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A cobrança da Declaração de Contribuições e Tributos Federais (DCTF) e seu lançamento na dívida ativa

10/01/2005 às 00:00
Leia nesta página:

1-Introdução:

Este texto trata de esclarecer algumas questões sobre crédito tributário, lançamento e dívida ativa oriunda do não cumprimento da prestação decorrente da DCTF. A primeira indagação é: Pode existir crédito tributário sem a realização do correspondente lançamento?

Tenta-se nortear, em seguida, esclarecimentos se pode a Fazenda Pública Federal inscrever em dívida ativa os valores declarados e não pagos constantes na DCTF conforme o art. 8º, §1º da IN – SRF –nº 255/02 antes de cumprir o disposto no art. 142 do CTN.

A norma contida naquele artigo é o seguinte:

Art. 8o Todos os valores informados na DCTF serão objeto de procedimento de auditoria interna.

§ 1º Os saldos a pagar relativos a cada imposto ou contribuição, informados na DCTF, serão enviados para inscrição em Dívida Ativa da União após o término dos prazos fixados para a entrega da DCTF.

...

Já o Código Tributário Nacional determina em seu artigo 142:

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Essas dúvidas são oriundas principalmente por termos um ordenamento jurídico bastante complexo, o que chega a levar-nos a sempre a questionar sobre a constitucionalidade dos atos legislativos praticados no dia-a-dia em nosso país chegando a deixar de lado o bom senso e aplicando sempre teorias dogmáticas.


2- O momento da formação do crédito tributário:

Utilizando-se do ensinamento do mestre Hugo de Brito, este leciona que "a obrigação tributária é o vínculo jurídico por força do qual o particular sujeita-se a ter contra ele feito um lançamento tributário" e termina seu raciocínio lecionando que a obrigação tributária principal não cumprida ou acessória descumprida - que por isso fez nascer uma obrigação principal -, far-se-á um lançamento, constituindo assim um crédito tributário e que só então poderá exigir o objeto da prestação obrigacional, isto é, o pagamento. Pois bem, leva-nos a concluir que a existência do crédito tributário tem como pressuposto o lançamento e concluímos que antes do lançamento existe a obrigação e que somente após o lançamento teríamos o crédito tributário. Comprovando a materialidade desta conclusão, ressaltamos que a anulação do lançamento – quando não foi assegurado o direito de defesa do sujeito passivo por exemplo – torna sem validade o crédito formado. Seria o lançamento ato administrativo vinculado e obrigatório.


3- O art. 8º da IN nº 255/02 da Secretaria da Receita da Fazenda

Bem, pelo acima exposto, questiona-se se pode a Fazenda Pública Federal inscrever em dívida ativa os valores declarados e não pagos constantes na DCTF conforme o art. 8º, §1º da IN – SRF –nº 255/02 antes de cumprir o disposto no art. 142 do CTN.

Dita o art. 8º, §1º dessa IN que "os saldos a pagar relativos a cada imposto ou contribuição, informados na DCTF, serão enviados para inscrição em Dívida Ativa da União após o término dos prazos fixados para a entrega da DCTF."

Já o CTN em seu art. 142 determina que "compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível."

Percebem-se como os institutos não têm aplicabilidade harmônica se interpretados de forma sistemática. Contudo, aparentemente a Instrução Normativa em questão suprimiu uma fase procedimental indo de encontro ao que é determinado pelo CTN e nesse ponto pode-se falar em inconstitucionalidade da aplicação de tal instrução administrativa pois estaria usurpando do contribuinte direitos como o contraditório e a ampla defesa, integrantes dos institutos do Direito Tributário.


4- A questão da legalidade da imposição da DCTF por Instrução Normativa.

