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A estrutura comunitária da União Européia e as bases juridicas do Mercosul

A estrutura comunitária da União Européia e as bases juridicas do Mercosul

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Sumário: 1. A globalização e o MERCOSUL – 2. O MERCOSUL e sua institucionalização – 3. A formação de blocos regionais de integração – 4. O direito comunitário e o direito da integração – 5. A gênese da união européia – 6. Estrutura comunitária – 7. O tribunal de justiça das comunidades européias - TJCE – 8. O tribunal de primeira instância – 9. O sistema jurídico comunitário – 10. Relações entre o direito comunitário e os direitos nacionais – 11. O Reenvio necessário na União Européia


1. A globalização e o MERCOSUL

Antes de adentrarmos ao estudo a que nos dispusemos apresentar, necessário que façamos algumas considerações sobre o fenômeno da Globalização, sem o que, necessariamente, também não podemos deixar de mencionar o Mercosul, o qual, bem ou mal, passou a fazer parte deste contexto de mudanças que vem assolando o planeta.

Com a queda do socialismo real, encontramos o fenômeno da globalização, o qual vem atuar no sentido de uma implantação mais efetiva, permanente e irreversível do Império do capitalismo.[1]

Citamos assim, alguns fatos importantes que contribuíram para o nascimento do fenômeno da globalização:

1985 – Gorbatchev inicia um duplo processo de abertura pela União Soviética principalmente de caráter econômico através da Perestroika, abrindo assim a economia soviética ao mercado ocidental, bem como de caráter político, através da Glasnost, onde com o fim da guerra fria, acaba por quebrar o monopólio do poder político que se encontra centralizado no único partido político da União Soviética.

1989 – Queda do Muro de Berlim. Algo que acontece quase que repentinamente quando o povo resolve sair às ruas com instrumentos caseiros e começa a derrubar um dos maiores símbolos do socialismo.

1991 – Se desfaz a União Soviética e então implanta-se o fenômeno da Globalização através do Império do Capitalismo Ocidental. Países que antes não apareciam, surgem como verdadeiras potências que no campo das exportações, invadem o mundo inteiro, a exemplo do que aconteceu com o Japão.

Já na Europa, quem mais se desponta é a Alemanha, a qual pode ser descrita como o maior país exportador da Europa.

O socialismo real, evidentemente acabou fracassando porque não havia adequação, equilíbrio jurídico e político. Pouco a pouco a sociedade soviética passou a ter os mesmos anseios, principalmente de consumo a exemplo do que ocorre com o resto do mundo.

Podemos citar alguns fatos, que representaram o fracasso do socialismo. Como mencionado, não havia equilíbrio entre o que se buscava e a estrutura política-econômica. Quando se obtinha algo que se almejava, isto era conquistado a altos preços.

As revoluções eram de caráter prematuro, sem qualquer sucesso. É certo que, em lutas revolucionárias, somente se pode obter sucesso quando se tem conhecimento profundo daquilo que se tenta destruir. Deve-se lutar contra amargas experiências anteriores, conhecidas e experimentadas, o que não ocorria, posto que o povo não tinha acesso a nada, nem mesmo a cultura ou a documentos.

Por outro lado, o ocidente sempre foi muito hostil com o socialismo soviético. O ocidente tinha liberdade, direito de ir e vir e portanto, tinha muito mais a oferecer ao mundo do que tinham os soviéticos.

Infelizmente, a globalização não conseguiu homogeneizar o mundo. Talvez esta seja a sua maior falha pois com isso, ela acaba por negar a si própria havendo pois que haver a globalização da globalização.

A globalização não se encontra ainda satisfatoriamente codificada em seus parâmetros e suas perspectivas. Os símbolos nacionais ainda são nossa referencia quando pensamos onde estamos, quem nos controla, com quem convivemos.[2]

Na tentativa de se ter uma boa imagem do processo de globalização, se coloca como referencia, países que deram certo, a exemplo do que ocorreu na Europa, no entanto, isto se desvirtua ao passo que, se tenta tratar de forma igual os desiguais, na verdade, esperam que cheguemos "a pé" onde chegaram de carro.

Nossa situação político-econômica é bem diferente daquela vivida pelos países ricos. Carregamos sempre altas dívidas externas e nosso comércio é deficitário.

Já na década de 50, a América Latina era submetida a um comércio internacional. Na década de 60 (industrialização substitutiva de importação). Nos tornaríamos mais independentes, mas a industrialização passou a criar a dependência tecnológica e econômica aos países ricos.

Na década de 70, a qual podemos chamar de década do endividamento, primeiro em decorrência com a crise do petróleo em 73 e 79. Enquanto países ricos apertavam os cintos, nós iniciávamos obras faraônicas como a transamazônica, Belém/Brasília, dentre outras, necessitando de grandes empréstimos enquanto o dinheiro dos petro-dólares iam para os bancos internacionais e nos retornavam posteriormente através de grandes empréstimos a altíssimos juros. A dívida começava a ser paga na década de 80, época em que, os países se voltaram para dentro de si na tentativa de resolver seus problemas internos, fechando inclusive suas fronteiras à entrada de produtos estrangeiros.

Chegávamos então a década de 90, totalmente fragilizados e esquecidos. Estávamos saindo da chamada "década perdida", abandonados pelas grandes potencias. Só na década de 80 pagamos mais de 100 bilhões de dólares da dívida externa. Enfim, em 1991, através da assinatura do TRATADO DE ASSUNÇÃO, pelos países Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, cria-se então o MERCOSUL, o qual vem como um tampão que não se encaixa em lugar algum em virtude das crises e problemas sofridos nas décadas que o antecedem.[3]

Com a criação do Mercosul, deixamos de ser "dependentes", no entanto, passamos a ser "inter-dependentes", pois ao abrirmos nossas fronteiras, passamos a depender uns dos outros (paises que se integram ao mercosul), e com isso criou-se pois uma dependência mais camuflada.

