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Atipicidade conglobante no estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito

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05/05/2010 às 00:00
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RESUMO

Este trabalho tem por objetivo facilitar o trabalho de todos os aplicadores do Direito de um modo geral – mais especificamente os que atuam na área penal –, pois na verificação de condutas delitivas há casos em que a constatação da inocorrência de um crime pode ser verificada logo no primeiro elemento constitutivo do crime, que é o fato típico. Tendo por base a teoria da Atipicidade Conglobante é possível eliminar condutas que apenas aparentam ser delitivas, por meio do impedimento de existência de antinomias no ordenamento jurídico. Condutas que são fomentadas ou determinadas por lei, não podem ser proibidas.

Palavras-Chaves: Estrito Cumprimento do Dever Legal; Exercício Regular de Direito; Fato Típico; Tipicidade; Tipicidade Conglobante.

SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Conceito de Crime 2.1. Conceito Formal de Crime 2.2. Conceito Material de Crime 2.3. Conceito Analítico de Crime 2.3.1. Conceito Bipartido de Crime 2.3.2. Conceito Quadripartido de Crime 2.3.3. Conceito Tripartido de Crime 3. Elementos do Crime 3.1. Fato Típico 3.1.1. Conduta 3.1.2. Resultado 3.1.3. Relação de Causalidade 3.1.4. Tipicidade penal 3.2. Antijuridicidade/Ilicitude 3.2.1. Relação entre Fato Típico e Antijuridicidade 3.3. Culpabilidade 4. Fato Atípico 5. Estrito Cumprimento do Dever Legal 6. Exercício Regular de Direito 7. Atipicidade Conglobante 8. Conclusão 9. Referências Bibliográficas


1. Introdução

Antes de apresentar o tema principal desse estudo é necessário fazer uma breve apreciação de um dos principais institutos do Direito Penal, o Crime. Seguindo será apresentado o instituto do Estrito Cumprimento do Dever Legal e do Exercício Regular de Direito, e finalmente a Teoria da Atipicidade Conglobante e sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro.


2. Conceito de Crime

O conceito de crime no ordenamento jurídico brasileiro é muito discutido pela doutrina, pois o código penal não o apresenta. A Lei de Introdução ao Código Penal é que mais se aproxima desse conceito, em seu artigo 1º: "Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa".

Porém, essa definição é insuficiente, sendo necessário um estudo mais apurado do conceito de crime. A partir desse estudo chegou-se a conclusão que o crime pode ser visto sob três aspectos: Formal, Material e Analítico – os quais serão estudados a seguir.

2.1. Conceito Formal de Crime

O Crime, sob a perspectiva Formal, é a conduta descrita na lei penal incriminadora que culmina uma sanção. Conforme preleciona Nucci (2007, p. 115): "É a conduta proibida por lei, sob ameaça de aplicação de pena". Do mesmo modo aponta Greco (2007, p.140) que: "Sob o aspecto formal, crime seria toda conduta que atentasse, que colidisse frontalmente contra a lei penal editada pelo Estado".

Como mencionado acima, é imprescindível a existência de uma lei penal incriminadora para se afirmar que uma conduta é crime.

2.2. Conceito Material de Crime

Sob o aspecto material, crime é toda conduta que lesa, ofende ou coloca em perigo bens juridicamente tutelados. Nesse ponto de vista, apresenta Bruno (1978, p. 285): "um ato que ofende ou ameaça um bem ou interesse jurídico julgado fundamental para a coexistência social, e por isso protegido pelo Estado sob ameaça de uma pena". Na mesma linha de raciocínio, Barros (2001, p. 102) define: "é o fato humano que lesa ou expõe a perigo bens jurídicos penalmente protegidos".

Logo, se o bem jurídico for lesado, e não for especificamente tutelado pelo Estado, não é crime. Como por exemplo, o preso que foge da penitenciária sem praticar o fato com violência, lesa o bem jurídico paz pública, porém não é crime, pois a conduta não vem expressa em lei penal incriminadora.

2.3. Conceito Analítico de Crime

Além da existência do aspecto Material (bem jurídico penalmente tutelado) e do Formal (conduta descrita em lei), o ato praticado pelo agente deve enquadrar-se na perspectiva analítica, ou seja, todos os elementos essenciais devem estar presentes.

