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Os Municípios, o ISS e os crimes contra a ordem tributária

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O texto aborda a atuação do Ministério Público e dos agentes Fazendários na tutela penal da ordem tributária, em consonância com as disposições da Lei nº 8.137/90, no que tange ao Imposto Sobre Serviços (ISS).

Sumário: 1. Introdução. 2. Um pequeno histórico dos Municípios. 3. Breves considerações a respeito do ISS. 4. A ordem tributária e a lei n. 8.137/90. 5. Aspectos penais e processuais penais relevantes. 6. A atuação do Ministério Público e do Agente Fazendário do Município. 7. Formas mais usuais de sonegação fiscal do ISS. 8. O término do processo administrativo e o oferecimento da peça acusatória. 9. A crise da tutela penal do ISS. 10. Considerações finais. 11. Notas. 12. Referências.


1.Introdução

Este trabalho tem por objeto discorrer sobre as características atinentes à estrutura municipal brasileira, especialmente no que tange ao Imposto Sobre Serviços – ISS, tributo de competência municipal. Abordará, também, a atuação do Ministério Público e dos agentes Fazendários na tutela penal da ordem tributária, em consonância com as disposições da Lei n. 8.137/90. Pretende, ainda, descrever as formas mais usuais de sonegação do citado imposto, destacando alguns aspectos relevantes na aplicação de institutos de Direito Penal e Processual Penal.

As dificuldades dos Municípios em estruturar-se para apurar os elementos necessários à responsabilização penal pela evasão fiscal do imposto em comento, como também, a falta de vontade política dos Administradores Públicos, os quais, geralmente, voltados a uma ideologia partidária, considerando-se a aproximação direta entre munícipes e administrador, omitem-se quanto à busca dos dados necessários para a responsabilização penal dos contribuintes, também integra a temática observada neste estudo.

O tema relativo aos crimes contra a ordem tributária é bastante importante, polêmico, atual e complexo. Na Itália, em virtude da grande dificuldade de gestão do sistema sancionatório dos crimes tributários, o assunto, dada a sua importância, sofreu grandes modificações a partir de 2000, através do Decreto Legislativo nº 74, do dia 10 de março de 2000.

No Brasil, o controle penal da ordem tributária é regulado, basicamente, pela Lei n. 8.137/90, por meio da qual são definidos os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, enquanto que o ISS, encontra-se regulado pela atual Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003.

Resultante da imbricação entre Direito Tributário e Direito Penal, a defesa da ordem tributária pela via do Direito penal, reclama do profissional conhecimentos nas duas áreas da dogmática jurídica. Assim, não basta o domínio de um dos saberes; revela-se indispensável conhecer os institutos tanto do Direito Tributário quanto do Direito penal para enfrentar temas que discorram sobre o controle penal da ordem tributária.

Cumpre frisar, outrossim, como bem enfatiza Márcia Aguiar Arend (1) ao tratar do controle penal na ordem tributária, que:

"os recursos suprimidos ou reduzidos em detrimento da Fazenda Pública não podem ser compreendidos como mero interesse fazendário. Interesse da Fazenda Pública é interesse público, interesse de toda a sociedade, reunindo as características de direito e interesse difuso".


2.Um pequeno histórico dos Municípios

O Brasil foi descoberto no ano de 1500. Permaneceu na condição de colônia durante trezentos e vinte e dois (322) anos. O "acordo" da independência foi anunciado em 1822 e a monarquia, com todas as suas raízes, continuou como forma de governo. Em 1889, por sua vez, foi proclamada a República. O Estado unitário, que havia prevalecido durante a monarquia (1822-1889), foi transformado em Federação, quando os Estados (então as antigas províncias), passaram a exercer influência decisiva no País.

Na necessidade de associação entre os homens e suas relações sociais com as outras pessoas repousa a origem do município. Sobre este ente federado Nelson Nery Costa leciona ser "[...]a base da organização política democrática, porque nele ocorre a verdadeira relação entre a sociedade e Poder Público. As necessidades dos cidadãos são mais objetivas, ao passo que a forma de reivindicá-la tem maiores possibilidades de êxito" (2).

A estruturação dos municípios no Brasil teve forte amparo da Igreja católica. No período colonial, ainda sob o sistema de capitanias, mesmo destituídos de autonomia, os conselhos e vilas foram despontando como embriões do modelo municipalista.