Quando o governo Collor de Mello inicia o processo de abertura sem nenhum planejamento, acabamos por ser envadidos por produtos de toda parte do mundo, havendo pois grandes opções de compra, o que acabou por refletir negativamente em nossa economia.[4]

De qualquer forma, a globalização é um processo que se faz necessário, é irreversível, mas que deverá ser melhor estruturado. Ao contrário do comunismo que não conseguiu dominar o mundo porque encontrou forte resistência advinda de um poder maior, a globalização avança no sentido de que o Estado se descentra para que, juntos com outros, possa resolver problemas que sozinho não poderia resolve-los. Note que, visto deste ângulo, ao contrário do que muitos pensam, com o processo de globalização, não estaria sendo reduzida a soberania dos Estados, mas sim ampliadas.


2. O MERCOSUL e sua institucionalização

Em âmbito internacional, para que haja o reconhecimento de um ordenamento jurídico de direito comunitário, um determinado bloco econômico ou uma determinada Integração de nações, exige-se a presença de fontes próprias que se diferenciam das normas nacionais.[5]

Se analisarmos o direito comunitário e suas fontes, podemos concluir que o MERCOSUL é representado juridicamente pelo tratado de Assunção, considerado como tratado constitutivo do bloco, juntamente com seus anexos; e, também constituído pelos protocolos posteriores, tendo como principais os Protocolos de Brasília e o Protocolo de Ouro Preto. Estes três tratados representam a principal base jurídica do MERCOSUL.

O Tratado de Assunção é a base jurídica que efetivamente criou o bloco,[6] sendo que, os que o sucederam vieram a complementá-lo, criando institutos e elementos jurídicos complementares para a efetiva formação jurídica do bloco, criado apenas de forma genérica no Tratado de Assunção.[7]

A institucionalização definitiva somente veio a ocorrer com a criação do Protocolo de Ouro Preto, que, efetivamente, criou os elementos jurídicos necessários ao funcionamento e reconhecimento internacional do bloco. Este protocolo manteve e criou fóruns intergovernamentais onde estão representados os interesses de cada Estado Parte, cujas decisões dependem da posterior ratificação pelas ordens nacionais.

Esse protocolo acabou por descartar a criação de órgãos supranacionais, i. e., de um poder comum, acima dos Estados, que poderia aplicar diretamente algumas decisões, dispensando sua transposição para o direito nacional. Esta é, a nosso ver, uma das principais falhas da forma com que foi criado e institucionalizado o MERCOSUL até o momento, ou seja, não existe um direito comunitário real, uma legislação supranacional a ser seguida, não existem Instituições de direito, supranacionais, a agirem com coercitividade e a necessária força jurídica que poderia (e deveria) manter uma união real, como ocorre na União Européia.

Mas, institucionalização, mesmo que um pouco debilitada pela precariedade jurídica (em âmbito internacional) dos Institutos criados, realmente existiu após o Protocolo de Ouro Preto, isto é inegável, pois, este Protocolo criou Instituições, regulamentou aquelas já existentes, enfim, foi um grande passo a frente para que realmente, juridicamente se pudesse reconhecer tanto em nível internacional como em relação aos Estados Partes.

As decisões comunitárias, para serem obedecidas, permanecem sob o crivo de cada Estado Parte, ficando à mercê de cada governo e sua capacidade de negociação interna. O processo decisório passa por uma longa e incerta trajetória até que se chegue à eficácia das decisões. Trata-se, portanto, o MERCOSUL, juridicamente falando, de um grande tratado internacional, não (ainda, pelo menos) uma verdadeira integração (para isto teria que haver um direito supranacional, tribunais, órgãos legislativos e administrativos permanentes, o que não ocorre atualmente).

O Protocolo de Ouro Preto manteve os órgãos do período de transição nos seus mesmos moldes. Entretanto, acrescentou ao GMC (Grupo Mercado Comum) e ao CMC (Conselho do Mercado Comum) caráter de instituição intergovernamental com poder decisório, e, ainda, em relação ao GMC, criou-se um órgão auxiliar, a Comissão de Comércio do Mercosul (CCM), dotada de idêntica coordenação, devendo garantir a política comercial comunitária (Protocolo de Ouro Preto, art. 16).

Portanto, comercialmente podemos dizer que o MERCOSUL realmente é um grande avanço, tendo o Protocolo de Ouro Preto contribuído muito para sua formação e institucionalização.[8]

Ocorre que, como bloco de integração, sob o aspecto juridico, podemos afirmar que ele deixa muito a desejar, permanecendo muito pobre em suas bases jurídicas, o que o torna fraco, instável e despido de bases sólidas que o garanta ante as incertezas tanto do mercado como das políticas internacionais.

No Protocolo de Ouro Preto ficou decidido que todas as decisões, no âmbito do MERCOSUL, serão necessariamente tomadas por consenso, assim como todas as representações nos órgãos possuem o caráter paritário. Assim, as decisões dos órgãos só entrarão em vigor após: 1) a incorporação das decisões aos ordenamentos jurídicos nacionais; 2) a comunicação do fato à SAM (Secretaria Administrativa do Mercosul); 3) a comunicação aos membros, pela SAM, de que todos já lhe informaram a incorporação; 4) o transcurso de 30 dias após a comunicação da SAM. Pode ser observado que, com exceção da última etapa, não há prazos mínimos, o que pode provocar a exagerada procrastinação dos processos decisórios.