A DCTF nada mais é que uma obrigação acessória e, conforme o CTN, se não cumprida terá mesma natureza de principal podendo transformar em crédito tributário. Existe posicionamento de que não é legal a imposição da DCTF da forma que foi incluído em nosso ordenamento jurídico utilizando-se dos seguintes argumentos: "a imposição do Fisco em fazer com que os contribuintes entreguem a Declaração de Contribuições e Tributos Federais – DCTF não merece acolhida diante de nosso ordenamento jurídico, porquanto as instruções normativas que prevêem tal obrigatoriedade não encontram fundamento de validade em normas compatíveis com os princípios da legalidade (art. 5º, inciso II da CF/88), da separação dos poderes (art. 2º da CF/88) e da indelegabilidade da competência tributária (art. 7º do CTN)" como conclui FILIZOLA, Cinthia Filizola e Paula Vilela em artigo publicado na internet.

Interessante que esquecem de mencionar justamente o art. 142 do CTN, pois o art.8º da IN – SRF nº255/02 determina a inscrição na divida ativa sem mencionar a preexistência do lançamento por autoridade administrativa, logo essa inscrição seria ilegal não só por argumentos utilizados acima mas por não poder se falar em crédito tributário já que não existiu o pré-requisito do lançamento tributário. Não comungo com a idéia que IN não pode instituir e regulamentar a DCTF pois seria um absurdo esperar que o Poder Legislativo fosse encarregado desta tarefa.

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Esse impulso de que em toda criação de norma deve-se questionar a sua Constitucionalidade chega ao campo do absurdo quando se pregar que uma IN oriunda de um Órgão Publico- esclarecendo como deve ser feito o preenchimento de uma guia de declaração, determinando a obrigatoriedade de entrega de tal guia, ditando as penalidades pelo não cumprimento dessa - seja inconstitucional apenas por não ser determinado em lei; não deve ter acolhimento no ordenamento jurídico e nem tão pouco pela doutrina esse posicionamento. Caberia o legislador legislar até mesmo em procedimentos meramente administrativos? Isso sobrecarregaria nossos legisladores e as conseqüências seriam imensuráveis já que toda norma deveria ser cumprida somente se fosse determinada em lei.

A Constituição em seu art. 5º não teve a intenção de determinar que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei" utilizando "lei" em sentido strictu e sim a terminologia "lei" como sendo aplicada em seu sentido amplo, caso contrário a imposição de ordem social seria por demais complexa e uma simples IN obrigando a entrega de uma declaração pelo contribuinte não teria valor por não passar pelo crivo das Câmaras Legislativas (inconcebível essa idéia).

Ademais, pelo raciocínio exposto no ponto dois deste texto, a Fazenda Pública Federal não deveria inscrever em dívida ativa os valores declarados e não pagos constantes na obrigação acessória pois o CTN além de ter natureza de Lei Complementar – o que não poderia ser modificado por Instrução Normativa, determina que a formação do crédito tributário dá-se pelo lançamento e, após isso, poder-se-ia inscrever em dívida ativa conforme o artigo 142 transcrito no texto.


5- Conclusão:

Por tudo, fica esclarecido que a Instrução Normativa oriunda da Receita da Fazenda, que foi publicada no DOU de 12 de dezembro de 2002 dispondo sobre a Declaração de Débitos e Créditos Tributários, o seu art. 8º encontra-se desarmônico com o CTN no ditame do art. 142 e logo deve ser revisto a inscrição da Dívida Ativa conforme tal IN pois, sem que haja o devido lançamento, não há de se falar em crédito tributário não podendo então, conseqüentemente, inscrever em Dívida Ativa.


Bibliografia:

Brasil. Código Tributário Nacional / obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com colaboração de Antonio Luiz Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Luiz Eduardo Alves de Siqueira. – 29 edição – São Paulo: Saraiva, 2000.

FILIZOLA, Cinthia; VILELA, Paula. Declaração de Contribuições e Tributos Federais (DCTF). Pode ser instituída por atos infra-legais? E quanto à penalidade pecuniária?. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 234, 27 fev. 2004. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=4893>. Acesso em: 20 de out. 2004.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros Editores, 2003.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico/ atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho – Rio de Janeiro: Forense, 2003.

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Sobre o autor
Kleidson Assis Sandes Lima

Advogado e pós-graduado em Direito Tributário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Kleidson Assis Sandes. A cobrança da Declaração de Contribuições e Tributos Federais (DCTF) e seu lançamento na dívida ativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 552, 10 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6149. Acesso em: 24 abr. 2024.

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