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O tribunal do júri e suas críticas

23/10/2017 às 21:09
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O presente artigo aborda a indagação se o tribunal do Júri, sendo juízo popular, traz mais vantagens ou desvantagens em relação ao julgamento proferido pelo juízo técnico ou juízo togado.

Resumo: O presente artigo aborda a indagação se o tribunal do Júri, sendo juízo popular, traz mais vantagens ou desvantagens em relação ao julgamento proferido pelo juízo técnico ou juízo togado. Tem como objetivo estudar os pontos positivos e negativos do instituto, conhecendo qual irá se sobrepor, no ponto de vista doutrinário, por meio de suas obras. Aborda, assim, sobre o dilema que rodeia o Tribunal do Júri de bem julgar tanto quanto ou melhor que o juízo togado. Referida pesquisa científica pode oferecer um maior conhecimento e credibilidade ao Tribunal do Júri.

Palavras-chave: Tribunal. Júri. Juiz. Jurados.


Introdução

O debate, por parte da doutrina, busca uma resposta mais consistente sobre o mister de o júri bem julgar uma pessoa, igual ou melhor ainda, que o juiz togado.

Esse debate passa por vários argumentos, seja contra ou a favor, fundamentados por doutrinadores estudiosos do assunto. Busca-se, nesse capitulo, aprofundar ainda mais essa polêmica, estudando argumentos defendidos por diversos doutrinadores do assunto em questão.

Isso se fez necessário pela ininterrupta dúvida que o tribunal do júri passa para algumas pessoas. Dúvidas estas no sentido de que o júri não possui conhecimento técnico para fazer um bom julgamento; de que o júri é facilmente manipulado e suscetível à influência de alguma autoridade ou ao réu.

Por outro lado, os que defendem, dizem sobre os aspectos positivos do júri, juntamente com o benefício que este traz à sociedade.

Ao longo deste artigo destaca-se essa discussão, procurando analisar ambos os lados, expondo suas ideias e argumentos.


Desenvolvimento

Talvez, sua essência ou natureza seja esta mesmo. A discussão de ideias como sua maior virtude, pois sua existência almeja o confronto de diferentes ideias acerca do julgamento de uma pessoa. Como Machado bem diz: [...] “ e talvez a sua maior virtude, é exatamente a realização do direito por meio do debate, do confronto dialético das ideias”. (MACHADO, 2014, p. 283)

O júri é talvez o órgão judicial que desperta as maiores polêmicas. São igualmente numerosos os seus defensores e adversários, ambos os lados com argumentos respeitáveis, porém nenhum deles com a perspectiva de triunfo sobre o outro. A controvérsia segue animada, é e curioso que até o momento não se vislumbra a menor possibilidade de extinção nem da instituição do júri nem da polêmica que o acompanha desde tempos imemoriais. Parece mesmo que a discussão e a polêmica compõem a própria essência do júri, já que a finalidade dessa instituição, e talvez a sua maior virtude, é exatamente a realização do direito por meio do debate, do confronto dialético das ideias. (Machado, 2014, p. 283).

Uma instituição que contempla a discussão e o debate de diferentes ideias, torna-se um tanto quanto complexa e passível de variadas interpretações, pois cada um terá um ponto de vista acerca da instituição.

Para alguns, essa natureza que contempla a discussão de ideia é uma virtude, já para outros pode não ser, por se tratar de um órgão judiciário, que em tese deveria ser imperativo, coercitivo e rígido.

Lopes, defendendo posição contrária ao Tribunal do Júri, diz ter mais vantagens o juízo togado ao juízo popular.

“O conhecimento jurídico, com a mais absoluta certeza, é fundamental para que se possa fazer um julgamento mais acertado ou no mínimo menos falho. A margem de erro com certeza é potencialmente maior no tribunal do popular (o que não quer dizer que os magistrados não erram), mas é como comparar um obstetra a uma parteira”. (LOPES, 2005, p. 145-146).

O doutrinador entende que o conhecimento jurídico é fundamental para que seja realizado um julgamento mais seguro, com menos erros. Erro tanto humano quanto processual.

Faz ainda uma comparação de um médico obstetra com uma parteira, onde o médico detém o conhecimento técnico, estudou para isto. Já a parteira detém um conhecimento não técnico, tem seu conhecimento através da experiência da vida e dos costumes.