Com a proclamação da República em 1889, os Municípios pareciam ter alcançado a tão sonhada autonomia. Ocorre que não obstante à boa intenção dos constitucionalistas da época, tal pretensão resumiu-se a textos legais sem qualquer aplicação prática. O que prevaleceu neste período, como bem enfatiza Hely Lopes Meirelles foi o "hábito do centralismo, a opressão do coronelismo e a incultura do povo" (3).

Relata-nos, ademais, com muita precisão, o autor acima nominado, que tais costumes "transformaram os Municípios em feudos de políticos truculentos, que mandavam e desmandavam nos ‘seus’ distritos de influência, como se o Município fosse propriedade particular e o eleitorado um rebanho dócil ao seu poder" (4).

Em síntese, foram quatro décadas de opressão, sem liberdade e progresso no âmbito municipal. No denominado Estado Novo, as coisas não foram diferentes. Também e mormente aqui, houve um atraso no avanço dos Municípios. Foi um tempo em que os interesses locais permaneceram nas mãos dos interesses individuais, em face da vinculação dos Prefeitos ao Interventor.

Na atualidade, pode-se dizer com certeza que o Município compõe a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil, sendo salutar lembrar, igualmente, que possui, segundo a Magna Carta (5), a autonomia política, normativa, administrativa e financeira, sendo regidos por suas respectivas Leis Orgânicas.

Tais atributos, e isto é muito importante destacar, foram ampliados, tão-somente, na Constituição da República de 1988. Somente então o Município passou a ser reconhecido como parte integrante da Federação e a ser regido por uma Constituição própria: a Lei Orgânica Municipal, aprovada pela Câmara Municipal.


3.Breves considerações a respeito do Imposto Sobre Serviços - ISS.

Depois da Revolução de 31 de março de 1964, que, na verdade ocorrera no dia 1º de abril daquele mesmo ano, o Governo ditatorial, preocupado com a crise brasileira, e, sobretudo, com a recuperação econômica do Brasil, empenhou-se seriamente na formação de uma comissão, cuja missão era a de reformar radicalmente as práticas tributárias em nosso País.

Dentro desta ótica, surge, assim, a tão esperada reforma tributária, pela Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, que ofereceu ao Brasil um novo sistema tributário. A referenciada Emenda Constitucional teve, pois, o escopo de integrar a política Tributária na política Econômica do Governo que se instalava sob o comando dos militares.

Sem maiores delongas, pode-se dizer que a célebre e já referenciada Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, em seu art. 15, instituiu em nosso sistema tributário, o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN ou, simplesmente, Imposto Sobre Serviços – ISS, que veio em substituição ao antigo Imposto de Indústrias e Profissões.

A partir deste momento os Municípios passaram, então, com fulcro na Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, e no Código Tributário Nacional, ainda que com todas as dificuldades inerentes ao novo sistema, a implantar o novo imposto municipal.

Cumpre destacar que por mais que tenha havido esforços por parte das municipalidades, e não obstante aos avanços da legislação pertinente, ainda há Municípios, dentre os mais de cinco mil existentes no País, que não tributam o ISS, mesmo estando em plena vigência a Lei de Responsabilidade Fiscal que, como se sabe, não permite qualquer modalidade de renúncia de receita.

Inserido na Constituição Federal de 1988 (6), como sendo de competência municipal, o Imposto Sobre Serviços - ISS, apresenta-se, atualmente, sobretudo nas grandes cidades brasileiras, como a principal receita própria dos Municípios, em razão da concentração elevada dos serviços que são prestados pelos agentes econômicos no desenvolvimento da atividade produtiva.

Contudo, antes de se adentrar no cerne da controvérsia, consubstanciada na análise do crime tributário municipal, faz-se necessário tecer breves considerações em torno de algumas questões do Imposto Sobre Serviços - ISS e que interessam, sobremaneira, ao Direito Penal Tributário.

O ISS era regulado pelo antigo e ultrapassado Decreto-lei n. 406/68, que, segundo os autores Angelita De Almeida Vale e Ailton Dos Santos (7), foi reconhecido pela doutrina e pela jurisprudência como Lei Complementar. No referenciado ato normativo, constava uma lista de serviços (8), onde estavam previstos vinte e nove (29) itens (9) tendo sido modificada, posteriormente, através da Lei Complementar n. 56/87, que a ampliou consideravelmente para cem (100) itens, sendo que LC 100/99 veio a fechar a lista com um último item, chegando-se a cento e um (101) itens (10).