O caráter obrigatório das decisões dos órgãos reveste-se de precariedade indubitável devido à enorme dificuldade da sua confirmação pelos Estados Partes, e, posteriormente, pelo trajeto burocrático a ser percorrido.

Na estrutura atual do MERCOSUL, institucionalizada pelo Tratado de Ouro Preto, as deliberações emanadas de suas instâncias não se constituem, por si só, em normas jurídicas em sentido estrito, mas sim em determinações políticas que vinculam os Estados Partes à promoção e adequações nos respectivos ordenamentos jurídicos internos.

As regras comunitárias, portanto, não são aplicadas diretamente, não se falando, também, em primazia das mesmas sobre as regras nacionais. Podemos afirmar que o direito derivado do MERCOSUL se confunde com as próprias ordens jurídicas nacionais, naquilo que os Estados entenderem por bem incorporar, entre as decisões dos órgãos comuns.

Trata-se de um precário direito comunitário oriundo de constantes e delongadas decisões, que se confundem com novos tratados tamanha sua burocrática e demorada tramitação entre os Estados Partes.

Mas, não deixa de ser um começo, não deixa de haver uma institucionalização do MERCOSUL com o advento do Protocolo de Ouro Preto que, por mais lento que seja no sentido de formar o bloco e o direito comunitário dele decorrente, é um real avanço em se falando de integração da América Latina, em se falando de permanência e continuidade do bloco, pois, criou novas Instituições, regulamentou lacunas oriundas dos tratados anteriores, enfim, mesmo que significando mais um passo um tanto quanto lento na direção da integração, trata-se de importante instrumento jurídico que aponta no sentido de fortalecer o bloco, dando um novo fôlego na caminhada, na direção.


3. A formação de blocos regionais de integração

A globalização vem se realizando através da formação de blocos regionais de Estados, até como mecanismo de defesa contra esse processo, a exemplo da União Européia, do Nafta, do Mercosul, do Asean, dentre outros, em cujo interior, sobretudo no âmbito da primeira, passou a desenvolver-se um novo tipo de Direito, o Direito Comunitário, que se coloca entre o Direito Interno e o Direito Internacional, ao promover a interação entre os parceiros, dissolvendo preconceitos, diluindo falácias sobre estrangeiros, forasteiros ou alienígenas e favorecendo benefícios mútuos em lugar do exclusivismo de soluções autárquicas.[9]

A integração dos blocos regionais é fenômeno mais recente ainda que a globalização e estes são diametralmente opostos. A formação dos blocos regionais começa a ocorrer no momento em que o multilateralismo sofre um enfraquecimento. Mas isto não significa o fim do processo de globalização, representa apenas a reação de Estados-membros e blocos aos efeitos que ela acarreta.

Um Bloco Regional de Integração é, desta maneira, uma organização internacional formada por Estados localizados na mesma região, que iniciam uma integração econômica, levando a um processo de interpenetração dos seus Direitos internos e, gradualmente, à criação de um ordenamento jurídico gerado a partir dos acordos.[10] O Bloco vai aos poucos adquirindo um caráter de unidade, podendo alcançar um nível tal de harmonização jus-político-econômica, que configure uma união semi-federativa de Estados.

O caminho para se alcançar a Integração é longo, podendo atingir diferentes graus e estágios de complexidade, de acordo com os interesses dos Estados-membros. Podemos ter, então, tipos distintos de modelos de Integração ou estágios, em ordem crescente de um mesmo processo de complementaridade entre duas ou mais economias. assim distribuídos:

Área de Tarifas Preferenciais: representa a redução parcial das tarifas alfandegárias entre duas ou mais nações, que poderá efetivar-se-se de maneira diferenciada por setores ou produtos. A adoção deste tipo de Integração não implica outras políticas de ajuste para a sua viabilização, não havendo a necessidade de mudanças na política tarifária com relação à terceiros países.

Área de Livre Comércio: nessa fase, temos a abolição total das tarifas que incidem no comércio intra-área, que não precisa ocorrer, necessariamente, para todos os produtos simultaneamente. O que geralmente ocorre é a eliminação para um certo número de produtos inicialmente e a gradual ampliação da pauta de produtos a terem sua alíquota zerada no decorrer do processo. Aqui também se adota o sistema tarifário independente com relação a terceiros países. O aspecto fundamental nesta etapa de Integração é a unificação das normas de controle de qualidade e de padronização de produtos, embrião de uma legislação específica a ser implementada evolutivamente no Bloco Regional.

União Aduaneira: neste estágio ocorre, além da anulação das tarifas alfandegárias, uma unificação da estrutura tarifária relativa a terceiros países, evitando-se o problema dos desvios de comércio e implicando um mínimo de harmonização das políticas fiscal, monetária e cambial. Em geral, quando se chega a adotar uma União Alfandegária, já se atingiu o estágio da alíquota zero para todos os produtos do comércio intra-área. Com o estabelecimento de medidas conjuntas de barreiras alfandegárias, em relação aos países que não façam parte desta União, temos já presentes normas jurídicas comunitárias.

Mercado Comum: este estágio inclui uma União Aduaneira, somada à livre mobilidade dos fatores de produção, desta forma, além do livre comércio de insumos e de produtos finais, ocorre a livre locomoção de bens de capital, recursos financeiros e de mão-de-obra. Para tanto, há a necessidade da coordenação de vários aspectos da política econômica dos países signatários, como uma unificação do sistema previdenciário e tributário, das leis trabalhistas, etc., por outro lado, a livre mobilidade do fator capital, necessita a criação de uma legislação comum em matéria de investimentos estrangeiros, royalties, e repatriamento de lucros, efetivando, desta forma, o Direito Comunitário.

