas gerais, de competência da União, como as determinadas no parágrafo primeiro do artigo 24, que dispõe sobre as competências concorrentes, da atual Carta Magna, são tão específicas e detalhadas que não deixam nenhum espaço de manobra político-administrativa para as outras entidades da federação, sendo, portanto, exaustivas, como é o caso, por exemplo, da vigente legislação referente às licitações e da denominada lei de responsabilidade fiscal. [10]

Até mesmo algumas das recentes reformas, como, por exemplo, a municipalização da saúde e do ensino fundamental, ditas descentralizadoras, não fizeram mais do que maquiar o desequilíbrio existente em nosso intricado sistema de distribuição de competências, pois além de não atacarem pontos problemáticos desse instrumental, também não redundaram em transferências ou alocações de recursos suficientes para que os demais níveis federativos pudessem atender, satisfatoriamente, a seus novos compromissos. Isto é um fato inegável.

O que na realidade tem ocorrido, não é um projeto positivo de descentralização democrática, com uma progressista atribuição de poder de decisão e autonomia aos demais entes federados, alcançando até mesmo as mais atomizadas associações comunitárias, mas um método "inteligente" de aliviar os encargos econômicos e financeiros da União. Essa característica marcante de algumas das presentes mudanças por que passa o aparato jurídico-político do Estado brasileiro coaduna-se, nitidamente, com interesses externos impulsionados por uma globalização unicamente econômica e voltada, exclusivamente, para a concorrência privada e o lucro, os quais pretendem uma ampla abertura e desregulamentação da nossa economia e mercado — vide a pauta determinada pelo chamado Consenso de Washington —, colocando em segundo plano, de modo residual, qualquer participação local efetiva e cidadã, pois essas possíveis discussões públicas descentralizadas e plurais, que reconhecem, admitem e solidificam novos formatos de convivência social, já que baseadas na intersubjetividade e na interdependência, são encaradas como um entrave à maior eficiência e agilidade da máquina estatal frente à rapidez de um mundo globalizado. [11]

Essa situação de subserviência aos caprichos de um capitalismo globalizante, em sua dimensão econômica mais predatória, é que nos impele a propor uma urgente reformulação no vocabulário sobre o federalismo brasileiro, enfatizando o importante papel que o indivíduo, em sua intersubjetividade, exerce em suas relações locais, e de como esses mesmos relacionamentos de proximidade na alteridade são essenciais para podermos afirmar um verdadeiro autogoverno, uma autêntica autolegislação, ou seja, sem uma plena participação popular na seleção e decisão das políticas públicas, não há que se falar em um sistema federativo equilibrado, nem, logicamente, em uma inserção transparente e democrática no processo de globalização.

"É por esse prisma que deveria ser vista a questão da federação e da governabilidade da nação: na medida em que o governo da nação se solidariza com os desígnios das forças externas, levantam-se problemas cruciais para estados e municípios." (SANTOS, 2000: 104)

Por outro lado, mesmo sabedores de que este não é o ponto básico e fundamental de nosso trabalho, e de que o espaço de que dispomos é por demais exíguo, não há como deixar de salientar que qualquer reformulação do nosso federalismo tem de considerar as distorções que caracterizam nosso sistema de divisão de poderes. Em outros termos, uma revalorização da esfera local de decisão e participação, como a aqui proposta, passa, também, por uma nova caracterização das relações entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

Se desejamos uma estrutura federalista a mais aberta e descentralizada possível, não há como admitirmos uma hipertrofia perigosa do Poder Executivo, pois, apenas a título exemplificativo, podemos aferir que ainda prevalece, entre nós, uma cultura política de cunho acentuadamente personalista, centralizadora, onde a figura do Presidente da República recebe um tratamento especial, em detrimento das suas qualificações como estadista, fazendo a população crer que se trata de um salvador da pátria, o que conduz a uma clara dependência das políticas públicas da pessoa do Chefe da União, já que neste ambiente encontramos, historicamente, um parlamento fraco.

O que se observa, na atualidade, é uma certa falência do Legislativo, pois este tem aberto mão de várias de suas prerrogativas constitucionais, omitindo-se no seu papel essencial de representante da vontade popular, colocando-se, em grande medida, como um mero ratificador das ordens emanadas do Executivo, vide o caso da utilização absurda e desproporcional de medidas provisórias pelo Presidente da República, o qual, quase que inteiramente, assumiu o comando do processo decisório de escolha e elaboração das mais relevantes políticas públicas, fazendo aprofundar a crise de legitimidade das nossas instituições deliberativas.