Passando para o Tribunal do Júri, o juiz togado seria o médico e os jurados seriam a parteira. Assim, como o médico, o juiz possui o conhecimento técnico jurídico e o júri possui o conhecimento adquirido dos costumes e da experiência de vida. O que é extremamente subjetivo, pois cada um vive de uma maneira, sendo assim cada um possui experiências de vida diferentes, por óbvio.

Não quer dizer que os juízes togados não vivem cada um da sua maneira e não tenham experiências de vida única e diferentes uns dos outros. Logicamente que sim, porém não é a experiência de vida nem os costumes individuais e subjetivos que são levados em consideração para julgar alguém, é o conhecimento técnico, que através deste irá formar seu convencimento sobre o caso concreto.

Daí o porquê Lopes (2005, p.145-146) diz que “o conhecimento jurídico é fundamental para que se possa fazer um julgamento mais acertado ou no mínimo menos falho. A margem de erro com certeza é potencialmente maior no tribunal do popular” [...].

José Frederico Marques também se posiciona com argumentos contra a instituição do Tribunal do Júri. Elenca argumentos contrários à instituição, com intuito de demonstrar os pontos fracos do Tribunal do júri.

Como exemplo:

[...] (a) de ter perdido o sentido político depois que o judiciário adquiriu independência em face do executivo: (b) de ser muito acessível a injunções e cabalas; (c) de possibilitar a subserviência dos jurados; (d) de assemelhar-se a um tribunal de exceção como se fosse o outro polo da “justiça sem lei”; (e) de julgar delitos cruéis e revoltantes com muita complacência; (f) e de não ter nenhum conhecimento especializado para bem exercer a função de julgar.

(Marques, José Frederico. A instituição do júri., p. 6, apud, Machado 2014, p. 283-284).

Ora, certo argumento não tem mais cabimento, como a exemplo do que fala que o Tribunal do Júri perdeu o sentido político depois que o judiciário adquiriu independência em face do executivo.

Certamente o propósito da separação dos poderes fora para delimitar uma competência entre os mesmos, que de uma forma harmoniosa sejam independentes entre si.

Principalmente o poder judiciário não pode estar vinculado a nenhum outro poder, muito menos que seja submisso a ele. A busca pela justiça deve ser soberana.

A crítica mais comum encontrada é também a crítica que o autor usa em sua obra, de que o júri não possui nenhum conhecimento especializado para bem exercer a função de julgar.

Outro autor que também engrossa essa crítica, mas que acredita na importância e reconhece a essência democrática da instituição do Júri, é Magalhães Noronha.

Afirma que seu processo é moroso, que os jurados não contam com as mesmas garantias dos juízes togados e são suscetíveis a influências e pressões dos poderosos de plantão e, ainda, que os juízes leigos não têm nenhuma especialização para o mister de aplicar o direito. (Noronha, p. 317. apud, Machado 2014, p. 283-284).

Assim como José Frederico Marques, Magalhães Noronha também entende que a falta de conhecimento técnico é empecilho para um julgamento correto.

Em posição neutra, apresenta-se Eugênio Pacelli, numa obra bem mais atual, entende que o Júri é uma das mais democráticas instituições do Poder Judiciário, como podemos conferir a seguir:

Costuma-se afirmar que o Tribunal do júri seria uma das mais democráticas instituições do Poder Judiciário, sobretudo de submeter o homem ao julgamento de seus pares e não da justiça togada. É dizer: aplicar-se-ia o Direito segundo a sua compreensão popular e não segundo a técnica dos Tribunais. (Pacelli, 2014, p. 719).

Ainda conclui dizendo: “Nesse sentido, de criação de justiça fora dos limites do Direito positivo, o Tribunal do Júri é mesmo democrático”.

Porém o mesmo doutrinador contrapõe-se, de modo proposital, pois entende também que nem sempre a democracia estará a favor do bem comum.

Mas não se pode perder de vista que nem sempre a democracia esteve e estará a serviço do bem comum, ao menos quando aferida simplesmente pelo critério da maioria. A história está repleta de exemplos de eleições (legítimas) de ditadores inteiramente descompromissados com a causa dos direitos humanos. (Pacelli 2014, p. 719).

