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26/05/2004 às 00:00
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Ministério Público: legitimidade para propositura da ação

O ato ímprobo cometido pelo agente, além das cominações cíveis, também será punido de acordo com as normas legais previstas na esfera administrativa, cível e penal, conforme o caso, independentemente do ressarcimento ao erário do dano que porventura vier a causar o agente. Também, prevê a Lei, que a sua aplicação independe da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público.

No crime de improbidade administrativa, o sujeito ativo é o agente público, figurando a Administração como sujeito passivo. No direito processual esta situação se inverte, ou seja, a Administração Pública passa a figurar como o sujeito ativo da ação e o agente público, causador do dano, figura como o sujeito passivo da ação.

A apuração de qualquer ilícito previsto na Lei n°. 8.429/92 poderá ser requerida pelo Ministério Público através da instauração de inquérito policial ou de procedimento administrativo correspondente, dependendo do ilícito cometido pelo agente estar previsto e passível de sanção legal em uma ou em ambas dessas esferas jurídicas.

A legitimidade da ação principal está reservada, expressamente, no artigo 17 da Lei 8.429/92, ao representante do Ministério Público e à Fazenda Pública pela sua procuradoria.

A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

No caso da ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, a pessoa jurídica interessada integrará a lide na qualidade de litisconsorte, devendo suprir as omissões e falhas da inicial e apresentar ou indicar os meios de prova de que disponha.

A Constituição Federal, em seu artigo 129, inciso III, dá ao Ministério Público a legitimidade ativa para a propositura da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, bem como de outros interesses difusos e coletivos.

"Art. 129 - São funções institucionais do Ministério Público [5]:

I – (...)

II – (...)

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;"

Assim, o Promotor de Justiça se configura hoje como um verdadeiro advogado pelo fato de propor ações, requerer diligências, produzir provas etc., atuando em defesa dos interesses sociais coletivos ou difusos. Nos crimes de Improbidade Administrativa, cabe a ele, através do Inquérito Civil, obter todas as provas necessárias para a posterior propositura da ação civil pública.

A jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo é dominante com o entendimento da legitimidade do MP e o cabimento da ação civil pública para a defesa do patrimônio público:

"Apelação Cível nº 512-5/5 - Acórdão da Nona Câmara "JULHO/97" - "AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Ato de improbidade - Legitimidade ativa do Ministério Público......"- É inegável que o representante do Ministério Público é parte legítima para promover o ajuizamento da ação civil pública, e a sua legitimidade ad causam vem evidenciada no artigo 5º da Lei nº 7.347/85 e no artigo 129, inciso III, da Constituição da República." [6]

Não é outra a orientação seguida pelos nossos Tribunais. A título de outro exemplo:

"Ação Civil Pública. Atos de improbidade administrativa. Defesa do Patrimônio Público. Legitimação ativa do Ministério Público. Constituição Federal, Arts. 127 e 129, III. Lei 7.347/85 (Arts. 1º, IV, 3º, II, e 13). Lei 8.429/92 (ART. 17). Lei 8.625/93 (Arts. 25 e 26)".

1. Dano ao erário municipal afeta o interesse coletivo, legitimando o Ministério Público para promover o inquérito civil e ação civil pública objetivando a defesa do patrimônio público. A Constituição Federal (art. 129, III) ampliou a legitimação ativa do Ministério Público para propor Ação Civil Pública na defesa dos interesses coletivos. [7]

Por sua vez, a Lei nº 8.429/92, também prevê, expressamente, a legitimidade do Ministério Público para a propositura para a ação principal e para a ação de seqüestro [8] nos casos envolvendo improbidade administrativa:

"Art. 16. Havendo fundados indícios de responsabilidade, a comissão representará ao Ministério Público ou à procuradoria do órgão para que requeira ao juízo competente a decretação do seqüestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimônio público.

§ 1º O pedido de seqüestro será processado de acordo com o disposto nos arts. 822 e 825 do Código de Processo Civil.

Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar."

O art. 18 completa dizendo que "a sentença que julgar procedente a ação civil de reparação de dano ou decretar a perda dos bens havidos ilicitamente determinará o pagamento ou a reversão dos bens, conforme o caso, em favor da pessoa jurídica prejudicada pelo ilícito".

O dispositivo legal refere-se à ação civil de reparação de dano, porém o legislador, ao elaborar a norma, esqueceu que nem toda conduta tipificada acarreta prejuízo ao patrimônio público ou enriquecimento do agente público que atua em má fé. Isso fica claro no artigo 21, o qual dispõe que "a aplicação das sanções previstas nesta lei independe da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público".

Esta falha do legislador importa em dúvidas interpretativas do dispositivo legal com relação à utilização, pelo Ministério Público, da ação civil pública, que está regulada pela Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, e que se destina a promover a responsabilização por danos morais e patrimoniais causados, a saber: ao meio ambiente; ao consumidor; a bens e direitos de valor artístico, histórico, turístico e paisagístico; a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, e por infração da ordem econômica (art. 1º).