O Judiciário, por sua vez, só muito recentemente, e de maneira esporádica, tem erigido jurisprudências que impõem algum tipo de controle, ainda que relativo, aos atos normativos editados pelo Chefe do Executivo no uso de sua competência constitucional. Muito dessa situação é explicada por uma tradicional subserviência aos desígnios do Presidente da República, fato este que deriva da circunstância de que a nossa cúpula jurídica está intimamente ligada, ou vinculada, aos grupos detentores do exercício do poder político, sendo, em grande parte, oriunda e indicada pelos representantes destes últimos. Tal característica dificulta o aparecimento de um positivo controle da atuação do governo central, pois "num sistema arbitrário, sem limitações constitucionais, os governantes tomam as decisões que forem de sua conveniência, alegando interesse do Estado ou do povo." (DALLARI, 1986:61)

Revela-se, portanto, que a almejada independência e harmonia entre os poderes constituídos do Estado brasileiro está muito distante de nossa realidade, tendo em vista que, em nosso quadro institucional, não existe uma ajuda mútua entre os poderes, cooperação esta que poderia gerar atos e ações administrativas mais transparentes e com um grau de aceitabilidade maior, em virtude de uma legitimação mais intensa, pois permitiria que as decisões governamentais passassem por um crivo maior de debates.

"Na verdade, nosso modelo federalista foi corrompido pelos excessos do presidencialismo, em favor de um centralismo exacerbado e da atuação de caciques locais ou grupos sociais privilegiados, que usufruem do poder e das riquezas desafiando, em alguns momentos, o próprio poder central." (BATISTA, 2001:174)

Defendemos, assim, um federalismo que, sob a sombra do paradigma do Estado Democrático de Direito, assuma os riscos que a globalização e a modernidade trouxeram consigo, onde intensas e vastas contradições fragmentam e corroem antigos modos de pensar o mundo, fazendo com que tradicionais representações da realidade sejam questionadas e, até mesmo, refutadas; sendo o campo fértil de intermináveis debates, onde o cidadão assuma a sua autonomia com responsabilidade; imperando uma descentralização político-administrativa que não vise apenas fortalecer os coronéis; enfim, um federalismo que seja analisado a partir do prisma do princípio da subsidiariedade, ou seja, uma federação democraticamente descentralizada, na qual as competências e poderes locais não sejam absorvidas, inteiramente, pela entidade central, imperando o equilíbrio e a cooperação entre todos os entes federados. [12]


CONCLUSÃO

Em um mundo globalizado cada vez mais dominado pela velocidade das informações e pela dinâmica da tecnologia, onde antigos conceitos são, incessantemente, derrubados e não substituídos, imperando o transitório, o contigente, sendo todo esse conjunto de fatores guiado por uma linguagem excludente, de cunho mercadológico-econômico, que substitui o cidadão pelo consumidor, a única forma de resistência possível é encontrarmos mecanismos de revalorização do indivíduo em sua intersubjetividade, do espaço de decisão local, sem negarmos o pluralismo e a alteridade que a modernidade apresenta, pois o Estado-Nação e seu tradicional aparato, não são mais capazes de enfrentarem, sozinhos, os inúmeros desafios oriundos de uma globalização que a todos parece querer igualar, massificar.

Conforme podemos depreender da análise desenvolvida no decorrer de todo este trabalho, necessitamos admitir que vivemos em um período histórico em que as certezas e verdades absolutas não mais existem, no qual o risco é algo inafastável, no qual convivem formas de vida diversas, até mesmo conflitantes, o que nos obriga a buscar possíveis soluções em contextos cada vez mais amplos de debates, fazendo com que a democracia seja entendida como um processo dinâmico, aberto e sempre incompleto, pois só assim, sem pretendermos ocultar a complexidade que nos cerca, é que teremos alguma chance de edificarmos uma sociedade mais justa e equilibrada, em que prevaleça o diálogo e o autogoverno, na qual o cidadão enfrente criticamente os imprevisíveis fatos da vida moderna.

Nesse sentido, podemos verificar, com Paulo Freire que:

"A própria essência da democracia envolve uma nota fundamental, que lhe é intrínseca – a mudança. Os regimes democráticos se nutrem na verdade de termos em mudança constante. São flexíveis, inquietos, devido a isso mesmo, deve corresponder ao homem desses regimes, maior flexibilidade de consciência." (FREIRE, 1982: 90)

Pensamos que para alcançar essa almejada inserção radical e consciente dos cidadãos, entendidos esses enquanto titulares de direitos procedimentais plenos de participação na seleção e implementação de políticas públicas, faz-se urgente revermos o nosso federalismo, privilegiando as esferas mais quânticas de decisão, desconstruindo velhos parâmetros que sustentam modelos arcaicos e conservadores de circulação e exercício do poder no Brasil. Sem essa reformulação geral é impossível trabalharmos uma inclusão transparente e democrática da cidadania brasileira nessa competitiva globalização.