“E o Tribunal, no que tem, então, de democrático, tem também, ou melhor, pode ter também, de arbitrário”. Pacelli (2014, p. 719).

Entende ter o júri um lado positivo e um lado negativo, concluindo seu pensamento:

E isso ocorre em razão da inexistência do dever de motivação dos julgados. A resposta de quesitação pelo Conselho não exige qualquer fundamentação acerca da opção, permitindo que o jurado firme seu convencimento segundo lhe pareça comprovada ou revelada (aqui no sentido metafísico) a verdade. E, convenhamos, esse realmente é um risco de grandes proporções. Preconceitos, ideias preconcebidas e toda sorte de intolerância podem emergir no julgamento em plenário, tudo a depender da eficiência retórica dos falantes (ministério Público, assistente de acusação e defesa).

Enfim, bom ou ruim, o Júri tem previsão constitucional. (Pacelli, 2014, p. 719).

Pacelli defende uma tese plausível, pois em seu ponto de vista, o júri tem um lado positivo que é a participação da população, ou seja, a democracia, porém por outro lado apresenta um ponto negativo ao passo que o réu está sujeito a preconceitos, ideias preconcebidas e toda a sorte de intolerância que podem emergir no ato do julgamento, tudo isso dependendo da eficiência retórica, do modo de convencimento usado pelo Ministério Público, assistente de acusação e pela defesa do réu para convencer os jurados. Para ele, essa sujeição representa um risco para o bom desempenho do julgamento.

Em contramão, o doutrinador Antônio Alberto Machado, entende que algumas críticas negativas ao Tribunal do Júri encontram-se ultrapassadas, como a crítica de José Frederico Marques em sua obra A instituição do Júri e Noronha, no seu Curso de direito processual penal, já citados nesse capítulo, não tem mais a força que teve nas décadas passadas e ainda mais, não se viu mais alguma discussão nesse sentido, recentemente.

Apesar de o júri merecer muitas outras críticas, é inegável que os argumentos desses dois importantes mestres do processo penal não têm mais a atualidade que poderiam ter tido outrora. Os grandes males da justiça penal hoje não têm qualquer relação com o funcionamento do Tribunal do Júri; não estão nem de longe relacionados ás possíveis deficiências dessa instituição.

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Aliás, já faz tempo que não se vê uma acusação mais veemente ao Tribunal do Júri. Ao contrário, o que se tem visto mais amiúde são as defesas dessa instituição, a proliferação de obras e manuais que lhe dispensam grande consideração e tratamento jurídico detalhado, a realização de seminários e até congressos a respeito do tema etc. De mais a mais, as apontadas deficiências dos juízes leigos, a falta de especialização, a suscetibilidade a pressões dos poderosos e a morosidade, além de não serem uma exclusividade do Tribunal do Júri, são problemas que hoje já não têm mais aquela mesma dimensão de outros tempos; a evolução cultural, política, social e econômica de amplas camadas de sociedade tem permitido a composição do Tribunal do Júri com jurados altamente qualificados. Observe-se que mesmo a alegada falta de especialização no que se refere o conhecimento do direito já não é tão saliente, e nem a especialização tecnicista dos juízes togados, sem formação humanística e geral, pode ser tida como uma virtude inquestionável. Até mesmo a leniência1 que antigamente se atribuía aos jurados não é mais uma acusação procedente; o tribunal leigo, sobretudo em face da criminalidade crescente nas grandes cidades, tem decidido muitas vezes com acentuado rigor, sem qualquer tipo de receio ou subserviência2. (Machado 2014, p. 283-284).

Machado percebeu que houve um significativo aumento de apoio ao Tribunal do Júri, com a produção de obras, seminários e congressos.

Combatendo a argumentação dos doutrinares que fazem críticas contra o Júri, Machado argumenta a respeito da crítica mais apontada por eles, dizendo que a deficiência dos juízes leigos pela falta de especialização é um problema que já não tem mais a dimensão que tivera outros tempos, pois as evoluções culturais, políticas, sociais e econômicas de várias camadas da sociedade têm qualificado os jurados para a composição do Tribunal do Júri.