Finalmente, conclui-se que a legitimação do Ministério Público para promover a ação civil para julgar atos de Improbidade Administrativa e defesa do patrimônio público vem fundamentada nos seguintes dispositivos:

- ação civil pública;

- incisos III e IX do artigo 129 da atual Carta Magna, que ampliam a atuação do Ministério Público;

- legitimação concorrente com a entidade pública e com qualquer cidadão, pois o patrimônio público pertence a todos. O Ministério Público tem legitimidade para a defesa dos interesses do povo; e qualquer cidadão, legitimidade para a defesa de seu interesse e da coletividade através da Ação Popular.

Não se pode esquecer também a legitimidade para que qualquer cidadão, por meio da Ação Popular, requeira a apuração de ato de improbidade administrativa, uma vez que é justamente dele o controle social sobre os atos da Administração Pública.

Como a própria Constituição Federal denominou, genericamente, a ação do Ministério Público no âmbito cível como ação civil pública (diferenciando-a da ação penal pública), ela será sempre "ação civil pública".


O Ministério Público e a Ação Civil Pública

Com o advento da Lei n° 7.347/85, a sociedade ganhou uma importante ferramenta para a proteção de qualquer direito e interesse difuso e coletivo (art. 1º, IV) e do controle social.

Sendo assim, a ação baseada na Lei nº 8.429/92 se caracteriza como sendo uma ação civil pública, uma vez que os atos de improbidade administrativa nela definidos atingem bens de natureza difusa: o erário público e a moralidade na esfera administrativa, que são o patrimônio público e social de todos.

Assim, pois, a ação civil pública é o caminho processual adequado para a proteção de qualquer direito e interesse difuso e coletivo, nestes termos definidos através da Lei nº 8.078/90 (art. 81, parágrafo único, incisos I e II).

Esta ação civil pública, subseqüente ao inquérito civil, devido ao princípio da legalidade, o Ministério Público está obrigado a ajuizar a ação civil ao se constatar a confirmação de fatos que venham a justificar a atuação judicial. Entretanto, finalizando o inquérito civil e concluindo pela inexistência de fato típico, não existe motivo lógico para o ajuizamento da ação.

Nos crimes de Improbidade Administrativa, a ação principal nada mais é do que uma ação civil pública para apuração de ato ímprobo, pelo Ministério Público, com o objetivo de responsabilizar o agente público acusado da prática de ato de improbidade administrativa.

Uma dúvida muito comum relativa à ação principal está em sua natureza jurídica. Neste sentido, esclarece o doutor Carlos Frederico Brito dos Santos:

"como a própria Constituição Federal denominou genericamente a ação do Ministério Público no âmbito cível como ação civil pública (diferenciando-a da ação penal pública), independentemente na nomenclatura que lhe seja dada (ou não) pelo legislador ordinário, ela será sempre "ação civil pública", sendo absurda qualquer confusão entre gênero e espécie por aqueles que pensam que ACP é tão-somente aquela da Lei n.º 7.347/85, fazendo grande confusão no tocante à legitimidade ativa do Ministério Público, fato que tem causado enormes prejuízos à sociedade, que fica indefesa à sanha de corruptos que, invariavelmente, são os beneficiários de tais equívocos". (grifamos) [9]

Fábio Medina Osório também esclarece, nesse sentido:

"ainda antes do advento da Lei número 8.429/92, já era possível ao Ministério Público instaurar o inquérito civil público ou promover ação civil pública com o objetivo de apurar enriquecimento ilícito dos administradores públicos, na medida em que se permitia a defesa judicial de ''qualquer interesse coletivo ou difuso'', v.g., o patrimônio público latu sensu, desde o advento da Constituição de 1988 (art. 129, III) e da Lei número 8.078/90 (cujo art. 110 acrescentou o inciso IV ao art. 1º da Lei número 7.347/85)." [10]

A Lei nº 8.429/92 contém preceitos e sanções de natureza civil, o que conduz o Ministério Público à aplicação subsidiária dos dispositivos da Lei nº 7.347/85, de Ação Civil Pública (com a nova redação dada pela Lei n° 8.884, de 11/06/1994), com o Título III da Lei nº 8.078/90 (art. 90) e o Código de Processo Civil, para a ação prevista no art. 17 da Lei de Improbidade Administrativa, por se tratar a ação principal justamente de uma ação civil pública.

Com a aplicação subsidiária da legislação acima citada é possível, em uma mesma ação, a partir da Lei nº 8.429/92, não somente requerer a aplicação das sanções repressivas previstas no artigo 12, dos atos de improbidade praticados, mas também requerer, baseando-se na Lei nº 7.347/85, a reparação por eventuais danos morais e/ou a condenação e execução de determinadas obrigações de fazer e de não fazer.

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E como define Edis Milaré [11], ação civil pública "é o direito expresso em lei de fazer atuar, na esfera cível, em nome do interesse público, a função jurisdicional" (grifamos).

