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O sistema vicariante na Lei nº 11.343/2006

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1. INTRODUÇÃO

          Este artigo visa a tratar do sistema criminal a ser adotado em relação ao usuário de psicotrópico ilícito que seja semi-imputável. A Lei nº 11.343/2006 trata da prevenção e da repressão ao uso e ao tráfico de psicotrópicos ilícitos, não permitindo a substituição da pena por medida de segurança no caso de semi-imputáveis. É sobre isso que vou tratar.

          A Lei nº 11.343/2006 teve a intenção de corrigir os defeitos da ultrapassada Lei nº 6.368, de 21.10.1976. A nova lei é frágil e traz várias incoerências, permitindo interpretações absurdas. Não é o que espero, mas a tradição dos nossos tribunais tende à pior interpretação, mormente porque grassa em nosso meio a cultura de que o rigor na repressão criminal é a panacéia de todos os males.

          A pessoa pode se drogar todo dia com cerveja, pinga, vinho etc. Porém, o uso de um psicotrópico ilícito a obriga a imposição de uma pena porque alguns hipócritas pretendem a exclusão total de tais pessoas da sociedade. Fumantes se acham melhores que alcoólatras e vice-versa. Porém, segundo a hipocrisia reinante, em nível muito inferior aos usuários de psicotrópicos lícitos, estão os maconheiros, os drogados etc.

          O que me intriga é o fato do usuário de droga lícita não ser classificado como "drogado". Bebo cerveja com freqüência e deixo isso evidente. Não tenho vergonha disso, mas alguns péssimos alunos tentam se valer desse fato para inventar que trabalho bêbado ou que sou um alcoólatra como se eu não merecesse credibilidade [1]. Porém, prefiro afirmar como Heidegger: o homem é um ser preguiçoso, não gosta de pensar [2].


2. DA INIMPUTABILIDADE DO AGENTE

          2.1 A embriaguez na Lei nº 11.343/2006

          As pessoas são, em regra, imputáveis, mas a tenra idade, a doença mental, a embriaguez involuntária, a vis compulsiva (coação moral) e o erro de proibição podem excluir a culpabilidade. A inimputabilidade, na Lei nº 11.343/2006, está prevista da seguinte maneira:

          "Art. 45.  É isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

          Parágrafo único.  Quando absolver o agente, reconhecendo, por força pericial, que este apresentava, à época do fato previsto neste artigo, as condições referidas no caput deste artigo, poderá determinar o juiz, na sentença, o seu encaminhamento para tratamento médico adequado".

          O caput do art. 45, reuniu nele os preceitos do art. 26, caput, e art. 28, § 1º, ambos do CP. São três as causas da inimputabilidade em função de embriaguez completa : a) em razão de dependência; b) decorrente de caso fortuito; c) proveniente de força maior.

          A dependência de droga lícita ou ilícita poderá evidenciar uma doença de conteúdo físico e psíquico sobre a qual o agente não terá domínio. Daí ser razoável o dispositivo do art. 45, caput. No entanto, ele mantém a regra geral do art. 28, inciso II, do CP, uma vez que não há incompatibilidade entre os dois dispositivos.

          A embriaguez pode decorrer de drogas lícitas ou ilícitas, ou ainda de outros produtos, inclusive gases naturais. Outrossim, o agente pode se embriagar voluntariamente ou não. No caso daquele que se coloca voluntariamente em condição de inculpabilidade para poder praticar o crime, incorrerá em ação livre para a causa (actio liberae in causa), que constituirá circunstância agravante (CP, art. 61, inciso II, alínea "l").

          A embriaguez decorrente de força maior (o agente é forçado a ingerir ou inalar a substância capaz de embriagar), v.g., o calouro que é vítima de trote violento em que o obrigam a ingerir bebida alcoólica, em sendo completa, exclui a culpabilidade (CP, art. 28, § 1º). Porém, se a embriaguez for incompleta haverá apenas a redução da pena, de 1/3 a 2/3 (CP, art. 28, § 2º). Havendo dúvida sobre o estado de embriaguez do agente, deve-se, em face do princípio in dubio pro reo, considerá-lo completamente embriagado (inimputável).