Contudo, a perspectiva analítica apresenta divergência na doutrina, e três são as principais teorias que tentam conceituar o crime e seus elementos essenciais.

2.3.1. Conceito Bipartido de Crime

A teoria bipartida é dividida em duas correntes. A que considera o crime um fato típico e antijurídico, sendo a culpabilidade pressuposto de aplicação de pena, como leciona Damásio (2003, p. 456) "a culpabilidade não é requisito do crime, que apresenta duas facetas: fato típico e ilicitude. Ela funciona como condição da resposta penal". E a segunda corrente que defende que o crime é um fato típico e culpável. Essa teoria é a do Tipo Total de Injusto, na qual a ilicitude estaria inserida no Fato Típico. Nesse prisma, apresenta Nucci (2007, p. 153):

é o tipo que congrega, na sua descrição, embora implicitamente, as causas de justificação. Assim, falar em tipicidade seria considerar, ao mesmo tempo, a antijuridicidade, como se o tipo penal fosse construído da seguinte forma: furto seria "subtrair coisa alheia móvel, para si ou para outrem, desde que não fosse em estado de necessidade".

Essa posição é muito criticada pela doutrina, devido a possível ocorrência de uma conduta que é típica, porém lícita, podendo estar acobertada por alguma causa de exclusão da ilicitude. Nesse prisma, argumenta Reale Junior (1973, p.38): "A ilicitude não é elemento da tipicidade, mas sim do crime, posto que pode haver ações típicas não antijurídicas, pela ocorrência de causas de exclusão de antijuridicidade".

2.3.2. Conceito Quadripartido de Crime

A teoria quadripartida defende que o crime, sob o aspecto analítico, é um fato típico, antijurídico, culpável e punível. Porém, essa teoria não é muito defendida no Brasil. Com uma lição simples, Toledo (1999, p. 81) refuta essa idéia: "pena criminal, como sanção especifica do direito penal ou a possibilidade de sua aplicação, não pode ser elemento constitutivo, isto é, estar dentro do conceito de crime. Ao contrário, pressupõe um crime já aperfeiçoado". Nesta mesma corrente de pensamento, leciona Noronha (1986, p. 102): "A pena, então, não integra o delito, por ser este seu pressuposto. Realmente, tê-la como constitutiva do crime é considerar como elemento da causa o efeito".

2.3.3. Conceito Tripartido de Crime

Teoria tripartida é aquela que considera crime um fato típico, antijurídico e culpável, e divide-se em duas correntes: os finalistas e os causalistas.

A corrente causalista considera que o dolo e a culpa estão inseridos na culpabilidade, adotando a conduta do agente como um ato meramente natural.

Por outro lado, a corrente finalista, com a qual se concorda, defende que o dolo e a culpa incluem-se na conduta, pois esta deve receber um juízo de valoração. (NUCCI, 2007, p. 116)


3. Elementos do Crime

Após apontar a corrente com a qual se concorda, é necessário estudar cada elemento e subelemento constituinte do crime.

3.1. Fato Típico

O primeiro elemento do crime que deve ser analisado é o Fato Típico, que é a conduta que o legislador considera crime, e expõe detalhadamente seus elementos na lei penal incriminadora. Para Noronha (1986, p. 96), fato típico é: "a descrição da conduta humana feita pela lei e correspondente ao crime".

O Fato Típico pode possuir três constituintes principais em sua descrição: Elementos Objetivos, Subjetivos e Normativos.

Elementos Objetivos são aqueles relacionados à concretude da descrição, nas palavras de Nucci (2007, p. 150): "são os componentes do tipo passíveis de reconhecimento por juízos de realidade, isto é, captáveis pela verificação sensorial (sentidos humanos)".

Elementos Normativos são os componentes passiveis de valoração moral personalíssima, portanto, mais árduo a qualquer tipo de conceituação unânime. Como explica Greco (2007, p. 171): "Elementos Normativos são aqueles criados e traduzidos por uma norma ou que, para sua efetiva compreensão, necessitam de uma valoração por parte do intérprete", ou como lecionava Reale Junior (1973, p. 36): "Os elementos normativos [...] não são perceptíveis, mas compreensíveis através de critérios valorativos".

Os elementos subjetivos dizem respeito ao propósito, intento pessoal do agente. Para Damásio (2003, p. 272), são aqueles: "concernentes ao estado anímico ou psicológico do agente".