Ao dizer que “a alegada falta de especialização no que se refere o conhecimento do direito já não é tão saliente, e nem a especialização tecnicista dos juízes togado, sem formação humanística e geral, pode ser tida como uma virtude inquestionável, ” salienta nossa atenção, pois a falta de conhecimento de direito dos jurados, já não é tão grande como era e a formação técnica dos juízes pode não ser tida como uma virtude, porque falta a formação humanística e geral. Em outras palavras, o júri complementa a formação do juiz no quesito humanístico e o juiz togado complementa a formação do juízo leigo.

Ao rebater a crítica de que o júri é leniente, afirma o autor que, com a crescente violência principalmente nas grandes cidades, o júri tem efetuado com rigor seus julgamentos, sem qualquer tipo de receio ou subserviência.

Menciona em sua obra, que os partidários do Tribunal do Júri, sempre destaca sua essência democrática, já que se trata de um órgão integrado pelas pessoas do povo, pois a população pode participar efetivamente da distribuição da justiça. (Machado, 2014, p. 284).

Machado engrossa sua tese argumentando que a instituição que foi criada a séculos, ainda persiste até hoje, passando por várias gerações e grandes transformações da sociedade, como menciona em sua obra:

No afã de justificar a permanência da instituição, costuma-se lembrar a sua origem democrática na Inglaterra no século XIII, bem como o assento desse tribunal na imensa maioria das Constituições modernas e a destacada longevidade com que o júri tem atravessado os séculos, sobrevivendo até hoje mesmo em face das grandes transformações por que têm passado as chamadas sociedades pós-modernas em todo o mundo ocidental. Entusiasmados com as virtudes da instituição, alguns partidários do júri têm até mesmo propugnado pela ampliação de sua competência, já que ultimamente os jurados têm decidido com o rigor e a correção que muitos esperam da justiça criminal. (Machado 2014, p. 284-285).

Lembra que o júri sempre esteve entrelaçado ao direito liberal e democrático, fruto de uma das várias reivindicações políticas que foi adquirido numa longa trajetória de luta ao longo do tempo.

Seja como for, a verdade é que a instituição do júri, historicamente, sempre esteve vinculada aos contextos políticos de inspiração liberal e democrática; foi um dos primeiros instrumentos de reivindicação política e de defesa da liberdade do indivíduo no contexto de uma longa trajetória de luta pela afirmação desse direito fundamental. É mesmo inegável a vinculação do júri aos valores políticos do liberalismo e à consolidação das instituições democráticas no mundo ocidental. (Machado 2014, p. 285).

Ao encerrar sua explanação, comenta sobre o fim do Tribunal do Júri:

Embora polêmico, defendido e detratado, uma coisa é certa: parece não haver nenhuma perspectiva, pelo menos em curto prazo, de se abolir a instituição do júri. Nos países de tradição democrática, algumas garantias constitucionais são mesmo intocáveis, como são os casos do habeas corpus e do Tribunal do Júri. Aliás, não é por acaso que ambos têm origem justamente na Magna Charta de João Sem Terra, cujo documento inaugura uma tradição histórica de defesa da liberdade individual pelo que a Inglaterra ficou conhecida como a pátria da liberdade. (Machado 2014, p. 285).

Machado faz a comparação do Tribunal do Júri com o habeas corpus, pois ambos é instrumento de direito e garantia à liberdade do indivíduo, cuja origem se deram na Magna Charta de João Sem Terra. Um marco histórico de grande importância para a humanidade.

Outro doutrinador partidário do Tribunal do Júri é Fernando da Costa Tourinho Filho.

Tourinho diz ser, o Tribunal do Júri, um Instituto de garantia ao direito de liberdade, sendo esse seu traço fundamental. Como podemos conferir:

Por primeiro é de notar que, pela sua posição topográfica, trata-se de instituição destinada a tutelar mais ainda o direito de liberdade. Esse seu traço fundamental. Certo que o júri pode condenar. Nem por isso ele deixa de ser uma garantia ao direito de liberdade, visto tratar-se de julgamento de consciência. Um julgamento feito com sensibilidade é mais humano do que aquele em que o julgador não pode afastar-se do texto legal. Se a instituição do júri está no capítulo destinado aos direitos e garantias fundamentais do homem, indaga-se: é direito ou garantia? Para nós é uma garantia. Garantia de que nos crimes dolosos contra a vida (que qualquer pessoa pode cometer, dependendo das circunstâncias) o réu será julgado não pelos juízes profissionais, e sim pelo povo, que decide de acordo com os costumes, com a experiência dada pela vida. Ademais, como se disse, “O juiz togado tem um defeito que o jurado não tem, o calo profissional, que na rotina, pode desanimá-lo, endurecê-lo, com o risco de, ao certo tempo, já não o comoverem as grandes dificuldades da complexa criatura humana e, assim, em decorrência, faltar-lhe o equilíbrio essencial...” (Edmundo Oliveira, O Tribunal do júri na administração da justiça criminal nos Estados Unidos, apud Rogério Lauria Tucci, Tribunal do júri, cit., p. 105, apud, Tourinho Filho 2014, p. 398).

Para ele, o Tribunal do Júri significa maior garantia ao direito de liberdade, pois sendo julgado pelas pessoas da sociedade, o réu pode contar com o valor sentimental, costumes e experiência de vida dos jurados, o que, segundo o autor, o juiz não possui, ou melhor, não poderá levar seu sentimento em consideração para julgar alguém.

Quando se diz que o traço marcante do Júri consiste em ser uma garantia de tutela maior do direito de liberdade, e aí está o seu traço fundamental, o que se quer dizer, a nosso juízo, é que, pelo fato de muitas vezes a lei estar dissociada do pensamento do povo, ficando o julgamento nas mãos da sociedade, representada por sete de seus membros, longe das peias da lei, de precedentes, súmulas e doutrinas, haverá mais garantia para o direito de liberdade. Conhecendo os costumes do povo, sabendo o que sente em determinadas situações, das conversas de rua, que nem sempre, ou quase nunca chegam aos autos, das circunstâncias que precederam o fato delituoso – a vida pregressa do cidadão, a natureza do crime (o aborto p. ex., é defendido por considerável contingente da sociedade, mesmo entre católicos, e em alguns países devidamente legalizado; o infanticídio é crime praticado por mães solteiras, num ato de extremo desespero), os jurados, mais soltos, mais libertos, sem a obrigação de dizerem como e por que votaram desta ou daquela maneira, estando assim mais à vontade, justificam a conduta do(a) acusado(a), dando asas ao seu coração, aos seus sentimentos. Julgam com sensibilidade. (Tourinho Filho 2014, p. 398-399).

O doutrinador demonstra a preocupação de que nem sempre a lei está de acordo com o pensamento do povo, nem sempre está a serviço do bem comum, o que garante ao júri um remédio quanto a isso. No júri é diretamente o povo que vai dar seu veredito, sem estar atrelado nem às leis nem a ninguém, pois é soberano.

E continua sua argumentação:

Quantas pessoas que gozam de foro privativo não preferem o julgamento popular ao técnico? Por acaso tudo isso não representa uma garantia maior ao direito de liberdade? Pode até haver condenação, mas, se esta for injusta, caberá o recurso de apelo e, se mantida a decisão do Júri, ainda restará o juízo revidendo. Nem por isso a proteção ao direito de liberdade ficou mais acanhada, apoucada. Poderia o juiz togado, se pudesse julgar um homicídio doloso, fazê-lo fora das hipóteses elencadas no art. 386. do CPP? Poderia julgar sem fundamentar? Compreenderia por acaso o drama da infeliz que interrompeu uma gravidez não desejada? Poderia até absolvê-la, mas em segunda instância, de regra, castraria seu sentimento piedoso. Os jurados são leigos na “subsunção da conduta no tipo penal”, são leigos na dosimetria da pena, mas sabem distinguir o que é certo e o que é errado, sabem dizer, num clima de empatia, se adotaria a mesma conduta do réu. Se por acaso o constituinte quisesse um julgamento técnico, por óbvio não teria instituído e mantido o Júri. Este compreende a sociedade em que vive. O juiz togado não. O togado compreende a lei, e dela não pode afastar-se. Embora sabendo que sua conduta seria a mesma do réu, ficaria acorrentado, preso às provas dos autos, ao texto da lei, podendo inclusive, se ousar agir de outra maneira, responder por prevaricação. (Tourinho Filho, 2014, p. 399).