          2.2 Distinção entre caso fortuito e força maior

          Mesmo raciocínio se aplica ao caso fortuito, que é aquele em que o agente não pode prever a embriaguez. É comum ouvir falar que força maior é o evento decorrente de atuação humana, enquanto o caso fortuito provém da natureza. Por essa distinção, se uma pessoa é forçada por atuação de outra a praticar determinada conduta, há força maior, mas se a obrigatoriedade decorre de um evento da natureza (enchente, terremoto, maremoto etc.) estar-se-á ante caso fortuito. No entanto, não é essa a distinção adequada. Considero como mais própria a seguinte distinção:

          "O caso fortuito é, no sentido exato de sua derivação (acaso, imprevisão, acidente), o caso em que não se poderia prever e se mostra superior às forças ou à vontade ou ação do homem.

          O caso de força maior é o fato que se prevê ou é previsível, mas não se pode igualmente evitar, visto que é mais forte que a vontade ou a ação do homem.

          Assim, ambos se caracterizam pela irrestibilidade. E se distinguem pela previsibilidade ou imprevisibilidade". [3]

          Enquanto é fácil concordar com a imputabilidade do emocionado, bem como do apaixonado, a embriaguez apresenta muitos complicadores. Do ponto de vista político-criminal, é correto não deixar sempre o embriagado imune. Ocorre que considerar imputável aquele que se embriagou voluntariamente ou negligentemente, tende à responsabilidade criminal objetiva, o que não pode ser admitido.

          Acerca do assunto, é oportuna a lição de Álvaro Mayrink, construída no sentido de que deveríamos adotar a postura portuguesa, suiça ou alemã, considerando o delito praticado pelo ébrio como crime autônomo. [4]

          2.3 O dolo e a negligência do embriagado

          Defendi um rapaz que atirou em um amigo. Foi preso em flagrante e não tinha condições de prestar declarações no momento de sua autuação em flagrante. No dia seguinte sequer sabia o porquê de estar preso. Analisando os autos, conclui que ele teve animus necandi (dolo dirigido ao resultado morte) ao atirar. Porém, percebi que se tratava de pessoa alcoólatra que não era capaz de dominar sua vontade, bem como de perceber a ilicitude de sua conduta, no momento do fato.

          Ele foi condenado a 4 anos de reclusão em regime inicial aberto. Concordou com a pena e não houve recurso. Entretanto, fico em dúvida sobre a adequação da decisão ao fato.

          O art. 28 do CP estende a teoria da actio liberae in causa. Esta significa que o agente, conscientemente, se coloca em condição de inculpabilidade, a fim de praticar determinado crime. No entanto, aquele que é dependente do álcool é um doente, merecendo a aplicação do art. 26 do CP, considerando-o inimputável ou semi-imputável, conforme o caso.

          O rapaz que defendi era casado, tinha dois filhos e extremamente pobre. Pedir o reconhecimento da inimputabilidade, em face do alcoolismo, encontrava 2 obstáculos: 1º) podia ser que a perícia não reconhecesse a doença, uma vez que ele só bebia de vez em quando, sendo que há um equivocado costume de só considerar alcoólatra aquele que habitualmente ingere bebidas alcoólicas; 2º) em se tratando de pessoa pobre, o reconhecimento do alcoolismo poderia levar a uma medida de segurança a ser especificada internação, o que poderia constituir prisão perpétua.

          Pior que situações como a que enfrentei são os casos em que ocorre atropelamento de pessoa por motorista embriagado. Em se tratando de pessoa alcoólatra e pobre, a situação fica extremamente difícil, mormente diante da crescente tese de que ao se embriagar e depois dirigir veículo automotor a pessoa assume o risco do resultado. A tendência é a desgraça, caracterizada pela imposição de medida de segurança de caráter perpétuo, uma vez que não há prazo máximo.

          Há certa resistência judicial e psiquiátrica em tratar o alcoólatra como pessoa doente, quando é notório o contrário. A medida de segurança seria a solução, desde que se cumprisse o disposto nos arts. 96-99 do CP. Porém, como prevalece a internação quando o delito praticado é classificado como sendo doloso, e, portanto, a internação, sem respeito aos direitos mínimos do internado, a medida de segurança deve ser evitada.

          No caso do meu cliente benemérito, acima mencionado, a pior coisa que poderia lhe ocorrer seria a imposição de medida de segurança. De outro modo, por lhe faltar – na ocasião do delito – consciência da ilicitude, era inimputável, já que não lhe era exigível conduta conforme o Direito. Porém, essa situação concreta lhe era desfavorável. Razão pela qual tentei apenas dizer que a extensão da actio liberae in causa, por constituir responsabilidade objetiva em matéria criminal, deveria afastar a qualificadora do motivo fútil, invocada pela acusação.