União Econômica e Monetária: tal estágio seria superado apenas pela fusão política dos membros e a criação de um novo Estado. Nesta fase, atingir-se-ia tal grau de complementaridade do processo de Integração, que ter-se-ia uma unificação das políticas monetária, fiscal e cambial dos países membros, criando-se uma moeda única e um Banco Central independente. Nessa etapa, como forma final do processo de Integração, teríamos a constituição de uma Autoridade Supranacional, sustentada por normas comunitárias eficazes, diretamente aplicáveis e com autoridade superior às normas estatais internas, sendo suas decisões acatadas e respeitadas pelos Estados-membros.

Nem todo Bloco Regional de Integração segue um modelo pré-definido, entretanto, nada tem sido tão marcante para a perspectiva do milênio seguinte quanto a transformação sofrida pela Europa. O fenômeno União Européia se consolida dia a dia, com base na redefinição do papel do Estado na sociedade nacional e internacional, através da delegação de soberania por parte de seus Estados-membros e da constituição de um sistema institucional supranacional.

Para tanto, acredita-se que a questão da soberania não deva mais constituir um impasse, tendo em vista esta nova ótica a respeito do tema, que não deve ser apontada como uma aberração, pois ela é fruto do confronto de um antigo modelo com os novos arquétipos, os novos discursos, novos mitos do universo político.

Assim sendo, o processo de integração dos Estados em blocos regionais e a crescente interdependência entre os mesmos trazem à tona uma questão de grande relevância, o princípio da soberania.

A ampliação do campo de atuação do Direito Internacional e crescente inserção de suas normas nos ordenamentos jurídicos nacionais, bem como a transferência de determinadas atividades para uma organização internacional e a redefinição do papel do Estado frente à Nova Ordem Internacional são fatores que levam a reformular a noção de soberania. Esta, por ser histórica, deve ser considerada em consonância com seu contexto, com o tempo e espaço no qual se insere.

A partir do momento em que foram surgindo tratados e entidades de caráter internacional e que estes foram adquirindo força no sentido de obrigarem os Estados pactuantes à sua eficácia, efeitos foram surtindo sobre seus direitos internos. Esse fenômeno pode ser percebido no fato dos Estados estarem incluindo em suas constituições o direito internacional e do poder constituinte derivado estar também cada vez mais motivado por normas de caráter internacional.

Já externamente a liberdade de ação está restrita pela comunidade internacional. Até mesmo o princípio da não intervenção sofreu exceção, de acordo com a carta da ONU, que prescreve que os direitos do homem são universais e não permitem a invocação dos Estados do princípio da não ingerência nos assuntos internos.

Diante do fenômeno da supranacionalidade, no qual os países transmitem determinadas competências para um determinado organismo, cujos órgãos são autônomos e suas normas auto aplicáveis (self-executing), questiona-se a noção de soberania frente a essa nova realidade.

Depois de afirmado o fato da soberania não ser mais considerada absoluta e ilimitada, discute-se, com a supranacionalidade, o princípio da indivisibilidade, defendendo-se a tese da soberania dividida ou soberania repartida.


4. O direito comunitário e o direito da integração

Todo este complexo panorama aqui descrito produziram resultados na realidade do Direito. Houve então a necessidade de se criar, segundo Roth, um Direito Reflexivo e fazer rupturas estruturais com a antiga ordem mundial.[11]

Os novos rumos da ordem internacional levaram a uma crise de legitimidade do Estado, a qual contém tendência à dispersão do nível nacional de regulação social. O Direito Reflexivo seria, portanto, um Direito oriundo da negociação, ao invés de se propor direcionar os rumos da sociedade, função na qual já se comprovou ineficaz. Na visão moderna, o Direito vem melhor servindo à sociedade como guia procedimental das condutas.

A crise do Estado tem uma de suas raízes, na ordem interna, na interpenetração dos campos sociais semi-autonômos, e na complexibilização da sociedade. O Direito deve admitir que sua função não e mais definir as dimensões estruturais e funcionais dos sistemas, mas sua contribuição deve ser no sentido de generalizar as auto-regulações existentes, preenchendo também suas lacunas.[12]

A interpenetração entre o domínio publico e o privado impõe ao Estado novas práticas administrativas, jurídicas e políticas. Assim, aparece como novo instrumento da ação do Estado uma legislação mais flexível como leis iniciativas, mesas redondas, contrato negociado, gentlement agreement, leis de base.

Para enfrentar suas limitações em termos de validade, eficácia e legitimidade, o direito positivo tem lançado sempre mão das ordens sócio-jurídicas existentes. Entretanto, grande parte da doutrina jurídica continua afirmando o primado do direito positivo. Apesar disto, as esferas normativas dos campos sociais, chamadas direitos "auxiliares" ou "secundários", têm se mostrado excepcionalmente úteis quanto aos limites do direito positivo, pois preenchem suas lacunas, além de garantir a discricionaridade em questões decisivas. Assim, estes direitos têm sido tecnicamente "recebidos" e instrumentalmente utilizados.

Como resultado da formação da UE surge o Direito Comunitário, sistema composto por normas e atos advindos das instituições supranacionais européias. Sua função é criar um Direito igual para todo o Bloco. O Direito Comunitário trata de normas supranacionais, ou seja, de regras comuns aos Estados que integram determinado bloco regional, as quais possuem fontes próprias, emanando sobretudo dos chamados tratados-quadro, como o de Maastricht, que funda a União Européia, bem assim das diretrizes, resoluções e decisões baixadas pelos órgãos comunitários, de natureza legislativa, administrativa e judicial. Por constituir disciplina jurídica nova, o Direito Comunitário se vale de instrumentos hermenêuticos e gnoseológicos próprios, sem prescindir daqueles utilizados pelo Direito Interno e Internacional, em face de seu hibridismo, privilegiando a interpretação teleológica ou finalística.