Atualmente encontra-se em vigor a Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, publicada no Diário Oficial da União, do dia 1º de agosto de 2003, que introduziu profundas modificações na sistemática do Imposto sobre Serviços – ISS, de competência dos Municípios, aumentando o número de serviços tributáveis por esta entidade tributante.

A Lista de Serviços, anexa à lei já mencionada, é, realmente, muito mais ampla do que a anterior, tendo incorporado serviços que antes não eram tributados. No mais, detalha, quase à exaustão, serviços já elencados, mas que pela modernidade e tecnologia, acabavam gerando dúvidas quanto à incidência ou não do imposto municipal, posto que não estavam especificados expressamente na lista.

A nova legislação nacional reguladora do ISS, em relação aos elementos do tributo, aponta como fato gerador "a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador" (11). Indica, ademais, que Contribuinte é o prestador do serviço (12), explicitando, finalmente, que a base de cálculo do referenciado imposto municipal é o preço do serviço (13), não tendo se omitido na fixação da alíquota máxima (14), muito embora não o tenha feito em relação à fixação da alíquota mínima, que se encontra disciplinada na Constituição Federal (15).

Outro ponto importante a ser destacado, diz respeito à classificação do referenciado tributo, a fim de que se possa, em face das características peculiares do imposto municipal aqui analisado, subsumir o tipo penal relativo aos crimes contra a ordem tributária ao respectivo sujeito ativo do delito, que poderá vir a figurar no pólo passivo da relação jurídico-processual penal.

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Em relação à classificação acima comentada, Carlos Dalmiro Da Silva Soares (16) agrupa os elementos essenciais do tributo em pauta, os quais se mostram de grande utilidade para o nosso estudo. Relaciona o ISS como

imposto de natureza fiscal (fim arrecadatório), [...] imposto indireto (embutido no preço final do serviço, o consumidor assume o ônus - contribuinte de fato), imposto do tipo ordinário ou permanente, imposto sobre objeto jurídico, imposto principal imposto periódico". (Grifos nossos).

Adotando-se, pois, os argumentos fulcrados na classificação do ISS, como imposto indireto, importante trazer a lume as lições de Andreas Eisele (17), o qual, ao comentar o inciso II, do art. 2º, da Lei n. 8.137/90, faz as seguintes considerações:

O tipo do art. 2º, II, trata das modalidades de tributos denominados indiretos, ou seja, aqueles em que ônus financeiro da operação não é suportado pelo sujeito passivo da obrigação tributária, denominado contribuinte de direito (que na realidade é o único contribuinte legalmente estabelecido), mas, sim, repassado a terceiro, denominado ´contribuinte de fato´. Exemplo de tal situação se verifica com o ICMS [...] Fenômeno análogo ocorre, ainda, com o IPI, o ISS [...] (Grifos nossos).

Uma das finalidades, portanto, acerca do conhecimento em relação à classificação dos tributos, seja esta de ordem financeira ou jurídica, está na possibilidade de se evidenciar a subjugação do sujeito passivo da obrigação tributária, como Réu, em eventual deflagração de ação penal pela prática de crime contra a ordem tributária.

Note-se, ademais, que esta condição somente se perfaz nos casos em o lançamento do ISS se dá por homologação, ou seja, quando o contribuinte antecipa o pagamento para o Fisco homologá-lo, não podendo ocorrer a responsabilização penal do sujeito passivo do referenciado imposto municipal nas hipóteses em que o recolhimento se dá pelo regime fixo anual

Muitos seriam os temas a serem enfrentados a respeito do Imposto Sobre Serviços - ISS, considerando as várias modificações e os pontos polêmicos advindos com a nova legislação, entretanto, mister salientar que o ponto central da discussão em pauta não visa um debate direto em relação ao nominado imposto municipal, mas sim, nas conseqüências penais advindas da supressão ou redução criminosa do tributo.


4.A ordem tributária e a Lei n. 8.137/90.