Inseridos no fato típico temos ainda quatro subelementos para que uma ação humana seja considerada típica: Conduta, resultado, nexo causal e tipicidade penal.

3.1.1. Conduta

Conduta é a exteriorização da vontade humana, comissiva ou omissiva, espontânea e consciente, culposa ou dolosa, direcionada a um objetivo. É indispensável que, para a existência de um crime, tenha havido uma conduta. Essa idéia se resume ao brocardo: Nullum crimen sine actione. Nesse prisma, leciona Greco (2007, p. 148):

A ação, ou conduta, compreende qualquer comportamento humano comissivo (positivo) ou omissivo (negativo), podendo ser ainda dolosa (quando o agente quer ou assume o risco de produzir o resultado) ou culposa (quando o agente infringe o seu dever de cuidado, atuando com negligência, imprudência ou imperícia).

Ação é o primeiro elemento da conduta a ser analisado. Ação ou comissão é a externação da vontade do agente produzida por meio de movimentos corpóreos. Noronha (1986, p. 95) entendia a ação como: "movimento do corpo, quer por meio dos membros locomotores, quer por meio de músculos, como se dá com a palavra e o olhar". Como exemplo de crime comissivo, podemos citar a invasão de domicilio, na modalidade de "permanecer", no qual o Código Penal em seu Artigo 150 determina: "Entrar ou permanecer, clandestinamente ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências". Por mais que a conduta descrita seja de continuar imóvel em determinado lugar, não se deve confundir com uma conduta omissiva, pois o tipo não descreve uma conduta omissiva, como por exemplo, "deixar de sair", mas sim uma conduta comissiva de permanecer, ficar, continuar em determinado local.

Se a conduta analisada não for uma ação, necessariamente será uma omissão. Caso contrário, não haverá crime. Omissão é a abstenção de qualquer movimento corpóreo por parte do agente. Na lição de Nucci (2007, p. 140): "omissão é a conduta negativa, voluntária e consciente, implicando em um não fazer, voltado a uma finalidade".

Com relação à conduta omissiva, a classificação do crime pode ser dividida em: Crime omissivo próprio ou puro e Crime omissivo impróprio ou comissivo por omissão. Crimes omissivos próprios ou puros são aqueles em que o tipo penal descreve uma conduta omissiva, e para cometê-lo, o agente deve omitir-se. Damásio (2003, p. 193), entende que: "Crimes omissivos próprios ou de pura omissão se denominam os que se perfazem com a simples abstenção da realização de um ato, independentemente de resultado posterior". Crime omissivo impróprio ou comissivo por omissão é aquele no qual o tipo penal descreve uma ação, e o agente se omite, podendo agir e estando vinculado a essa ação pelos termos do art. 13, § 2º do Código Penal, que determina:

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A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

a) Tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;

b) de outra forma assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;

c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

A conduta do agente necessariamente deve ser espontânea e consciente, logo, se a ação ou omissão não for consciente – como nos casos de embriagues completa, sonambulismo e hipnose – e/ou nem voluntária – por exemplo, por meio de coação física irresistível (vus absoluta) e atos reflexos – não existirá conduta.

Como citado acima, adota-se a posição finalista da teoria tripartida do crime. Portanto, considera-se mais correto analisar o dolo e a culpa inseridos na conduta, pois esta não deve ser vista sob um aspecto meramente naturalístico.

Dolo é a intenção de atingir um objetivo, ou assumir os riscos de que esse objetivo se concretize. Nesse prisma, o dolo pode ser dividido em: Dolo direto (teoria da vontade) e Dolo indireto ou eventual (Teoria do assentimento). A Teoria da vontade, apresentada por Carrara (apud Damásio, 2003, p. 287), defende que: "Dolo é a intenção mais ou menos perfeita de praticar um fato que se conhece contrário à lei". Para a Teoria do assentimento, como leciona Greco (2007, p. 186): "diz que atua com dolo aquele que, antevendo como possível o resultado lesivo com a pratica de sua conduta, mesmo não o querendo de forma direta, não se importa com a sua ocorrência, assumindo o risco de vir a produzi-lo".