          O embriagado não tem consciência do exato do motivo de sua conduta, não devendo incidir qualificadora subjetiva, salvo se evidente a actio liberae in causa. Esta não se presume, devendo ser provada, v.g., caso reste provado que alguém se embriagou para poder participar de "pega" de carros, evidente será a actio liberae in causa. Porém, imagine-se que a pessoa pensa estar nos limites de seus reflexos e que só ingeriu o suficiente de bebida alcoólica a lhe dar coragem para a disputa. Nesse caso, não se pode falar em ação livre para a causa, eis que não havia a vontade de ficar na situação de inculpabilidade, mas apenas mais corajoso.

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          Tenho por razoável estender o raciocínio à embriaguez negligente, quando ela está determinada a um fim, caracterizando a actio liberae in causa, embora sabendo não ser propriamente o que expõe a teoria. Porém, tenho minhas reservas ao art. 28 do CP.

          Bebi muito no dia 2.12.1994. Meus amigos perceberam meu elevado nível de embriaguez e quiseram evitar que eu dirigisse veículo automotor. Não conseguiram. Pensei estar apto para dirigir, dormi e colidi de frente com uma carreta. Quase morri. Houve dolo? Entendo eu que não, uma vez que acreditei estar apto a ir para minha casa, ou seja, neguei o resultado. De outro modo, emerge a pergunta: tinha consciência da licitude/ilicitude da conduta? A resposta, certamente, será negativa (sequer me recordo da data). Daí a dúvida: houve dolo? É lógico que não. Pensei estar em condição física para dirigir, só subsistindo a negligência, uma vez que trafegava dormindo na contramão, portanto, negligente ao dever de cuidado.

          O exposto me leva a concluir que se mesmo o doente mental tem dolo, caracterizado pelo desejo de produzir – ou assumir – o resultado, também o tem o embriagado. O doente mental, assim como o embriagado, age negligentemente, isso quando não adota técnicas de segurança que o homem "médio" adotaria. Não se pode, portanto, pretender classificar como doloso todo resultado jurídico-criminal resultante da conduta do embriagado.

          Quanto à embriaguez, existem autores que consideram o art. 28 do CP como aquele que consagra a responsabilidade objetiva em matéria criminal. [5] Entendo que o preceito se aproxima da responsabilidade objetiva, mas compete ao intérprete aplicar a eqüidade, a fim de evitar o rigor exagerado da lei.

          Inseri a embriaguez pelo álcool, a qual conta com menos rejeição social. Imagine-se, no entanto, se a pessoa for conhecida usuária de psicotrópico ilícito. Nesse caso, a rejeição e o desejo de rigor será ainda maior.

          Chamam a atenção os julgamentos ocorridos na região sul do país, que ganharam guarida no STJ e STF, [6] onde rapazes que praticando "racha", ou expressando tecnicamente, "disputando corrida com espírito de emulação" (art. 308 da Lei nº 9.503/1997), provocam a morte negligente de pedestres, ou condutores de outros veículos. Nesse caso, em regra, o condutor tem o desejo de competir fazendo a previsão da possibilidade de vir a acontecer um acidente (colisão, choque, ou atropelamento), ofendendo objeto jurídico alheio, mas acredita que a sua perícia impedirá tal resultado. Assim, presente estará a negligência imprópria (negligência subjetiva ou negligência consciente), mas não dolo. A negligência consciente não pode ser confundida com o dolo eventual. [7] Naquela, o agente pratica o ato acreditando que sua perícia, ou que o veículo (ou, em outros exemplos, que o instrumento utilizado), impedirá o resultado.

          A fundamentação de "política criminal", estabelecida em favor de considerar o delito de trânsito, em praticamente todas as oportunidades, como doloso, é extremamente frágil. Vejamos, por exemplo, a posição de Guilherme Nucci:

          "As inúmeras campanhas realizadas, demonstrando o perigo da direção perigosa e manifestamente ousada, são suficientes para esclarecer os motoristas da vedação legal de certas condutas, tais como o racha, a direção em alta velocidade, sob embriaguez, entre outras". [8]

          No dolo eventual, o agente, além de fazer a previsão do resultado, assume o risco de sua produção. Assim, carece de fundamento jurídico a tese extrema, adotada na referida região do País, visto que ali se tem entendido sempre que há dolo eventual. Ao nosso sentir, tais delitos, como regra, devem ser mantidos no campo da negligência, visto que os resultados, em regra não são desejados nem assumidos pelos autores. A leviandade do autor não é suficiente para transformar o delito em doloso. Nesse sentido, dispõe o CPM:

          "Art. 33. Diz-se o crime:

          I – quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;

          II – culposo, quando o agente, deixando de empregar a cautela, atenção ou diligência ordinária ou especial, a que estava obrigado em face das circunstâncias, não prevê o resultado que podia prever ou, prevendo-o, supõe levianamente que não se realizaria ou que poderia evitá-lo".