Há uma primeira noção que se deve ter em mente em relação ao tema aqui discutido: o verdadeiro sentido de ordem tributária. O assunto é tratado de forma especial pela professora Márcia Aguiar Arend (18), que entende a grande norma como sendo o sustentáculo matricial da Democracia e da Federação. Transcreve-se:

A ordem tributária, decorrente da ordem republicana e estruturada em harmonia com a ordem federativa, constitui base fundamental para a manutenção da atual ordem democrática constitucional brasileira.

Não há como reunir-se em federação, e em torno de princípios republicanos e democráticos, sem a previsão normativa e o efetivo viver de uma ordem tributária capaz de fazer frente às aspirações dos cidadãos, concebidos, pelo menos no plano da ideação legal, como iguais em oportunidades e direitos, dentro de um Estado Democrático que deve ser de Direito".

[...] O objetivo fundamental da ordem tributária é estabelecer o sistema normativo tributário através do qual o Estado diz aos seus administrados, sejam pessoas físicas ou jurídicas: ‘ entregue dinheiro ao Estado’ (19).

Pode-se dizer, então, que Ordem Tributária, em conjunto com os princípios Republicano, Federativo e Democrático, é um arcabouço normativo tendente a disciplinar a ação tributária como um todo, exercida pelo Poder Público, com o intuito de arrecadar recursos para o Estado e resguardar o Erário de ataques criminosos, tendentes a dilapidar os Tesouros Comuns.

Por outro lado, quando se fala em fraude fiscal, faz-se menção obrigatória à Lei n. 8.137/90, que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo. Tal texto legislativo foi elaborado durante o Governo do ex-Presidente Collor e teve como objetivo precípuo a proteção à legislação tributária, remetendo o contribuinte à observância das normas do direito tributário e às regras ditadas pelo Fisco, coibindo determinadas condutas reputadas ilícitas.

Mister salientar, ademais, que apesar de bastante criticada, a Lei n. 8.137/90 teve e tem um largo alcance social, posto que os crimes contra a ordem tributária são penalmente relevantes, à medida que os tributos são meios pelos quais o governo cumpre seu dever de realizar o bem comum.

Nos artigos 1º e 2o, da lei já referenciada, estão explicitadas as condutas delituosas de omissão ou supressão dos tributos relativos a essas matérias, cabendo frisar que as do art. 1º são punidas com sanção penal privativa de liberdade mais severa (reclusão), enquanto que as do art. 2º são mais brandas, apenadas com detenção.

Os tipos penais descritos no art. 1º, da Lei n. 8.137/90, provam-se com a cópia dos documentos, ou seja, qualquer escrito, instrumentos ou papéis públicos (livros e notas fiscais) ou particulares (anotações em cadernos ou livros não oficiais, caixa dois, dados bancários). Para a prova nas fraudes atuais mais rebuscadas, o ideal é a troca de informações entre instituições financeiras que, em muitos casos, é permitida por lei específica (20) sem necessidade de autorização judicial.

O art. 6º, da LC 105/2001, permite que os Agentes Fiscais tributários da União, do Estados, do Distrito Federal e dos Municípios possam examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive, os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, desde que existente processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso, o que vem a facilitar, em muito, a investigação e o combate à sonegação fiscal. Dita o respectivo dispositivo que:

Art. 6º – As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.

Parágrafo único. – O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária".

Os contribuintes, entretanto, tem contestado judicialmente tal legislação, ainda que aprovada pelo Congresso Nacional, sob o argumento de que ela fere o princípio constitucional insculpido no artigo 5º, inciso X da Carta Magna, o qual exara que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (21), tem rechaçado tais sustentações sob o argumento de que o sigilo bancário não é um direito individual absoluto e que a quebra é autorizada por Lei Complementar.

No caso das condutas descritas no art. 2º, da Lei n. 8.137/90, basta provar o não recolhimento (valor cobrado do contribuinte ou descontado de terceiro). Pela declaração do fisco se tem a prova da omissão, a qual deverá ser acrescida da prova de que o tributo tenha sido cobrado ou descontado. A prova da cobrança se dá pela nota fiscal, donde se depreende o destaque relativo ao valor devido do ISS proveniente da prestação de serviço, que será, efetivamente, recolhido pelo consumidor final.