No que tange ao risco de o júri cometer uma injustiça ou um erro, que pudesse prejudicar o réu, há meios legais que possa averiguar tal situação, no caso o recurso de apelação e o juízo revidendo, (vide página 32). Porém sempre respeitando o Princípio Constitucional da soberania do veredito.

Há considerável preocupação com o risco de injustiça ou erro, mas o legislador prevê meios de assegurar ao Instituto do Júri maior segurança jurídica por meio dos recursos. Portanto o réu não ficará, como muitos pensam, á mercê dos jurados. Assim sendo, não tem o que se falar em restrição ao direito de liberdade.

Segundo o autor, o juiz sendo um aplicador do direito e estando atrelado ás leis, se pudesse julgar um crime contra a vida, não levaria em conta o drama do réu. Já em segunda instância, que é um julgamento mais amplo de visão geral, poderia sim levar em consideração o drama sofrido pelo réu e proferir sentença a seu favor.

Tourinho rebate a tese dos doutrinadores contra júri, de que não possuem conhecimento jurídico para julgar.

Diz o autor que os jurados são leigos no que se refere o ilícito penal, na dosagem da pena, mas o que é certo e o que é errado eles sabem, saberiam se colocar no lugar do réu, para imaginar se adotariam a mesma conduta adotada pelo réu no ato do crime.

O Tribunal do Júri é uma vontade do legislador constituinte, pois se não fosse não teria constituído e o mantido no Brasil.

Julgar com o sentimento, “pode ir além do afirmado e provado”, é uma coisa, julgar nos estritos termos da lei, dentro no aforismo quod non este in actis non est in hoc mundo, é coisa diversa. Julgando de acordo com sua íntima convicção, sem ter obrigação de dar satisfação a quem que seja, a não ser a sua própria consciência, sabendo que a sua decisão é soberana, visto provir do povo, o Tribunal do júri ampara mais ainda o direito de liberdade. (Tourinho Filho 2014, p. 399-400).

O próprio Supremo Tribunal Federal, em 14-7-1932, decidiu: “O Júri, Juiz de consciência, que está no meio do povo, conhece melhor que ninguém as circunstâncias do fato e as condições dos protagonistas” (Ruy Barbosa, O Júri sob todos aspectos, com introdução de Roberto Lyra, Rio de Janeiro, Ed. Nacional, 1950, p. 15).

E em 15 de agosto do mesmo ano, a Excelsa Corte voltou à carga: ”O Júri decide por sua livre e natural convicção. Não é o jurado obrigado a decidir pelas provas do processo, contra os impulsos da consciência” (ibidem).

Tal entendimento do STF, por mais que proferido á muitas décadas passadas, não perdeu seu sentido, podendo ser admitido até hoje.

Tourinho encerra sua defesa reafirmando:

Certo que os juízes togados também são uma garantia para a defesa do direito de liberdade, mas eles não podem decidir senão em consonância com as provas dos autos. Os jurados julgam de acordo com a sua consciência. Julgam com sensibilidade. Muitas e muitas vezes os Juízes entendem que o réu é inocente, ou culpado, mas não encontram provas nos autos para proferir um decreto absolutório, ou condenatório. Os jurados simplesmente absolvem ou condenam. Eles são leigos, dizem. Leigos em quê? Em Direito? Que seja. Mas sabem distinguir o que é certo e o que é errado, o que justo e o que é injusto. Ruy dizia que “o jurado para julgam um criminoso, como homem, como coassociado, como cidadão, não precisa mais do que se exige do eleitor” (O Jury sob todos os aspectos, cit., p. 25). E isso basta. Para conhecer a técnica da subsunção da conduta punível ao tipo penal há os juízes profissionais... E se a Constituição prevê que nos crimes dolosos contra a vida o julgamento fica afeto ao Tribunal popular, por óbvio foi intenção do constituinte dispensar a esses crimes um julgamento de consciência. Tutela-se mais ainda o direito de liberdade. Como dizia Roberto Lyra na introdução à obra de Ruy: ”O jurado não é obrigado, como o juiz, a decidir pelas provas do processo, contra os impulsos da consciência”. (O jury sob todos os aspectos, cit., p. 15, apud, Tourinho Filho, 2014, p. 400).

