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Quem pode ser amigo da Corte?

30/07/2009 às 00:00
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O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), não permitiu que o Grupo Otimismo de Apoio ao Portador de Hepatite C ingressasse como amicus curie em processo que discute a obrigatoriedade ou não de o Estado fornecer medicamento de alto custo não incluído na lista do SUS (Sistema único de Saúde).

O amigo da corte, em latim amicus curiae, é um terceiro que intervém no processo para oferecer à Corte sua perspectiva acerca da questão constitucional controvertida, informações técnicas acerca de questões complexas cujo domínio ultrapasse o campo legal ou, ainda, defender os interesses dos grupos por ele representados, no caso de serem direta ou indiretamente afetados pela decisão a ser tomada.

Ao todo, o ministro Marco Aurélio permitiu o ingresso de seis entidades no Recurso Extraordinário (RE) n. 566.471, no qual o governo do Rio Grande do Norte contesta decisão da 4ª Vara da Fazenda Pública de Natal que o obrigou a fornecer o medicamento a uma paciente. Outras sete entidades, incluindo o Grupo Otimismo de Apoio ao Portador de Hepatite C, não foram admitidas.

Ao negar o pedido do Grupo Otimismo, o ministro Marco Aurélio explicou "que já se conta, no processo, com manifestações suficientes ao esclarecimento da matéria". Segundo ele, "a admissão, sem limites, de terceiros, acaba por prejudicar a tramitação do processo, repercutindo no julgamento".

As seguintes entidades participarão como amici curiae no RE: o Instituto de Bioética, Direito Humanos e Gênero (Anis), a Defensoria Pública da União, o estado do Rio de Janeiro, o estado de São Paulo, a Associação Brasileira de Assistência à Mucoviscidose (Abram) e o Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

Além do Grupo Otimismo, não foram admitidos o Grupo de Pacientes Portadores de Hipertensão Arterial Pulmonar dos Hospitais Públicos do Rio de Janeiro, o Instituto Canguru – Grupo Especializado em Doenças Metabólicas, a Associação Paulista dos Familiares e Amigos dos Portadores de Mucopolissacaridoses, a Associação dos Familiares e Amigos dos Portadores de Doenças Graves, e os municípios de Boa Vista e do Rio de Janeiro.

São muitas as questões subjacentes à decisão que negou a participação dos sete amici curiae: quem pode ser amigo da corte? Nos julgamentos colegiados, o amicus curiae contribui para o esclarecimento do relator ou de todos os ministros que participarão do julgamento? O amicus curiae cumpre apenas um papel informacional? Se o plenário do STF, na ADI n. 4071, decidiu que a inclusão do processo em pauta marca o limite final para o ajuizamento do pedido de intervenção, qual a razoabilidade de se permitir o ingresso de uns e se negar o de outros dentro do período que antecede a inclusão do processo em pauta? E a isonomia processual, leva o direito de intervir aquele que primeiro pedir? Qual o limite da discricionariedade do relator ao escolher quais amici curiae ele deixará intervir no processo? Quanto mais informação melhor ou o elevado número de amicus curiae pode ser fundamento para o indeferimento do pedido de intervenção no STF, onde já houve processo que contou com a participação de 71 amici [01]?

No gráfico abaixo temos o número de pedidos de intervenção deferidos por ministro do STF:

Gráfico – Amicus Curiae deferidos por Ministro do STF

  1. ADI n. 2.999, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 15.5.2009.
  2. Preocupações em esse potencial desequilíbrio foram compartilhadas por KRISLOV, Samuel. The Amicus curiae Brief: from friendship to advocacy. The Yale Law Journal, vol. 72, p. 695-721, 1963; O’BRIEN, Zeldine. The Court Make a New Friend? Amicus curiae Jurisdiction in Ireland. Trinity College Law Review, vol. 7, p. 5-28, 2004; SCHACHTER, Madeleine. The Utility of Pro Bono Representation of U.S.-Based Amicus curiae and Multi-National Courts as a Means of Advancing The Public Interest. Fordham International Law Journal, vol. 28, p. 88-144, 2005.
  3. KRISLOV, Samuel. The amicus curiae briefs: from friendship to advocacy. Yale Law Journal, nº 72, 1963, p. 699.
  4. O principio da vedação de supressão de instâncias articula-se com o oferecimento, pelo amicus, de argumentos que não tenham sido apreciados pelas instâncias originárias e com o instituto da preclusão e o oferecimento de informações novas pelos amici já na fase recursal extraordinária.
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Sobre a autora
Damares Medina

Advogada, mestre em Direito e professora do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEDINA, Damares. Quem pode ser amigo da Corte?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2220, 30 jul. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13248. Acesso em: 23 abr. 2024.

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