O que é punido não é a inadimplência por si só, mas a conduta do agente em não recolher aos cofres públicos (ficar para si) o que já embutiu no preço final. Cita-se um exemplo: o prestador do serviço cobrou 18 do consumidor da peça lavada na lavanderia, entendendo que 3% por cento seria para o fisco, mas não recolhera este valor. Não entregara aos cofres públicos o valor que estava obrigado por lei.

Não é demais lembrar, outrossim, que não recolher tributos descontados de terceiros também constitui crime tributário, nos termos do art. 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90. Ex.: IRPF-fonte, INSS (parte do empregado), contribuição sindical, ISS e ICMS-fonte (substituição tributária).

Esclareça-se, novamente, que não é a inadimplência tributária pura e simples que é punida na esfera criminal. Gratia argumentandi, um contribuinte que deve IPTU não pode ser acionado criminalmente. Só serão punidas as condutas acima explicitadas, relativas a impostos cobrados do consumidor ou descontados de terceiros, não sendo o caso do IPTU, que é um imposto direto e não indireto.

Os sujeitos ativos do delito tributário, ou seja, os réus, que, eventualmente poderão vir a figurar no pólo passivo da relação processual penal instaurada em decorrência de tais infrações, quando denunciados pelo Ministério Público nas condutas do art. 1º, serão processados e julgados pela justiça comum. Se, entretanto, a peça acusatória descrever o tipo penal em uma das condutas do art. 2º, o feito será processado e julgado perante o Juizado Especial de causas penais de menor complexidade.

A Lei n. 8.137/90 (22), prevê, também, uma qualificadora, que deverá ser aplicada pelo juiz, na terceira fase da aplicação da pena, quando o crime ocasionar grave dano à coletividade, quando o crime for cometido por servidor público no exercício de suas funções, ou quando o crime for praticado em relação à prestação de serviços ou ao comércio de bens essenciais à vida ou à saúde.

Ocorre que, não obstante à previsão legal de dita causa especial de aumento de pena, vem se percebendo, através de investigações jurisprudenciais, que Ministério Público pouco vem se utilizando de tal majorante, mormente no que concerne às causas do inciso I, que no nosso entender, poderia ser aplicada, dependendo do valor do tributo suprimido ou reduzido, ou das formas utilizadas para burlar o Fisco.

No que tange à autoria desses tipos penais em relação ao ISS, tratando-se de sociedades simples ou firma individual, tipos mais usuais quando se trata de prestação de serviço, o seu administrador é que responde penalmente, devendo haver a comprovação de que este administrava a empresa no momento da sonegação. Essencial frisar, quanto a este particular, que com o advento do novo Código Civil, o representante legal da empresa, no caso da sociedade simples, passa a ser o Administrador, o qual veio a substituir a antiga figura do sócio-gerente.

O contador, em virtude do que dispõe o art. 11, da Lei n. 8.137/90 (23), também pode vir a ser responsabilizado penalmente e, dependendo do caso, ser denunciado como co-autor do crime. Deverá restar comprovada, entretanto, a sua culpabilidade, aqui, no caso, representada pelo dolo, ou seja, a vontade de cometer o delito. Não basta a ciência deste profissional liberal sobre os fatos delituosos, mas a prova de que ele também os praticou. Justamente por essa deficiência na prova, existem raríssimos casos de condenação dos contadores como co-responsáveis. Civilmente não há dúvidas acerca de sua responsabilidade, mas criminalmente a condenação é bastante improvável.

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Sobre a autora
Cleide Regina Furlani Pompermaier

Procuradora do Município de Blumenau; Especialista em Direito Tributário pela Universidade Federal de Santa Catarina; Professora da Pós-Graduação da UNIDAVI em Rio do Sul, Santa Catarina, em nível de especialização, no curso de Planejamento Tributário, na disciplina de ISS; Professora de Direito Tributário do IBES SOCIESC – Instituto de Ensino Superior de Blumenau e FAE – Faculdade Franciscana em Blumenau, Santa Catarina, SC; membro do Conselho Municipal de Contribuintes do município; autora do livro O ISS nos Serviços Notariais e de Registros Públicos – Teoria e prática.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

POMPERMAIER, Cleide Regina Furlani. Os Municípios, o ISS e os crimes contra a ordem tributária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 683, 19 mai. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6744. Acesso em: 24 abr. 2024.

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