Além de aplicar os postulados comuns às demais especialidades jurídicas, o Direito Comunitário possui princípios específicos, dentre os quais o da autonomia, da aplicabilidade direta e da supremacia de suas regras com relação às normas internas de cada Estado. Tais princípios, que já encontram plena aplicação no seio da União Européia, importam numa flexibilização do conceito de soberania, sobretudo quanto à idéia de supremacia absoluta da ordem jurídica interna, exigindo uma nova postura dos aplicadores do Direito, sendo certo que a sua adoção por outros blocos regionais, em particular no âmbito do Mercosul — se é que se quer ultrapassar o estágio de mera união aduaneira —, constitui apenas uma questão de tempo.

O processo de integração de Estados soberanos formando os chamados blocos regionais se funda em quatro bases que se inter-relacionam: a base econômica, a base política, a base social e a base jurídica. Assim, pode-se afirmar que o processo de integração busca a maximização regional de todos os fatores econômicos. Esse objetivo só pode ser conquistado através da convergência de uma firme vontade política entre os governos regionais. Para tanto, os governos necessitam do respaldo interno, ou seja, do apoio majoritário dos seus nacionais, sob pena do processo de integração se tornar ilegítimo e, via de regra, mal sucedido. Uma vez estabelecidos os objetivos sócio-econômicos a serem alcançados com a mecânica da integração, cujo processo seja movido por uma forte determinação política dos Estados, amparada internamente pelos seus nacionais, torna-se indispensável a elaboração de um arcabouço jurídico-institucional que seja capaz de materializar e de efetivar o processo de integração, tornando-o auto-sustentável. Essa ordem jurídica de alcance supranacional regionalizado, e que dá instrumentalidade ao processo de integração, constitui um Direito novo que apresenta características originais.


5. A gênese da união européia

Os principais esforços no sentido da Integração Européia começaram com o Tratado de Dunquerque, de 1947, assinado entre a França e o Reino Unido, de aliança e assistência recíproca contra qualquer possível nova agressão alemã, mas que incluía, igualmente, promessa de cooperação no interesse geral da prosperidade e da segurança econômica dos dois países. Seguiram-se, o Congresso de Haia, realizado entre 7 a 10 de maio de 1947, convocado pelo Comitê Internacional de Coordenação dos Movimentos para a Unidade Européia para discutir sobre organizações e movimentos de unificação surgidos na Europa do pós-guerra, o primeiro anúncio do Plano Marshall, em junho de 1947, a formação, em julho do mesmo ano, do Comitê de Cooperação Econômica Européia, e a assinatura da Convenção sobre Cooperação Econômica Européia, em abril de 1948. Em maio de 1949, foi firmado o estatuto do Conselho da Europa, prevendo a formação de uma assembléia consultiva, o chamado Parlamento Europeu. Em 1950 foi criada a União Européia de Pagamentos - UEP, que visava facilitar o comércio e as transações financeiras multilaterais na área do comércio europeu.

Pelo Tratado de Paris foi instituída, em 18 de abril de 1951, a Comunidade Européia do Carvão e do Aço - CECA, entre Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo e Países Baixos. Um projeto de Tratado, visando a criação de uma Comunidade Européia, inicialmente denominada Comunidade Política Européia, elaborado em 1953, não chegou a ser ratificado. Todavia, em março de 1957, os Ministros das Relações Exteriores dos Estados membros da CECA, firmaram o Tratado de Roma, para a criação de uma Comunidade Econômica Européia, e o estabelecimento gradual de um Mercado Único Europeu, com o eventual livre trânsito de mercadorias, pessoas e serviços entre si. No decorrer dos anos, nove novos países se integraram à União, que passou a contrapor-se ao Bloco norte-americano e soviético, posteriormente substituído pelo asiático. Já na década de 70, a União Européia, que havia instalado-se como um mercado comum, começou a considerar um aprofundamento da Integração, a nível político-econômico. O complexo processo de Unificação veio desenrolando-se, ao longo dos anos e, acelerando-se com a implantação do Tratado de Maastricht e, mais recentemente, com o Tratado de Amsterdam, de 2 de outubro de 1997, que alterou substancialmente o Tratado de Maastricht.


6. Estrutura comunitária

A União Européia caracteriza-se por um sistema institucional único no seu gênero, o qual a distingue das organizações internacionais clássicas. Ao subscreverem os Tratados de Paris e Roma, os Estados-membros passaram a autorizar diversos atos de delegação de soberania em benefício de órgãos de natureza supranacional, os quais representam, simultaneamente, os interesses nacionais e comunitários, estando interligados por relações de complementaridade de que decorre o processo de decisão.

Estes órgãos formam a estrutura institucional da União Européia, tendo, entre outras funções, a de criar o Direito Comunitário, agir soberanamente nos limites estabelecidos pelos tratados modificando, muitas vezes, realidades da vida cotidiana européia com plena autonomia.

Na União Européia, o processo de decisão associa mais especificamente a Comissão das Comunidades Européias, que elabora propostas e executa as ações adotadas; o Parlamento Europeu, que se pronuncia sobre essas propostas; e, o Conselho, que adota a decisão final. O Tribunal de Justiça e o Tribunal de Primeira Instância garantem o respeito ao Direito Comunitário. O Tribunal de Contas controla a gestão financeira da União. O Comitê Econômico e Social e o Comitê Consultivo CECA dispõem de uma competência consultiva. Atuam, ainda, o Banco Europeu de Investimentos, como instituição financeira, o Comitê das Regiões, como órgão de implementação das políticas comunitárias junto às autoridades regionais e locais, e o Provedor de Justiça (ombudsman), como órgão de defesa do cidadão europeu frente aos atos de má administração por parte dos organismos ou instituições comunitárias e o Instituto Monetário Europeu, como condutor do processo de unificação monetária.