          Distinguir o delito negligente impróprio (subjetivo) daquele praticado mediante dolo eventual é uma tarefa árdua, visto que o autor sempre dirá que procurou não aceitou o resultado. Desse modo, ante o fato concreto se deve analisar os elementos externos a fim de verificar se efetivamente seria crível que o agente pudesse naquela situação acreditar que o resultado não ocorreria, seja por sua perícia, ou seja, pelo instrumento utilizado. Destarte, a análise de cada fato deve levar em consideração as circunstâncias que o envolveram, bem como a perícia do agente, não se rotulando, como se tem feito, de crime doloso todo aquele que envolve corrida com espírito de emulação ou em que o autor estava em elevadíssima velocidade.

          Ao contrário de etiquetar o usuário de psicotrópico como bandido ou qualquer outra classe que deve viver à margem da sociedade, mister uma análise técnica do delito e da lei, sem se esquecer que a atividade jurídica, antes de tudo, deve ser científica. Por isso, o dependente deve ser tratado como doente mental e, portanto, ao contrário do rigor, poderá merecer isenção de pena (inimputabilidade) ou diminuição de pena (semi-imputabilidade).


3. SEMI-IMPUTABILIDADE DO AGENTE

          Nos arts. 26, parágrafo único e 28, § 2º, ambos do CP é possível encontrar redação semelhante à da Lei nº 11.343/2006:

          "Art. 46.  As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento".

          Aquele que não entende o caráter ilícito do fato, ou que não pode se conduzir segundo o seu entendimento, em face de doença mental, é inimputável. De outro modo, quem, em decorrência de doença mental, tem sua capacidade diminuída, é considerado semi-imputável, podendo ser apenado, ou submetido a uma medida de segurança.

          A diminuição da culpabilidade (censurabilidade) é natural, tendo em vista que a diminuição da capacidade para entender o caráter de domínio sobre o fato, ou, mesmo que entenda, conduzir-se segundo essa vontade, constitui elemento que retira parcialmente a exigibilidade de conduta conforme o direito, devendo o Juiz optar por pena reduzida, mas com a possibilidade de convertê-la em medida de segurança.

          No CP de 1940, adotamos o sistema do duplo-binário, pelo qual impõe-se pena e medida de segurança ao semi-imputável. A partir de 1984, com a edição da nova PG/CP, adotamos o sistema vicariante, só sendo possível a imposição de pena, ou de medida de segurança. No entanto, a Lei nº 6.368/1976 consagrava o sistema do duplo-binário, mantido no art. 47 da nova lei.

          No caso de embriaguez eventual incompleta decorrente de psicotrópico ilícito, proveniente de caso fortuito ou força maior, mister será reconhecer a impossibilidade de se impor medida de segurança, só cabendo a redução da pena, prevista no art. 46. Caso o agente seja parcialmente dependente, ou apresente algum problema mental que lhe diminua a capacidade para entender o caráter ilícito do fato, ou entendendo, sua capacidade para determinar-se segundo esse entendimento esteja afetada, deverá ser submetido à pena reduzida, não podendo o Juiz substituí-la por medida de segurança.


4. DO SISTEMA VICARIANTE

          Sistema vicariante é o de substituição. É um sistema em que haverá pena ou medida de segurança, um substituindo o outro. No CP de 1940 adotávamos o sistema do duplo-binário, pelo qual havia pena e medida de segurança, a serem impostas ao semi-imputável, com a reforma de 1.974 passamos a adotar o sistema vicariante, isso para a acompanhar a Alemanha.