O que, na verdade, pretende-se ao adotar essa perspectiva não autoritária do exercício do poder é fazer com que as decisões que se referem a todos objetivem fins comuns e que sejam legitimadas democraticamente através de procedimentos plurais de discussão pública. É a democracia participativa superando a simples representação eleitoral, como um processo contínuo de formação e avaliação crítica da Administração Pública e de seus atos, que tem como finalidade possibilitar que os indivíduos realmente consigam intervir na produção normativa e na condução dos negócios públicos, fazendo, então, com que a "democracia seja sinônimo de auto-organização política da sociedade." (HABERMAS, 1997: I, 20)

Seguindo essa linha de pensamento, entendemos que não é qualquer descentralização político-administrativa que nos conduzirá à concretização dos princípios fundamentais elencados na Constituição de 1998, os quais, por sua vez, configuram o nosso Estado Democrático de Direito, já que transferir poderes para entidades menores, não significa, por si só, como bem ressaltado, um incremento da democracia participativa. Existe, assim, a necessidade de ainda enfrentarmos alguns persistentes entulhos autoritários que subsistem, ainda que com novas roupagens, em nossa vida institucional, os quais têm impedido, entre outras coisas, o fim do clientelismo e do fisiologismo como meios de se fazer política, a quebra de uma estrutura tecnocrática altamente centralizadora e insensível, que origina governos de experts, não de cidadãos, contribuindo para que só agora comecemos a conhecer e trabalhar a existência de uma cultura respaldada em hábitos democráticos de cunho não assistencialista.

Em outras palavras, repensar o nosso federalismo, enfatizando a importância dos poderes locais significa, sobretudo em tempos de globalização, questionarmos como desejamos que a nossa cidadania seja configurada e exercida, pois cidadãos críticos, conscientes de seus direitos, mas também dos seus deveres e responsabilidades, tendem a se formar somente em contextos em que o diálogo e a participação sejam, constante e firmemente, apoiados e fomentados, o que impõe que superemos qualquer posicionamento que se fundamente tão-somente nos interesses do Estado ou do mercado, levando a novas formas de solidariedade e de integração social, já que os direitos da cidadania serão baseados no respeito ao outro e as suas diferenças.

Sendo assim, o essencial na compreensão dos direitos da cidadania no Brasil, dentro de um contexto de revisão do modelo federalista brasileiro em uma época de globalização acelerada, como exposto, é de que estes só se realizarão inteiramente quando reformas democráticas autênticas e profundas tornarem os procedimentos decisórios concernentes às práticas deliberativas acessíveis a todas as camadas sociais. Desse modo, a conformação de um cidadão independente e atuante, a partir de sua própria comunidade e tradições, é elemento-chave na inserção da nossa sociedade em quadro de mundial de internacionalização crescente e de enfraquecimento de fronteiras e soberanias, portanto, devemos lutar por propostas que propiciem a retirada de entraves à democracia participativa, que aprofundem o aprendizado político-democrático, descentralizando o exercício do poder de decisão em uma sociedade heterogênea e fragmentada como a nossa, permitindo que novas posturas e determinações, mais suscetíveis às pressões advindas da base da nossa pirâmide social apareça.


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Notas

1. O fenômeno da globalização dos mercados em escala mundial não é, realmente uma novidade, sendo apenas seus efeitos mais radicais. Na verdade, após o fim da denominada Guerra Fria, ocorreu, a grosso modo, uma espécie de reestruturação macroeconômica, com uma releitura dos postulados liberais do famoso laissez- faire do século XIX, afirmando-se que o mercado livre, por si só, seria capaz de conduzir à democracia, é o chamado neoliberalismo.

2. É interessante conferirmos nesse sentido, entre outros, os seguintes autores e obras: (FURTADO, 1998) e (SINGER, 1997).

3. Ver nesse sentido: (CHOSSUDOVSKY, 2000).

4. "Se o aparato produtivo pudesse ser organizado e orientado para a satisfação das necessidades vitais, seu controle bem poderia ser centralizado; tal controle não impediria a autonomia individual, antes tornando-a possível." (MARCUSE, 1979: 24)

5. Ver nesse sentido, o interessante trabalho História Semântica do Conceito de Soberania: O Paradoxo da Soberania Popular. (NEUENSCHWANDER MAGALHÃES, 2000).

6. "Ocorre que, na atualidade, o conceito clássico de soberania encontra-se submetido a pressões evolutivas que nos conduzem a uma reflexão acerca de sua adequação para a descrição da sociedade moderna." (NEUENSCHWANDER MAGALHÃES, 1998: 361)

7. "Em outras palavras, a autêntica participação no poder de decisão está estreitamente relacionada à vontade de ser sujeito, e não objeto no processo social." (BATISTA, 2001: 168)

8. Ver, nesse sentido: (SANTOS, 2000) e (BATISTA, 2001).

9. "Descentralizar, portanto, significa transferir o poder de decisão e de execução de políticas públicas do governo central para as entidades federadas e para a sociedade." (BATISTA, 2001: 167)

10. Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:........................................

§1.º. No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

11. A pouca ingerência da sociedade brasileira em assuntos que lhe dizem respeito, acaba por admitir, acriticamente, soluções externas para os problemas que afligem, especificamente, a nossa coletividade.

12. Ver, nesse sentido: (BARACHO, 1995: 41 – 82)


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PRATES, Francisco de Castilho. A cidadania brasileira em tempos de globalização. Repensando o federalismo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3394. Acesso em: 5 maio 2024.