7. O tribunal de justiça das comunidades européias – TJCE

O Tribunal de Justiça é o órgão jurisdicional da União Européia. Autoridade independente que zela pela aplicação uniforme do Direito Comunitário, é constituído por quinze juizes, assistidos por nove advogados-gerais, nomeados de comum acordo pelos governos dos Estados-membros, dentre personalidades que ofereçam todas as garantias de independência e reunam as condições exigidas, nos respectivo países, para o exercício das mais altas funções jurisdicionais, ou que sejam jurisconsultos de reconhecida competência, sendo a duração de seu mandato fixada em seis anos, renováveis.

De três em três anos, procede-se a uma substituição parcial, que incide sobre seis ou sete juizes e três advogados-gerais. O Tribunal conta, atualmente, com um juiz por Estado-membro, sendo 4 advogados-gerais nacionais da Alemanha, França, Itália e Reino Unido.

A independência dos juizes é garantida pelo seu Estatuto: os juizes são inamovíveis e as suas deliberações são secretas. Designam, entre si, um presidente, para um mandato de três anos. Tanto os juizes quanto os advogados-gerais têm remuneração equivalente a de um membro da Comissão, fazendo jus, ainda, a uma pensão correspondente a metade de sua remuneração, durante o período de três anos após o encerramento do exercício de suas funções.

Os advogados–gerais são nomeados segundo a livre decisão dos governos, sendo incumbidos de apresentar publicamente, com toda a imparcialidade e independência, conclusões fundamentadas sobre as causas submetidas ao Tribunal, para assistir este último no desempenho das suas atribuições. Objetivou-se, com a sua criação, juntar ao processo informações detalhadas e fundamentadas de um jurisconsulto liberto tanto da pressão dos interesses das partes como das responsabilidades do julgador. Suas conclusões encerram o processo, sendo publicadas em anexo às decisões do TJCE.

O Tribunal de Justiça tem por missão garantir o respeito ao direito, na interpretação e aplicação dos Tratados. Pode anular, a pedido de uma Instituição Comunitária, de um Estado ou de um particular diretamente afetado, os atos da Comissão e do Conselho, caso estes sejam incompatíveis com o Tratado. Pode decidir que uma legislação ou uma ação de um Estado-membro não é conforme as disposições dos Tratados e obrigar, o Estado em causa, a modificá-la ou retirá-la. Pronuncia-se, a pedido de um Tribunal nacional, sobre a interpretação ou a validade das disposições do Direito Comunitário. Pode, ainda, ser convidado a emitir pareceres sobre os acordos que a União Européia se disponha a celebrar com países terceiros, tendo, tais pareceres, caráter vinculativo.

O Tribunal reúne-se em sessão plenária, com presença mínima de sete juizes, sempre que tiver de decidir sobre questões que lhe sejam submetidas por um Estado-membro ou por uma Instituição Comunitária, bem como em questões particularmente importantes relativas à interpretação do Direito Comunitário. A maioria das ações e recursos é confiada a seções, criadas no seu seio. Atualmente é constituído por quatro seções com cinco juizes. O Regulamento de Processo e o Regulamento Adicional são as principais fontes de seu regime jurídico-processual.

O Tribunal das Comunidades Européias tem tido um papel ímpar na dinamização da integração européia e na elaboração dogmática do direito comunitário.[13]


8. O tribunal de primeira instância

Em 1989, foi associado ao Tribunal de Justiça um Tribunal de Primeira Instância, constituído por quinze membros, nomeados e com mandatos iguais ao dos juizes do Tribunal de Justiça. O Tribunal de Primeira Instância reúne-se em cinco seções, constituídas por três ou cinco juizes, podendo, como o Tribunal de Justiça, reunir-se em sessão plenária. Tanto o Tribunal de Justiça quanto o Tribunal de Primeira Instância têm sede em Luxemburgo.

O Tribunal de Primeira Instância é competente para diversas categorias de ações e recursos referentes, nomeadamente, a particulares e empresas (concorrência, medidas anti-dumping, questões relativas ao carvão e ao aço, ações para indenizações por perdas e danos, recursos dos funcionários da União, dentre outros). As decisões têm força executiva, podendo ser objeto de recurso para o Tribunal de Justiça, quando versarem sobre matéria de direito.


9. O sistema jurídico comunitário

A organização institucional do principal Bloco Regional de Integração - a União Européia - só pode ganhar vida e tornar-se realidade através do Direito Comunitário, sendo esta, inclusive, sua principal inovação, face a tentativas anteriores para unificar a Europa: não usa a submissão ou a força para alcançá-la, e sim, o direito. Este, deve conseguir aquilo que, durante séculos, o sangue e as armas não conseguiram. Só uma unificação baseada no livre arbítrio poderá ter futuro duradouro, uma unificação baseada em valores fundamentais, como a liberdade e a igualdade, e preservada e concretizada pelo direito.

Tendo os Tratados institutivos da CECA/CEE/EURATOM como ponto de partida, as normas de Direito Comunitário objetivam a regulamentação de suas relações jurídico-econômicas, não só no tocante ao regime fiscal e de concorrência, direito do consumidor, e agricultura, apresentando caracteres que ora o enquadram como Direito Internacional Público, ora como direito interno, e ora como Direito Econômico, mas, basicamente, no que diz respeito às quatro liberdades fundamentais: 1. Livre Circulação de Pessoas; 2. Liberdade de Estabelecimento; 3. Liberdade de Prestação de Serviços; 4. Livre Circulação de Capitais.