A Culpa é a segunda modalidade de enquadramento psicológico da conduta, sendo o tipo culposo aquele no qual o agente não vislumbra o resultado, que poderia ser previsto, a partir de sua ação, por ter sido esta negligente, imprudente ou imperita. Nucci (2007, p. 192) define culpa: "é o comportamento voluntário desatencioso, voltado a um determinado objetivo, lícito ou ilícito, embora produza resultado ilícito, não desejado, mas previsível, que podia ser evitado". Existem duas modalidades de culpa: Culpa Inconsciente e Culpa Consciente. A primeira é aquela, nas palavras de Mirabete (2008, p.141): "existe quando o agente não prevê o resultado que é previsível. Não há no agente o conhecimento efetivo do perigo que sua conduta provoca para o bem jurídico alheio". A segunda, aduz Greco (2007, p. 207): "é aquela em que o agente, embora prevendo o resultado, não deixa de praticar a conduta acreditando, sinceramente, que este resultado não venha a ocorrer".

3.1.2. Resultado

Resultado é o produto final causado pela conduta, na lição de Hungria (1983, p.6): "a consequente lesão ou periclitação de um bem ou interesse jurídico penalmente tutelado". Podendo ser dividido em: resultado jurídico ou normativo, que corresponde ao dano ou perigo de lesão a um bem jurídico tutelado, como salienta Barros (2001, p.150): "resultado é a lesão ou perigo de lesão do bem jurídico tutelado pela norma penal". O resultado naturalístico é a alteração no mundo real produzida pela conduta. Nesse prisma aduz Damásio (2003, p. 244): "Segundo a concepção naturalística, resultado é a modificação do mundo exterior causada por um comportamento humano."

No ordenamento jurídico brasileiro, todos os crimes possuem resultado jurídico. Porém, nem todos apresentam resultado naturalístico, como por exemplo, os crimes de mera conduta.

3.1.3. Relação de Causalidade

Nexo causal é o liame entre a conduta do agente e o resultado. Segundo as palavras de Frederico Marques (apud Barros, 2001, p. 155):

causa do evento é a ação ou omissão que se enquadre no verbo da descrição típica. Se no núcleo do tipo se encontra um verbo que designe um modus faciendi todo peculiar e próprio, não se tem de investigar das causas anteriores dessa conduta específica, a qual nenhum relevo apresenta por cair na esfera da atipicidade.

Deve o intérprete, ao analisar o caso concreto, tentar localizar quais foram as condutas delitivas que deram causa ao resultado (crime). Porém, como salienta o autor citado, se no tipo penal estiver descrita uma ação particular do crime, as condutas antecedentes não terão tido efeito, pois não deram causa ao resultado.

3.1.4. Tipicidade Penal

A tipicidade penal é, pois, a união da tipicidade formal ou legal e da tipicidade conglobante. É imprescindível a compreensão da diferença de cada uma para o entendimento do que vem a ser a atipicidade conglobante. A tipicidade formal é a coerência da conduta praticada pelo transgressor e o tipo penal descrito na lei. Como observado por Greco (2007, p.65): "Tipicidade formal é a adequação perfeita da conduta do agente ao modelo abstrato (tipo) previsto na lei penal".

Para entender a necessidade da bifurcação do conceito de tipicidade penal citamos a lição de Zaffaroni e Pierangeli:

o juízo de tipicidade não é mero juízo de tipicidade legal, mas que exige outro passo, que é a comprovação da tipicidade conglobante, consistente na averiguação da proibição através da indagação do alcance proibitivo da norma, não considerada isoladamente, e sim conglobada na ordem normativa. A Tipicidade Conglobante é um corretivo da tipicidade legal, posto que pode excluir do âmbito do típico aquelas condutas que só aparentemente estão proibidas... (1999, p.459)

O conceito de tipicidade conglobante será abordado posteriormente no item 7, por se tratar do objeto principal desse estudo.

3.2. Antijuridicidade/Ilicitude

Antijuridicidade é a situação que une o aspecto material ao formal do crime, ou seja, lesa ou expõe a perigo, injustificadamente, um bem jurídico, e encontra-se tipificada na lei. Para dizer que uma conduta é antijurídica, o fato praticado pelo agente deve ir contra a ordem normativa, e não estar acobertado por nenhuma excludente de ilicitude. Nessa perspectiva preleciona Mirabete (2008, p. 102): "a tipicidade é o indício da antijuridicidade do fato. Praticado um fato típico, presume-se também sua antijuridicidade, presunção que somente cessa diante da existência de uma causa que a exclua". São causas de exclusão da antijuridicidade aquelas dispostas nos artigos 24 e 25 do Código Penal:

Art. 24: "Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se".