No seu desfecho, o autor diz que no julgamento singular o juiz fica preso as leis e de acordo com as provas dos autos. Já os jurados julgam de acordo com sua consciência e sua sensibilidade.

Como os jurados não são técnicos, não conhecem o Direito e seus procedimentos, somente faz o julgamento de consciência, pois sabem definir o que é certo e o que é errado, no entendimento do autor. E para a aplicação do direito existem os juízes técnicos, togados. Um complementa o outro.


Conclusão

Analisando o conteúdo elaborado neste presente trabalho acadêmico, com base no que foi pesquisado e estudado, pode-se concluir que há muito tempo não se vê uma crítica plausível contra o tribunal do Júri, de modo que a crítica e argumentação fossem fortes o bastante para um debate.

Assim, embora alguma crítica exista e a discussão ocorra, os argumentos não conseguem, aparentemente, derrubar o júri.

Os bens jurídicos tutelados nos crimes que vão a Júri são, sem dúvida, os mais importantes dispostos na legislação penal. Se referida proteção fosse atribuída ao magistrado, seria tirar uma responsabilidade da sociedade de decidir seus próprios conflitos.

O constituinte quis assegurar um julgamento mais moral, adotando o Tribunal do Júri na Constituição Brasileira. Um julgamento de consciência feito pelos parâmetros da sociedade.

Se o constituinte colocou o júri para julgar um dos crimes que mais afeta a sociedade, os quais sejam os crimes dolosos contra à vida, seria esse o entendimento dele, de que a sociedade sente na pele suas próprias necessidades e de algo que a prejudique.

A crítica de que o julgamento fica prejudicado pelo fato de os jurados serem leigos, no entanto, não seria essa uma hipótese que fizesse do júri uma desvantagem para a justiça.

Os jurados são leigos no enquadramento da conduta no tipo penal, na dosimetria da pena, mas para isso existe o juiz togado, por esse motivo ele participa do júri, agora, para o puro julgamento, não se exigem mais do que o sentimento de justiça que cada um carrega consigo. Mesmo que a definição de justiça e prática dela seja uma coisa difícil.

O júri não julga apenas o crime, mas também seus entornos, seus arredores, como a conduta do acusado e porventura o seu drama, como nos casos de infanticídio, aborto. Casos esses bem complexos, que é necessário mais do que a lei fria para o cumprimento de uma justiça verdadeira. É aí que entra a importância do julgamento de consciência, julgar com sentimento, com humanismo.

Tourinho, como já citado neste artigo, fala que o traço marcante do Júri consiste em ser uma garantia de tutela maior do direito de liberdade, e aí está o seu traço fundamental. Porém tomei o direito de discordar parcialmente dessa argumentação.

Não que o júri não tutela maior garantia de liberdade, por este estar desvinculado com as leis, que nem sempre atendem os interesses da sociedade, concordo! Contudo, pelo ponto de vista adquirido por meio dessa pesquisa, fica claro que seu traço mais importante seja a participação da sociedade na aplicação da justiça. Quem melhor do que a sociedade para julgar ela mesma?


Referências

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal, 22º ed., editora Saraiva, 2015.

LOPES, Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal: (Fundamentos da Instrumentalidade Garantista). 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

MACHADO, Antônio Alberto. Curso de Processo Penal, 6º ed., editora Atlas, 2014.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal, 12º ed., São Paulo, editora Forense, 2015.

NUCCI, Tribunal do Júri, 6º ed. São Paulo, editora Forense, 2015.

PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal, 18º ed., editora Atlas, 2014.

TOURINHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal, 16º ed., editora Saraiva, 2015.

TOURINHO, Fernando da Costa. Prática de Processo Penal, 35º ed., editora Saraiva, 2014.


The jury's court and its criticisms

Abstract: The present article addresses the question whether the jury's court, being a popular court, brings more advantages or disadvantages in relation to the judgment rendered by the technical judgment or legal judgment. Its objective is to study the positive and negative aspects of the institute, knowing which one will overlap, in the doctrinal point of view, through its works. It deals thus with the dilemma surrounding the jury's Court of judging as well as or better than the tried judgment. Such scientific research may offer greater knowledge and credibility to the Jury's Court.

Key words: Court. Jury. Judge. Juries.

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Sobre o autor
Jeferson de Souza Rodrigues

Estudante de Direito.

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