O sistema normativo comunitário obedece ao princípio segundo o qual, as disposições nacionais devem ser substituídas por um ato comunitário, sempre que uma regulamentação precisa, comum a todos os Estados-membros, seja necessária, caso contrário, deve-se respeitar as ordens jurídicas nacionais.

Foi no contexto do Direito Comunitário Derivado que se desenvolveram os instrumentos que permitem às Instituições Comunitárias agir, em graus diferentes, sobre as ordens jurídicas nacionais, sendo a forma extrema desta ação a substituição das normas nacionais por normas comunitárias. Seguem-se as normas que permitem às Instituições Comunitárias agir, indiretamente, sobre as ordens nacionais. Prevê-se, ainda, a possibilidade de, para a regulamentação de casos concretos, tomar medidas em relação a um destinatário determinado ou determinável. Por último, prevêem-se atos jurídicos que não contêm qualquer disposição vinculativa para os Estados-membros ou para os cidadãos da União. Encontramos todas estas formas fundamentais de atos nos Tratados originais da União Européia. Existem, no entanto, diferenças na apresentação concreta e na designação destes atos no Tratado CECA, por um lado, e nos Tratados CEE/EURATOM, por outro.


10. Relações entre o direito comunitário e os direitos nacionais

O sistema jurídico comunitário contém todos os tratados, regulamentos, diretivas, atos em geral dos institutos da União Européia. A primeira grande mudança na mentalidade jurídica a ser implementada, foi considerar pessoa jurídica de Direito Internacional Público não só Estados, mas, a partir da União, também as Instituições Comunitárias.

A relação do Direito Comunitário com os Direitos nacionais baseia-se na autonomia daquele com relação a este, na aplicabilidade direta do Direito Comunitário nos ordenamentos jurídicos nacionais e no primado deste sobre os Direitos nacionais. Esta relação não é oriunda dos Tratados, mas da jurisprudência do TJCE.

Inspira-se no Princípio da Separação Recíproca entre os Direitos interno e Comunitário, porém, esta separação não é total, devido ao fato de alguns princípios comunitários serem originários dos Direitos internos, para citar os Direitos fundamentais reconhecidos e tutelados pela ordem comunitária. Outro importante princípio comunitário é o da Congruência Jurídica Estrutural, no qual só será válida a norma democraticamente legítima dentro do funcionamento sui generis da estrutura União Européia. Os conflitos entre as legislações nacionais e comunitárias, inevitáveis, são resolvidos pelo Tribunal de Justiça.

Tais relações, afirmadas por toda uma construção jurisprudencial, baseiam-se nos três princípios fundamentais supra citados: a autonomia do Direito Comunitário em relação aos direitos nacionais; a aplicabilidade direta das normas comunitárias sobre todo o seu âmbito de jurisdição territorial; e, o primado da norma comunitária sobre a estatal.


11. O Reenvio necessário na União Européia

O Tratado de Roma determina: "Art. 177 – O Tribunal de Justiça é competente para decidir, a título prejudicial: a) Sobre a interpretação do presente Tratado; b) Sobre a validade e interpretação dos atos adotados pelas Instituições da Comunidade e pelo BCE; c) Sobre a interpretação dos Estatutos dos organismos criados por um ato do Conselho, desde que estes Estatutos o prevejam. Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal de Justiça."[14]

Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada perante qualquer órgão jurisdicional de um dos Estados-membros, esse órgão pode, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa, pedir ao Tribunal de Justiça que sobre ela se pronuncie. Pressuposto: decisão de órgão jurisdicional nacional suscitando questão ao TJCE. Compete ao juiz do processo decidir (ex officio/pedido das partes). Cabe ao juiz: formular as questões que pretende ver esclarecidas sobre a interpretação de uma norma/validade de um ato comunitário. Regras Processuais: Momento de Reenvio: economia e utilidade processual; o processo é enviado por correio à Secretaria do TJCE; o despacho de reenvio suspende o processo. Intervenção: (2 meses) as partes na causa são os Estados-membros e as Instituições Comunitárias. Julgamento: acórdão. Conteúdo do Acórdão: Acórdão Interpretativo; interpretação apenas do D. Comunitário. Acórdão sobre questão de validade: não declara erga omnes a nulidade do ato comunitário (Recurso de Anulação). Repercussão do Acórdão: a decisão vincula o juiz nacional que recorreu ao Tribunal Comunitário; só é vinculativa no processo em que foi solicitada. Efeito retroativo: as jurisdições nacionais ficam, no futuro, dispensadas de submeter idêntica questão ao TJCE. Reenvio Prejudicial: Tribunais Nacionais - TJCE - interpretação do conteúdo/âmbito dos Tratados e Atos Comunitários - parecer sobre validade dos atos das Instituições Comunitárias. O TJCE em nenhuma hipótese funciona, em relação aos Tribunais Nacionais como um tribunal de recurso ou como tribunal supremo de um sistema federal.[15]

Portanto, no estágio atual, o Tribunal da Comunidade Européia não se assemelha a um tribunal de um Estado Federal pois que, de um lado, a espécie de invalidade da norma estadual que contrarie a norma comunitária não é a nulidade senão a ineficácia ou inaplicabilidade, e, por outro lado, o tribunal não dispõe de competência para julgar da validade das normas comunitárias e nem mesmo quando é chamado a pronunciar-se sobre as questões de envio prejudicial consagradas pelo artigo 177 acima citado.[16]


NOTAS

1.IANNI, Octávio. A sociedade global. Rio de Janeiro: Ed. Civ. Brasileira, 1992. p. 141.