Art. 25: "Entende-se em legítima quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem". (Vade Mecum, 2009, p. 541)

Ainda nas palavras de Mirabete (2008, p. 167): "A antijuridicidade é a contradição entre uma conduta e o ordenamento jurídico". Hungria (1983, p. 14) entendia que para uma conduta ser ilícita deve: "estar positivamente em contradição com a ordem jurídica".

3.2.1. Relação entre Fato Típico e Antijuridicidade

O Fato Típico e a Antijuridicidade não devem ser confundidos ou estudados como se fossem apenas um único tópico. Porém, existe íntima relação entre ambos. A antijuridicidade manifesta-se, primeiramente, na constatação da adequação da conduta do agente ao tipo penal. Dessa forma, leciona Reale Junior (1973, p. 35): "a antijuridicidade se manifesta indiciariamente na conformidade do fato ao tipo".

A antijuridicidade encontra-se intrínseca no tipo, entretanto, aquela não é parte constituinte desta. A Intentio legis é demonstrar o caráter de reprovação e antinormatividade da conduta descrita no tipo. Contudo, esse caráter deve ser analisado na falta de justificação da conduta antinormativa do agente.

Como lecionam Zaffaroni e Pierangeli:

A tipicidade penal implica a contrariedade com a ordem normativa, mas não implica a antijuridicidade (a contrariedade com a ordem jurídica), porque pode haver um causa de justificação (um preceito permissivo) que ampare a conduta.

A antijuridicidade pressupõe a antinormatividade, mas não é suficiente a antinormatividade para configurar a antijuridicidade, pois a antinormatividade pode ser neutralizada por um preceito permissivo. (1999, p. 460)

3.3. Culpabilidade

Hungria (1983, p.17) definia a culpabilidade como: "uma relação subjetiva ou de causalidade psíquica vinculando o fato ao agente", e completava dizendo que é: "a capacidade de autodeterminação e de entendimento ético-jurídico, referido ao homo medius".

Ao analisar a culpabilidade, encontra-se um elemento essencialmente psicológico e determinável pela personalidade do agente, não é, pois, um elemento explícito no tipo incriminador, sendo previsto somente em lei suas causas de exclusão.

São elementos constitutivos da culpabilidade: Imputabilidade, Potencial consciência da ilicitude do fato e Inexigibilidade de conduta diversa.

Imputabilidade, na visão de Zaffaroni e Pierangeli (apud MIRABETE, 2008 p. 193) é: "a capacidade de entender, diante de suas condições psíquicas, a antijuridicidade de sua conduta e de adequar essa conduta à sua compreensão". São excludentes da imputabilidade: Doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, Menoridade penal e Embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, respectivamente, Art. 26, 27 e 28, § 1º do Código Penal.

A Potencial Consciência da Ilicitude do fato é explicada por Hungria (1983, p. 382), que aponta ser: "o conhecimento ou a possibilidade de conhecimento da injuricidade da ação que se pratica, lesiva de um interesse penalmente tutelado". As excludentes da potencial consciência da ilicitude do fato são: Descriminantes putativas (art. 20, § 1º) e Erro sobre a ilicitude do fato (art. 21), todos do Código Penal.

Inexigibilidade de Conduta Diversa é a situação na qual a conduta cometida pelo agente não seria socialmente condenável por nenhuma outra pessoa. Nessa perspectiva Greco (2007, p. 416) aduz: "nas condições em que se encontrava o agente, não se podia exigir dele comportamento diverso". As únicas hipóteses previstas no código para a exclusão da inexigibilidade de conduta diversa são Obediência hierárquica e Coação Irresistível, art. 22 do Código Penal, que diz: "Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem".

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Sobre o autor
Daniel de Souza Exner Godoy

Acadêmico do curso de Direito da Unisal de Lorena-SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GODOY, Daniel Souza Exner. Atipicidade conglobante no estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2499, 5 mai. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14801. Acesso em: 29 mar. 2024.

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Trabalho elaborado sob a orientação do Prof. Eduardo Luiz Santos Cabette.

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