Portanto, como esclarece Fábio Medina Osório, [12]

"não se diga que a adoção do rito ordinário na ação principal (art. 17 da lei número 8.429/92) impede o entendimento de que a ação civil pública possui seus delineamentos básicos na Lei número 7.347/85. A ordinarização do rito procedimental apenas busca alargar o campo de defesa dos réus, proporcionando-lhes espaço mais amplo para o debate e a produçào de provas. Não significa, portanto, afastamento de mecanismos processuais previstos expressamente na lei número 7.347/85. Veja-se que o Constituinte de 1988 quebrou o sistema anterior, no qual as ações civis públicas eram conferidas ao Ministério Público caso a caso, por leis expressas, ampliando tal titularidade, destinando a ação civil pública, agora, à proteção do patrimônio público e social, e de outros interesses coletivos e difusos, consagrando-se norma de extensão na própria Lei número 7.347/85. Não procede, pois, eventual alegação de que a ação civil pública da Lei número 8.429/92 seria absolutamente incompatível com o alcance da Lei número 7.347/85, porquanto esta última contém cláusula que permite a sua utilização para a defesa do patrimônio público latu sensu".

A natureza cível da ação de improbidade administrativa decorre de mandamento constitucional, que, no § 4° do art. 37 – justamente aquele referente à Administração Pública – dispõe:

"os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível".(grifamos).

Portanto, o Ministério Público há de propor a Ação de Improbidade administrativa sem prejuízo da ação penal cabível. Realmente, o objetivo da ação de improbidade é outro, como prevê o texto constitucional: a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário.

A jurisprudência também é neste sentido e já consagrou a expressão ação civil pública ao se referir à "ação principal" prevista no art. 17, da Lei nº 8.429/92, legitimando o Ministério Público como seu propositor, conforme podemos constatar na seguinte ementa de um acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

"Ação civil pública de improbidade administrativa e de ressarcimento de dano intentada contra Vereadores e ex-Vereadores pelo recebimento de diárias e transportes indevidos, e de remuneração sem o desconto por faltas injustificadas a sessões do Legislativo, cumulada com pedido de decretação de afastamento das funções e inelegibilidade. Legitimação ativa do Ministério Público, afirmada expressamente na Constituição (art. 129, III), ou nela implicitamente inscrita (arts. 129, IX, e 58, § 4º), e nas Leis 8.429/92 (arts 15, 17, §§ 3º e 4º, e 22) e 8. 625/93 (art. 25, IV, letra b). Sentença extintiva fundamentada em ilegitimidade ativa. Recurso provido, reconhecendo-se no caso o cabimento da ação, a legitimação do Ministério Público e a necessidade de participação do Município como litisconsorte". [13]

Destaca-se, ainda, o ensinamento de Marino Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa E Waldo Fazzio Júnior [14], ao definirem ação civil pública:

"Ação civil é a que tem por objeto uma lide civil. É ação não penal. Pública por seu conteúdo, porque objetiva proteger interesses difusos ou coletivos. Se toda a ação civil, mediatamente, persegue a consecução do interesse público, na órbita processual civil, seu objetivo imediato é, em geral, a dedução de uma pretensão menor, isto é, particular. Quando, no entanto, a própria pretensão geradora da lide deflui de interesses difusos ou coletivos, estamos em face da ação civil pública. Ação civil pública, no caso da improbidade administrativa, é a ação civil de interesse público imediato, ou seja, a utilização do processo civil como um instrumento para a proteção de um bem, cuja preservação interessa à toda coletividade".

A ação principal no Crime de Improbidade Administrativa poderá ser proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, no prazo de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

Esta ação, independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, é condenatória de ressarcimento do dano ou perda dos bens havidos ilicitamente, bem como as demais sanções previstas nos artigos 9°, 10 e 11 da Lei n° 8.429/92.

O artigo 6º da Lei n° 7.347/85 [15], em seu artigo 6º prevê:

Art. 6º Qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá provocar a iniciativa do Ministério Público, ministrando-lhe informações sobre fatos que constituam objeto da ação civil e indicando-lhe os elementos de convicção.

Um detalhe importante que o Ministério Público deve observar é que a mesma Lei de n° 7.347/85 estipula que as ações nela previstas deverão ser propostas no foro local onde ocorrer o dano, dando ao juízo competência funcional para processar e julgar a causa (art. 2°). No caso da Ação Popular, esta obedecerá ao procedimento ordinário, segundo os trâmites dispostos no Código de Processo Civil (art. 7°, Lei n° 4.717/65).

O Ministério Público atuará em ambas as ações, sendo parte ativa na Ação Civil Pública e como parte pública autônoma na Ação Popular (onde qualquer do povo é a parte ativa).

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Sobre o autor
Romualdo Flávio Dropa

Professor de Ética, Filosofia do Direito, Direito Constitucional, Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Mestre em Ciência Jurídica pela Faculdade de Direito do Norte Pioneiro - Fundinop. Pesquisador e palestrante sobre temas relativos a Direitos Humanos

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DROPA, Romualdo Flávio. Ministério Público:: parceiro no controle social. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 323, 26 mai. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5226. Acesso em: 30 abr. 2024.

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