2.PINTO, Roseane Abreu Gonzales. Estado, direito e os limites e virtudes da globalização econômica. Revista PARADIGMA – Ciências Jurídicas. V. 8, nº 8. Ribeirão Preto: EDUNAERP, 1998. p. 106.

3.BASSO, Maristela. MERCOSUL – seus efeitos jurídicos, econômicos e políticos nos Estados-membros. Porto Alegre: Livr. Do Advogado Ed. 1997. p. 114.

4.JAGUARIBE, Hélio. Brasil, homem e mundo: reflexão na virada do século. Rio de Janeiro: Topbooks Ed., 2000. P. 76.

5.VITAGLIANO, José Arnaldo. ROSSI, Fernanda. Os conflitos de lei e a política nacional. Capturado em 19 de outubro de 2000. Online. Disponível na Internet http://www.argumentum.com.br/ARTIGOS/04-10/os_conflitos_de_lei____e_a_polí-no.htm.

6.ALMEIDA, Paulo Roberto de. O Mercosul no contexto regional e internacional. São Paulo: Ed. Aduaneiras, 1993. p. 81.

7.ARNOLDI, Paulo Roberto Colombo. A declaração de falência e seus efeitos jurídicos no âmbito do Mercosul. Revista PARADIGMA – Ciências Jurídicas. V. 8, nº 8. Ribeirão Preto: EDUNAERP, 1998. p. 70.

8.AGUADO, Juventino de Castro. A integração que queremos (e necessitamos) e a integração que temos. Revista PARADIGMA – Ciências Jurídicas. V. 09 nº 09/10. Ribeirão Preto: EDUNAERP, 2000. p. 225. Juventino de Castro Aguado menciona que o Mercosul é viável e que no campo comercial "...o comércio intraregional, passou de 4 bilhões de dólares em 1991 para 20 bilhões de dólares em 1998; neste meio tempo tem havido, é certo, dificuldades e percalços, mas a permanente disposição e boa vontade dos seus integrantes, especialmente do Brasil, tem permitido a manutenção de um rumo com idéias próprias; isto é necessário para fazer frente à "irracionalidade do mercado global" (Robert Kurtz) e às ameaças de possíveis outras irracionalidades e incertezas a nível continental."

9.SILVA, Roberto Luiz. Direito comunitário e da integração. Unisíntese – direito em CD-Rom. Porto Alegre: Síntese, 1999.

10BATISTA JUNIOR, Paulo Nogueira. A economia como ela é. São Paulo: Ed. Bontempo, 2000. p. 80.

11.SILVA, Roberto Luiz. Op. Cit.

12.SÁENZ, Joseba Aitor Echebarría. El derecho comercial en los procesos de integración. Ribeirão Preto: Revista PARADIGMA – Ciências Jurídicas. V. 8, nº 8, ano 1998. p. 15.

13.QUADROS, Fausto. Direito das comunidades européias e direito internacional público. p. 432, Lisboa: Coimbra, 1991.

14.LARANJEIRO, Carlos. Tratado de Roma. p. 202. Coimbra: Almedida, 1993.

15.SILVA, Roberto Luiz. Op. Cit.

16.TEIXEIRA, Antonio Fernando Dias. A natureza das comunidades Europeias: estudo político-jurídico. p. 117. Coimbra: Mamedina, 1993.


BIBLIOGRAFIA

AGUADO, Juventino de Castro. A integração que queremos (e necessitamos) e a integração que temos. Revista PARADIGMA – Ciências Jurídicas, V. 9. nº 9-10. Ribeirão Preto: EDUNAERP, 2000.

ALMEIDA, Paulo Roberto de. O Mercosul no contexto regional e internacional. São Paulo: Ed. Aduaneiras, 1993.

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BASSO, Maristela. MERCOSUL – seus efeitos jurídicos, econômicos e políticos nos Estados-membros. Porto Alegre: Livr. Do Advogado Ed. 1997.

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SILVA, Roberto Luiz. Direito comunitário e da integração. Unisíntese – direito em CD-Rom. Porto Alegre: Síntese, 1999.

TEIXEIRA, Antonio Fernando Dias. A natureza das comunidades Europeias: estudo político-jurídico. Coimbra: Mamedina, 1993.

VITAGLIANO, José Arnaldo. ROSSI, Fernanda. Os conflitos de lei e a política nacional. Capturado em 19 de outubro de 2000. Online. Disponível na Internet http://www.argumentum.com.br/ARTIGOS/04-10/os_conflitos_de_lei____e_a_polí-no.htm.


Autores

  • José Arnaldo Vitagliano

    Advogado. Doutorando em Direito Educacional pela UNINOVE - São Paulo. Mestre em Constituição e Processo pela UNAERP - Ribeirão Preto. Especialista em Direito pela ITE - Bauru. Especialista em Docência do Ensino Universitário pela UNINOVE - São Paulo. Licenciado em Estudos Sociais e História pela UNIFAC - Botucatu. Professor de Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito Processual Civil e Prática Civil. Autor de dois livros pela Editora Juruá, Curitiba: Coisa julgada e ação anulatória (3ª Edição) e Instrumentos processuais de garantia (2ª Edição).

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  • Clóvis Guido de Biasi

    Clóvis Guido de Biasi

    advogado em Ribeirão Preto (SP), mestrando em Constituição e Processo

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VITAGLIANO, José Arnaldo; BIASI, Clóvis Guido de. A estrutura comunitária da União Européia e as bases juridicas do Mercosul. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2324. Acesso em: 4 maio 2024.