          O finalismo e o sistema vicariante foram adotados na Lei nº 7.209, de 11.7.1984. Quanto ao finalismo, o CP não é puro e o adotou tardiamente, visto que o finalismo ensejou grandes debates na Europa na década de 1.950 e foi abandonado em seu berço (Alemanha), na década de 1.970. Também, em relação ao sistema vicariante, o Brasil pecou ao tentar acompanhar a Alemanha, visto que ela abandonou o sistema do duplo-binário, mas quando adotamos o sistema vicariante, aquele país já tinha retornado ao sistema do duplo-binário.

          Deve-se concordar com Álvaro Mayrink, o qual, com autoridade para tratar do assunto, escreve:

          "Aliás, como ex-diretor de estabelecimento penal (1966), posso atestar que o duplo-binário era uma fantasia e não uma realidade. Inexistiam estabelecimentos penais próprios para custodiar os semi-imputáveis, e as medidas de segurança aplicáveis aos imputáveis eram transformadas em liberdade vigiada após simbólico exame de verificação de cessação de periculosidade". [9]

          O art. 47 da Lei nº 11.343/2006 preceitua:

          "Na sentença condenatória, o juiz, com base em avaliação que ateste a necessidade de encaminhamento do agente para tratamento, realizada por profissional de saúde com competência específica na forma da lei, determinará que a tal se proceda, observado o disposto no art. 26 desta Lei".

          O fato de ser a pessoa semi-imputável obriga o Juiz a aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art. 46, não podendo aplicar o art. 98 do CP. Não obstante isso, poderá determinar o tratamento do condenado.

          O tratamento visará a complementar o fim preventivo da norma criminal. Trata-se de preservação do direito à saúde ao condenado e ao internado e não de estabelecimento de eventual sistema do duplo-binário. Por isso, a nova lei se mantém fiel ao sistema vicariante, ou seja, é vedada a substituição da pena por medida de segurança, mas não se impõe esta ao final da pena, nem se pode compelir a pessoa condenada ao tratamento.


Notas

  1. Em minha página eletrônica (www.sidio.pro.br) disponibilizo a resposta dada a um aluno que representou contra minha pessoa, como se eu fosse um péssimo profissional, inserindo o fator bebida alcoólica como agravante.
  2. CHAUÍ, Marilena de Souza. Vida e obra. HEIDEGGER, Martin. Os pensadores: Heidegger. São Paulo: Nova Cultural, 1.995. p. 8: "A vida cotidiana faz do homem um ser preguiçoso e cansado de si próprio, que, acovardado diante das pressões sociais, acaba preferindo vegetar na banalidade e no anonimato, pensando e vivendo por meio de idéias e sentimentos acabados e inalteráveis, como ente exilado de si mesmo e do ser".
  3. SILVA, De plácido e.Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2.002. p. 159.
  4. COSTA, Álvaro Mayrink da. Direito penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. v. 1., t. 2, p. 995.
  5. Sem tomar partido, menciona a controvérsia: NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.002. p. 159-162. Entende que constitui responsabilidade objetiva: JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. v. 1, p. 501/511. Deixa implícita a discordância, lembrando que o CP espanhol não pune o resultado doloso ou negligente (art. 20, § 2º): BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. v. 1, p. 318. São Peremptoriamente contra a responsabilidade criminal do embriagado: DELMANTO, Celso; DELMANTO, Roberto. DELMANTO JÚNIOR, Roberto. Código penal comentado. 4. ed. São Paulo: Rio de Janeiro: Renovar. 1.998. p. 54.
  6. Vide referências a precedentes em: NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 121/122.
  7. FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito Penal. Rio de Janeiro: Forense, Parte Geral, 1990. p. 173.
  8. NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 121.
  9. COSTA, Álvaro Mayrink da. Direito penal: parte geral. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. v. 1, t. 3, p. 1.930.

Este artigo é, praticamente, uma transcrição de um trecho de um livro que, em breve, publicarei.

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Sobre o autor
Sidio Rosa de Mesquita Júnior

Procurador Federal e Professor Universitário. Graduado em Segurança Pública (1989) e em Direito (1994). Especialista Direito Penal e Criminologia (1996) e Metodologia do Ensino Superior (1999). Mestre em Direito (2002). Doutorando em Direito. Autor dos livros "Prescrição Penal"; "Execução Criminal: Teoria e Prática"; e "Comentários à Lei Antidrogas: Lei n. 11.343, de 23.8.2006" (todos da Editora Atlas).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa. O sistema vicariante na Lei nº 11.343/2006. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1363, 26 mar. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9654. Acesso em: 20 abr. 2024.

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